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27 DE MAIO DE 1940 73

O Sr. Presidente: — Está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Dr. Mário de Figueiredo.

O Sr. Mário de Figueiredo: — Sr. Presidente: usar da palavra depois do ambiente que se criou no seio desta Assemblea com o discurso do Sr. Presidente do Conselho e tarefa particularmente difícil — ia a dizer ingrata —, mas não é na verdade tarefa ingrata o falar desta matéria.
Para restituir a verdade toda a algumas palavras mais do que amáveis que a Assemblea acabou de ouvir, vou começar por pôr diante dos olhos de V. Ex.as como se trabalhou.
Já lá vão mais de três anos, fui convidado pelo Sr. Presidente do Conselho para estudar um projecto de Concordata com a Santa Sé. Comigo foram convidados também o Sr. Ministro da Justiça, o Sr. Embaixador Teixeira de Sampaio e o Sr. Dr. Fezas Vital.
Começámos o trabalho deparando com um projecto e, ao lado dele, com um largo estudo do Sr. Presidente do Conselho, em que aparecia toda a problemática das questões tratadas, as dificuldades do sentido das soluções que às questões podiam ser dadas e ainda a orientação que no momento, parecia convir ao interesse nacional. Isto foi o que encontrámos, com esta declaração complementar do Sr. Presidente do Conselho: a de que há mais de dois, anos trabalhava na matéria.
Isto restitue a verdade àquilo que a Assemblea acabou de ouvir ao Sr. Presidente do Conselho.
A comissão trabalhou e o texto assinado da Concordatas essencialmente o que saiu do trabalho da comissão.
Feita» estas breves referências aos antecedentes dos Acordos assinados em 7 do corrente e propostos para aprovação a esta Assemblea, direi que, depois do discurso que ouvimos, depois do modo como o problema tem sido tratado em Portugal pela imprensa, depois do trabalho da Câmara Corporativa, que parece milagre (porque parece realmente milagre que em quatro dias fosse possível realizar-se o que se realizou) podia quási dispensar-lhe de quaisquer outras considerações para elucidar esta Assemblea, porque ela já está elucidada.
Não quero, *no entanto, deixar de focar, deixar de marcar a importância dos Acordos, tanto na ordem interna, como na ordem internacional.
Tem-se dito, e é verdade, que a generalidade das questões resolvidas na Concordata já estavam solucionadas em sentido idêntico pelo nosso direito interno.
E, se assim é, pode preguntar-se: ?a que vem falar-se da importância dos Acordos na ordem interna? Pois se aquilo que está contido na Concordata existe de um medo geral já no direito interno, ?a que vem falar-se da importância política, da importância sob o ponto de vista da paz religiosa, do' equilíbrio que se buscava e que não existia, e que se encontrou, se a verdade é que o que se tem é, afinal, o que já existia?
E no entanto, Sr. Presidente, é verdade que a Concordata é um diploma da mais alta importância, de uma Importância de que porventura ainda o País se não possuiu completamente no ponto de vista da política interna.
E que uma cousa, Sr. Presidente, é o que se contém no direito interno e está sujeito às flutuações a que o direito interno está sujeito, outra cousa é o que se condensa num acordo internacional que por definição constitue um processo de limitação da actividade legislativa interna.
Atingiu-se nos factos uma situação de estabilidade tal que foi possível cristalizar em fórmulas estáveis a estabilidade que nos factos já se revelara.
Mas não é só esta a razão, não é só isto que marca a importância da Concordata; é que em situação, como direi, em situação de conflito, nunca chega o que se dá, nunca chega desde que não tenha a selá-lo a autoridade de quem tem prestígio para o receber.
Não traduzi como queria, com suficiente clareza — eu mesmo estou a notá-lo —, o pensamento que queria traduzir. Vou, pois, ver se consigo traduzi-lo com clareza e precisão suficientes.
Pode dar-se muito à Igreja em Portugal. Mas são muitos os representantes da Igreja em Portugal, as autoridades eclesiásticas portuguesas;
Cada um deles, por muito que se dê, sentirá sempre que o que se deu ainda não é o que era devido; e, portanto, por muito que se dê através do direito interno, a impaciência não se destrói, não se inutiliza.
Mas, se o que se deu tem a selá-lo a autoridade do mais alto representante da Igreja, e só êle tem o poder de reduzir todos ao silêncio — então conquista-se a paz; então modifica-se necessariamente a atitude dos que pedem e que julgam sempre que têm direito a mais.

Vozes: — Muito bem, muito bem!

O Orador: — Neste aspecto a Concordata é, atento o prestígio que a Igreja tem em Portugal, sem dúvida", elemento forte, marcado, de paz interna; a Concordata é um elemento de alta importância no ponto de vista de política interna; além disto, a Concordata torna possível a resolução de muitas questões práticas, de muitas questões de consciência.
Sr. Presidente: não se ignora que -a Igreja aplica as sanções que lhe são próprias àqueles que adquirem, contra a sua vontade, os seus bens — os bens eclesiásticos.
A venda e aquisição dos bens da Igreja tem criado em Portugal inúmeros problemas de consciência, de que é possível que nem todos se apercebam.
Pois bem. A Concordata vem liquidar todas essas questões de consciência. E vem liquidá-las tornando legítima a situação de pessoas que antes considerava ilegítima.
No ponto de vista interno o acordo tem a maior importância e tem-na, também, no ponto de vista internacional.
Quero chamar a atenção da Assemblea para o facto de ser a Concordata portuguesa o primeiro documento desta natureza em que outorga o Pontífice reinante.
Chamo a atenção da Assemblea para este facto e, ao mesmo tempo, para este outro, que eu recordo por memória, de que hoje o mais forte poder espiritual do mundo é, sem dúvida, o da Igreja Católica.

Vozes: — Muito bem, muito bem!
Palmas da Assemblea, a que as galerias se associam.

O Orador: — Sendo assim, a nossa Concordata marca uma orientação; na nossa Concordata toma-se uma atitude relativamente a problemas que hão-de apresentar-se, naturalmente, na vida internacional como um precedente a considerar e, porventura, a seguir.
Mas, ainda noutro aspecto — e agora é o do Acordo Missionário — eu quero fixar a alta importância internacional deste trabalho.
Todos conhecem, creio bem, a situação a que, por unia política contrária ao interesse nacional, foi reduzido o trabalho missionário no ultramar português. Naturalmente, todos sabem que no ultramar português se instalaram missões da mais vária nacionalidade.