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21 DE FEVEREIRO DE 1942 243

O Sr. Presidente:-Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua o debate, na generalidade, do projecto de lei do Sr. Deputado Cancela de Abreu.

Tem a palavra o Sr. Deputado Sá Carneiro.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: a discussão na generalidade do projecto de lei do ilustre Deputado Sr. engenheiro Cancela de Abreu deu ensejo a que fossem proferidas aqui autorizadas palavras de justiça sobre esse insigne parlamentar.

Todos nós apreciamos as altas qualidades de S. Ex.ª, que é, sem favor, uma das mais altas personalidades desta Assemblea (Apoiados). E, na multiplicidade do seu talento, há uma faceta que eu, som querer evocar autoridade para descobrir méritos jurídicos em quem quer que seja, desejo salientar-se nisso não sou sequer original.

Além dós outros dotes que lhe são próprios, S. Ex.ª tem uma marcada intuição jurídica, que porventura lhe advém de atavismo, pois seu saudoso pai foi um magistrado distintíssimo, sendo de notar que possue dois irmãos que são dois ilustres jurisperitos, ou, talvez porque o direito se casa com o bom senso, o espírito aflue espontaneamente à sua lúcida inteligência.

Aproveito esta ocasião para me associar, com todo o entusiasmo, às manifestações de apreço aqui feitas a S. Ex.ª, e estou certo de que toda a Assemblea as perfilha calorosamente.

Apoiados.

Sobre a oportunidade e vantagem dos novos princípios será desnecessário alongar-me, porque já o ilustre autor do projecto demonstrou uma e outra cousa.

Temos presentemente uma lacuna na nossa legislação.

Há o decreto-lei n.º 22:827, de 14 de Julho de 1933, que regulamenta o caso dos engenheiros ou quaisquer outros profissionais estrangeiros que sejam empregados por conta de outrem. Mas, por um lado, este diploma, que revogou é ampliou as disposições do decreto n.º 18:415, de 3 de Junho de 1930, é, por definição expressa no seu artigo 1.º, uma norma temporária, pois aí se diz que ele se aplicará apenas emquanto se verificar a existência de desempregados, segundo as estatísticas oficiais do desemprego. Trata-se, portanto, de diploma que, embora possa vir a ser convertido em norma permanente, neste momento está condenado a unia possível caducidade.

Por outro lado, actualmente é livre em Portugal o exercício por conta própria das profissões em referência. Por isso nesta parte o projecto constitue inovação.

Aprovado há anos nesta Assemblea o projecto do ilustre Deputado Sr. Dr. Pires de Lima, também subscrito pelos ilustres Deputados Srs. Drs. Alberto Cruz, Moura Relvas e Carlos Moreira, por maioria de razão se impunha a apresentação do projecto referente a engenheiros e técnicos estrangeiros, pois estes não carecem de repetir os respectivos cursos.

Os advogados têm também de fazer essa repetição, mas, quanto a nós, não há que temer a concorrência fie estrangeiros, visto a diversidade de línguas e de legislação de uns países para outros dificultar o exercício da advocacia por estrangeiros:

Mas quanto aos engenheiros, técnicos e arquitectos, como os respectivos braços da ciência e arte são universais, o perigo é de temer. Relativamente aos arquitectos, a sua arte sofre influências de local e tradição e este é um dos motivos por que aplaudo a ampliação sugerida pela Câmara Corporativa.

Porém, se não tenho a menor dúvida em dar o meu voto ao projecto de lei na generalidade, não quero deixar de formular pequenas restrições quanto à economia do mesmo.

Sem querer de modo nenhum entrar na discussão da especialidade -e é possível até que não tome parte nela-, vou mandar paru a Mesa uma nova redacção de alguns textos, precisamente no sentido de aclarar um ou outro e de quebrar um pouco a rigidez do projecto, pois, a meu ver, é esse o único defeito que se lhe pode apontar.

O projecto ressalva as situações actualmente existentes, respeitando-as, como era justo. Todavia, para o futuro limita muito a liberdade do Governo.

Na verdade, e volvendo ao decreto que já citei, receio que a votação do projecto tal como está origine esta situação: se amanhã um engenheiro estrangeiro quiser fazer inspecção a uma empresa também estrangeira a que pertença, não poderá ser autorizado, por o caso não estar previsto neste projecto de lei.

Há ainda este outro aspecto do problema: se estabelecermos um regime que não seja maleável para os engenheiros, técnicos e arquitectos estrangeiros, podemos chegar a uma destas situações, qual delas a mais desagradável- ou ser impossível o estabelecimento ou a manutenção de uma nova indústria em Portugal, ou então o Governo ter de publicar um diploma que, sendo de aspecto geral, tenha o cunho particular, o que é sempre desagradável.

Poderá dizer-se que há a reciprocidade. Quanto a este ponto, recordo-me de que a minha geração foi criada no horror a tal princípio. O grande internacionalista que nos ensinou direito internacional dizia que o referido princípio não era justo, porque de duas uma: ou se considerava equitativa a concessão de direitos a estrangeiros, ou não. Se era equitativa, deviam ser-lhes conferidos os direitos, mesmo que os portugueses não os tivessem nos países a que aqueles estrangeiros pertenciam.

De então para cá passaram-se muitas cousas no mundo, acentuou-se o egoísmo dos povos. E por mais que Portugal queira esquivar-se a tal sentimento, não pode fugir às realidades.

Já em 1939, relativamente ao condicionamento do exercício da medicina por estrangeiros, votámos a reciprocidade, também estabelecida no decreto-lei n.º 22:827.

Mas tal princípio não resolve as dificuldades que esbocei, visto que, quando houver reciprocidade, a lei votando, não funciona; a lei só terá aplicação «precisamente quando não existir a reciprocidade.

Manteve-se neste projecto um certo paralelismo entre o caso dos engenheiros e arquitectos e o dos médicos; todavia um doente pode chamar um grande clínico estrangeiro com uma simples declaração, emquanto uma empresa não poderá mandar vir um grande engenheiro sem o deferimento prévio de um requerimento fundamentado.

O Sr. Cancela de Abreu:- Não pode comparar-se a urgência da chamada de um médico para um doente com a vinda de um engenheiro para unia indústria.

O Orador: - As duas situações não são, de facto, idênticas. Temos, porém, de reconhecer que há maior liberdade na lei que condiciona- o exercício da medicina por estrangeiros do que no projecto de V. Ex.ª quanto a engenheiros e técnicos.

São estas as breves considerações que me ocorreram, concluindo por afirmar que voto o projecto na generalidade, com as pequenas restrições que indiquei, enviando para a Mesa algumas alterações.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!