4 DE JULHO DE 1945
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circunstâncias, as convenções e tratados internacionais», passaria a ter a redacção seguinte:
«Fazer decretos-leis e, em casos de urgência, aprovar as convenções e tratados internacionais».. Quere dizer: o Govêrno passaria a dispensar por completo as autorizações legislativas da Assemblea Nacional e, além disso e em face da projectada eliminação do § 3.° do referido artigo 1.09.°, que diz: «Quando o Govêrno publicar decretos-leis, nos casos de urgência e necessidade pública, durante o funcionamento efectivo da Assemblea Nacional, deverá propor à ratificação desta os respectivos decretos-leis numa das primeiras cinco sessões que se seguirem à sua publicação», não precisaria das ratificações da Assemblea Nacional que a Constituïção actualmente exige.
Em defesa daquela orientação cita-se no parecer da Câmara Corporativa uma tese apresentada ao II Congresso da União Nacional e faz-se o seguinte comentário: «Afinal, mais não se faz, já o dissemos, do que dar foros de indiscutível constitucionalidade às realidades políticas dos últimos tempos: a Assemblea Nacional tem sido, de facto, um órgão legislativo excepcional e o Govêrno o órgão legislativo normal».
E já anteriormente afirmara no mesmo parecer que «de facto a iniciativa legislativa dos Deputados a bem pouco se reduziu nas duas últimas legislaturas».
Mas, com manifesta oportunidade, transcreve também o que num parecer da mesma Câmara Corporativa, emitido em 15 de Fevereiro de 1935, se dissera sôbre a inconveniência de «o poder legislativo pertencer ao mesmo tempo e no mesmo grau à Assemblea Nacional e ao Governo».
E afirma-se que o «aspecto cada vez mais técnico que as normas legais vão tomando aconselha a instauração de um sistema que atribua ao Govêrno o exercício da função legislativa», devendo provocar-se a intervenção das assembleas políticas apenas quando se trate de definir grandes orientações ou de assunto ou matéria adstritos a altos interêsses nacionais, assim reconhecidos pelo Governo».
Esta última frase, se a sugestão nela formulada viesse a ser aprovada, representaria grave restrição ao disposto no artigo 97.° da Constituïção, que estatue pertencer a iniciativa da lei indistintamente ao Govêrno ou a qualquer dos membros da Assemblea Nacional.
Vozes: — Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sôbre o resto, já o artigo 92.° da Constituïção preceitua que as leis votadas pela Assemblea Nacional devem restringir-se à aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos, não podendo, porém, ser contestada, com fundamento na violação dêste princípio, a legitimidade constitucional de quaisquer preceitos nelas contidos.
Bom seria que as propostas de lei se limitassem tanto quanto possível às bases gerais dos regimes jurídicos, e não viessem pejadas de preceitos regulamentares, que são mais pròpriamente da competência do Govêrno, por êle trabalhar em contacto com as repartições técnicas, conhecedoras dos pormenores que deverão figurar nos regulamentos.
Sr. Presidente: o argumento aduzido pela Câmara Corporativa de que «afinal, o reforço agora proposto dó poder legislativo do Govêrno, mais não é do que dar foros de constitucionalidade às realidades políticas dos últimos tempos» não é de aceitar, porque importa ter presente o período anormal em que a vida portuguesa, como, aliás, a de todo o mundo, tem decorrido, não sendo de admitir que os processos então impostos pelos acontecimentos devam ser mantidos no futuro, uma vez que nos bafeja a esperança de melhores dias.
Vozes: — Muito bem!
O Orador: — A lição que se aprende ria análise da obra legislativa do Govêrno nos últimos anos é a de que os seus diplomas têm sido, por vezes, o espelho dá sua composição, em que predominam técnicos, sem dúvida do maior valor, mas, sobretudo, técnicos.
Bastará o exame dos diplomas presentes à Assemblea Nacional nos últimos seis meses de trabalho legislativo — propostas de lei sôbre electrificação, reorganização industrial, casas de renda económica, assistência psiquiátrica e, recentemente, sôbre coordenação dos transportes terrestres — para demonstração do que venho de afirmar. Quem ler no Diário das Sessões o relato dos respectivos debates notará quanto o critério político da Assemblea Nacional discordou das soluções propostas pelo Govêrno, que diríamos então orientado por critério técnico, e não deixará de verificar que os textos votados podem, porventura, fugir aqui e ali aos cânones da tecnicidade, mas amoldam-se melhor às realidades e exigências da vida nacional.
Vozes: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente: os quatro pilares da Constituïção Política da República Portuguesa são constituídos pelos respectivos órgãos de soberania — Chefe do Estado, Assemblea Nacional, Govêrno e tribunais—, cujos poderes são claramente definidos em capítulos daquele estatuto fundamental.
Assim, ao Govêrno, que depende exclusivamente do Presidente da República, compete «superintender no conjunto da administração pública, fazendo executar as leis e resoluções da Assemblea Nacional».
As suas funções legislativas são assim definidas:
«Fazer decretos-leis, no uso de autorizações legislativas ou nos casos de urgência e necessidade pública, e aprovar, nas mesmas circunstâncias, as convenções e tratados internacionais.
Elaborar os decretos, regulamentos e instruções para a boa execução das leis».
As atribuïções legislativas da Assemblea Nacional são assim definidas na Constituïção Política da República Portuguesa:
«Fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las.
Conferir ao Govêrno autorizações legislativas».
Além disso estabelece a Constituïção que «as leis votadas pela Assemblea Nacional devem restringir-se à aprovação das bases gerais dos regimes jurídicos, não podendo, porém, ser contestada, com fundamento na violação dêste princípio, a legitimidade constitucional de quaisquer preceitos nelas contidos.
E diz-se também na Constituïção: «Quando o Govêrno publicar decretos-leis, nos casos de urgência e necessidade pública, durante o funcionamento efectivo da Assemblea Nacional, deverá propor à ratificação desta os respectivos decretos-leis numa das primeiras cinco sessões que se seguirem à sua publicação».
Em meu entender a ratificação obrigatória deveria limitar-se aos decretos-leis que incluíssem bases gerais dos regimes jurídicos, mas abrangendo, não só os publicados durante o funcionamento da Assemblea Nacional, como os restantes.
Contudo à Assemblea, nos termos do n.º 1.° do artigo 91.° da Constituïção, compete a faculdade latíssima de suspender e revogar as leis.
Da mesma forma que todos queremos um Govêrno forte, também não desejamos uma Assemblea Nacional com a sua função legislativa deminuída.
Vozes: — Muito bem!