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23 DE MAIO DE 1940 59

É que, sem dúvida, questões há cuja solução satisfatória se torna impossível sem acôrdo dos dois poderes: espiritual e temporal.
E por isso não bastaria que mediante leis internas o Estado procurasse harmonizar-se com as exigências fundamentais da consciência cristã; sem concordata, a paz religiosa, no verdadeiro, no puro sentido desta expressão, seria um mito e os nossos interêsses de potência colonizadora não ficariam, no domínio religioso, inteiramente salvaguardados.

4. No juízo da Câmara Corporativa sempre teria sido portanto de aconselhar a celebração da Concordata e do Acôrdo Missionário, mas não se pode deixar de reconhecer que aparecem êles num momento particularmente oportuno, quer pelo que se passa no Mundo, quer pelo que se passa em Portugal.
Na verdade, se é sempre útil ao interêsse do Estado o auxílio das forças espirituais, demonstrando que a elas, sobretudo, se obedece, mesmo no domínio da vida internacional, essa utilidade sobe de ponto quando aquele, pela sua modéstia territorial e demográfica, não pode sentir-se em segurança, se defendido apenas pela fôrça material.
E poucas vezes no decurso da história o prestígio da Santa Sé terá atingido tam elevado grau como no momento presente.
Mas nem só a oportunidade internacional sobressai neste caso com singular realce.
É depois de alguns anos de árduos esforços e difíceis negociações, disse S. Ex.ª o Presidente do Conselho, que se torna possível levar à prática esta política de confiante reconciliação e de paz religiosa, e a oportunidade não -podia ser melhor do que ao abrir êste ano das festas centenárias da independência nacional. Um pacto com Roma presidiu à fundação da nacionalidade portuguesa; de um novo pacto pode esperar-se auspicioso impulso para a sua comemoração solene e para a renovação das prosperidades e glórias que à mesma queremos e devemos associar.
Com estas palavras concorda em absoluto a Câmara Corporativa.

Reconhecida a vantagem geral do regime concordatário e a oportunidade do seu estabelecimento, focaremos agora alguns aspectos mais salientes da Concordata e do Acôrdo, abstraindo, em regra, de tudo quanto neles - e é muito, sobretudo na Concordata - representa mera consagração do regime legal vigente ou simples corolário lógico de princípios constitucionais ou legais.

II

Apreciação na especialidade

1) Concordata

A) Personalidade jurídica internacional da Igreja Católica

5. A República Portuguesa reconhece a personalidade jurídica da Igreja Católica, lê-se no artigo 1.º da Concordata.
E nem poderia, negá-la quem, aceitando o conceito de personalidade jurídica internacional, com a Igreja celebra concordatas e junto dela acredita e dela recebe agentes diplomáticos.
Muito os internacionalistas têm discutido se a Igreja é, ou não, sujeito de direito internacional, se tem ou não personalidade jurídica internacional.
Hoje, porém, pode dizer-se que a questão perdeu todo o interesse prático.
A tendência é, de resto, no sentido afirmativo, notando-se que aqueles divergem, e muito, quanto a saber se a personalidade pertence à Igreja, como sociedade universal, sendo a Santa Sé e o Papa apenas seus órgãos, ou se, pelo contrário, é ela atribuída à Santa Sé ou mesmo ao Sumo Pontífice, como Chefe da cristandade.
Esta questão, no campo puro dos princípios jurídicos e dos princípios religiosos, tem de facto interêsse; mas no domínio que agora nos preocupa nenhum lhe descobrimos.
Sob o ponto de vista exclusivo do Estado, que importa atribuir a personalidade internacional à própria Igreja Católica ou à Santa Sé ou ao Sumo Pontífice?
Aceite-se esta ou aquela solução, será sempre com a mesma autoridade que os tratados, que as concordatas se celebram e será sempre junto da mesma autoridade que os embaixadores e os ministros plenipotenciários são acreditados e a mesma será também a autoridade que junto dos Estados acredita os núncios, internúncios ou delegados apostólicos.
O interêsse prático para o Estado português das regras indicadas no artigo 1.° encontra-se, portanto, somente na afirmação de que a as relações amigáveis com a Santa Sé serão asseguradas na forma tradicional por que historicamente se exprimiam, mediante um Núncio Apostólico junto da República Portuguesa e um Embaixador da República junto da Santa Sé».
É que, após o reatamento das relações diplomáticas, quebradas em 1910, se a Santa Sé continuou a acreditar um Núncio Apostólico junto da República, esta passou a enviar-lhe um Ministro Plenipotenciário, e não um Embaixador, como na vigência da Monarquia.
Ora, não só os núncios são agentes diplomáticos de 1.ª classe, mas até, nos países católicos, de direito, e nos países não oficialmente católicos, por cortesia, se lhes atribue a qualidade de decanos do corpo diplomático.
Quere dizer, o princípio da reciprocidade, só por si, exigiria que a nossa representação junto da Santa Sé se fizesse por intermédio de uma Embaixada.
E, procedendo assim, não fará o Governo mais do que dar cumprimento ao espírito do artigo 46.º da Constituição, segundo o qual «. . . o Estado mantém ... as relações diplomáticas entre a Santa Sé e Portugal, com reciproca representação».
Vai, portanto, fazer-se agora aquilo que já há muito poderia ter sido feito.

B) Liberdade ou regalismo?

6. Sendo a Concordata uma «Concordata de separação» - e outra não consentiam, neste momento, como vimos, o nosso Direito Constitucional, nem, porven-

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viera, concluída em 20 de Março de 1924 e ratificada em 24 de Junho de 1925; concordata com a Polónia, concluída em 10 de Fevereiro de 1925 e ratificada em 2 de Junho; acôrdo com a França, concluído em 4 de Dezembro de 1928; concordata com a Lituânia, concluída em 27 de Setembro de 1927 e ratificada em 10 de Dezembro; modus vivendi com a Checo-Eslováquia, de 2 de Fevereiro de 1928; convenção com Portugal, concluída em 15 de Abril de 1928 e ratificada em 8 de Maio; acordos e concordata com a Itália, concluídos em 11 de Fevereiro de 1920 e ratificados em 7 de Junho; convenção com Portugal, concluída em 11 de Abril e ratificada em 20 de Junho; convenção com a Roménia, concluída em 10 de Maio de 1027 e ratificada em 7 de Julho de 1920; concordata com a Prússia, concluída em 14 de Junho de 1920 e ratificada em 18 de Agosto; acordo com a Roménia, de 30 de Maio de 1982; concordata com Baden, concluída em 12 de Outubro de 1932 e ratificada em 11 de Março; concordata com a Alemanha, concluída em 20 de Junho de 1939 e ratificada em 10 de Setembro; concordata com a Áustria, concluída em 6 de Junho de 1933 é ratificada em 1 de Maio de 1934. Estas concordatas podem ler-se, com notas elucidativas do Padre Restrepo S. J., em Concordats conclus durant le Pontificat de Sa Sainteté le Papa Pio XI, edição francesa da Pontifícia Università Gregoriana, 1934.