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6 DE FEVEREIRO DE 1941 175

prender o tempo e a atenção de V. Ex.as (Não apoiados) insistindo nas razões por que não posso de nenhuma forma estar de acordo com uma disposição que -vai de encontro a toda a política de unidade do Império . . .

Vozes: — Muito bem!

O Orador: — . . . que é um dos padrões mais altos de glória desta situação.
Depois exige a lei que a mulher portuguesa que haja de casar com um militar não seja divorciada.
Já foi o assunto largamente debatido, mas devo ainda referir-me a êle porque me parece de uma flagrante e transparente injustiça a diferenciação de critérios que logo ab initio se estabelece.
De facto não compreendo que a lei imponha à noiva que não seja divorciada e passe em silêncio a situação do noivo a tal respeito.
Se, porventura, a lei pretendesse tirar do facto de ser divorciada a conclusão de indignidade da noiva para poder casar com um oficial do exército, então seria o próprio diploma legal a -estabelecer uma situação moral contrária à consequente de uma sentença proferida de harmonia com a própria lei do divórcio, que é ainda lei do Estado.
E aqui um parêntese, que me parece indispensável: não discuto neste momento, ao analisar este decreto, o problema de saber-se se deve ou não existir lei do divórcio; esse problema é muito mais vasto, leva-nos muito mais longe, ©, se algumas considerações pessoais devo formular agora, declaro que comparticipo inteiramente do ponto de vista do relatório da Câmara Corporativa, em que se diz, e muito bem, que, preferível a acabar-se de repente com a lei do divórcio, é criar-se um ambiente moral que não necessite do divórcio.
Não posso, e é a minha 'experiência de profissional do foro que mo impõe, deixar de considerar que no divórcio, se umas vezes a mulher é a culpada, noutras ela foi, ela é e será exclusivamente a vítima. E emquanto em Portugal existir a lei do divórcio — e não defendo que ela deva subsistir eternamente — não há o direito de recusar a essas vítimas de uma saciedade mal constituída, mal administrada e mal orientada que possam honestamente e, vamos, cristãmente reconstituir a sua vida em bases de maior e mais sã felicidade.
Mas surge no decreto um outro ponto de vista que, esse tanto como os outros, me afligiu, para não dizer que me afligiu mais.
Exige este decreto que o oficial do exército e a sua noiva possuam meios de subsistência em relação com o grau que êle ocupar na hierarquia militar.
Ao entrar neste capítulo, devo fazer uma declaração prévia. Não me interessam nem quero que me influenciem as legislações estrangeiras que regulam a matéria, porquanto cada país tem o seu nível de vida próprio, o seu ambiente peculiar, e as leis que são boas e certas para um país podem ser, e são quási sempre, erradas em relação a um outro.
Pregunto: ?sou ou não forçado a aceitar, sob pena de negar toda a orgânica social e económica do Estado, que um oficial do exército em idade de casar, segundo a própria doutrina do decreto, isto é, com vinte e cinco anos e tenente, ganha ou não o suficiente para constituir família?

Vozes : — Muito bem, muito bem!

O Orador: — Sou forçado pelas circunstâncias a ter de partir deste ponto inicial: até prova em contrário — e então o remédio seria outro— êle tem de possuir necessariamente meios de subsistência, pelo que aufere
do exercício da sua profissão, para poder, embora modestamente, nesta modéstia que constitue a vida portuguesa, constituir família.

Vozes: — Muito bem, muito bem!

O Orador: — Evidentemente que seria desejável, e sobretudo agradável para êle, que a noiva pudesse concorrer para o casal com alguns rendimentos. Mas eu pregunto à consciência da Assemblea Nacional, que representa a consciência do meu País: ?desde quando é que em Portugal se teve como timbre o casamento de conveniência? ?Desde quando é que o rapaz português, para unir o seu destino ao de uma rapariga boa, pura e sã, preguntou primeiro quais eram os rendimentos que ela tinha?
Se não ó este talvez o timbre, a característica essencial de todos os povos nem de todos os países, todos nós sabemos que felizmente — graças a Deus posso dizê-lo — é esta a velha característica da gente da minha terra. Casa-se por amor, não se casa por interesse.

Vozes : — Muito bem, muito bem!

O Orador: — ?E, se se casa por amor, qual é o bragal da noiva, qual é a fortuna que os pais lhe dão, qual é o dote que ela traz? O seu carácter, a sua educação, os sentimentos em que foi criada.
?Com que meios contribue a noiva para o casal?
!Com a sua dignidade, com o seu trabalho no lar, com a sua honestidade, com a sua dedicação e com o admirável espírito de sacrifício e de renúncia da rapariga portuguesa!

Vozes: — Muito bem, muito bem!

O Orador: — Nunca um oficial do exército foi menos digno, menos honrado, ou menos competente por ter casado com mulher pobre; nunca ela o envergonhou na sua vida, apenas por o ser.

Vozes: — Muito bem, muito bem!

O Orador: — Mas no artigo 5.° o decreto vai mais longe:
«... deverá atender-se à situação social da mulher, ao seu passado e de sua família...».
Que se exija para a noiva um certo número indispensável de requisitos morais, estamos de acordo. Mas eu pregunto ?o que entende o legislador por «passado da família da noiva»? E pregunto se se pretende fazer nesta emergência com que os filhos paguem as possíveis culpas de seus pais.
Sr. Presidente: não me parece que, apesar do espírito admirável que presidiu h elaboração deste decreto, a sua letra seja a mais conforme com os interesses da constituição desse núcleo basilar de toda a vida social portuguesa: a família.
Depois desta crítica que lealmente e de boa fé eu fiz, há uma cousa para a qual não posso deixar de chamar a atenção da Assemblea Nacional: estabelece-se no artigo 14.° do decreto um período transitório, dizendo-se que até ao dia 30 de Abril próximo poderão, pelo Ministério da Guerra, ser autorizados os casamentos, mesmo sem observância de alguns dos requisitos nêle estabelecidos.
Pensem V. Ex.as na desorganização que necessariamente se vai provocar com este regime transitório, sem quaisquer vantagens, sem quaisquer benefícios, ou sem que por esse meio se nobilite ou engrandeça a honra do exército ou a instituição da família.