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DIÁRIO DAS SESSÕES — N.º 189
nientes, tem a vantagem de estabelecer um princípio de organização e um princípio de autoridade, visto que os Deputados votam enquadrados dentro dêsses grupos, dirigidos por um leader intérprete oficial do interêsse partidário, que êles natural e lògicamente confundem com o interêsse da própria Nação.
Nesta Assemblea Nacional não havia, nem há, graças a Deus, grupos diferenciados, nem se julgou conveniente organizar no Regimento comissões de trabalho; mas a breve trecho se reconheceu a necessidade de introduzir no funcionamento da Câmara qualquer processo de estudo e de reflexão. Foi a razão das sessões de estudo.
Nem a nossa Constituïção nem o Regimento previam, como já disse, a organização de comissões de trabalho.
Representou isso, com certeza, nesse momento – em 1933 — uma reacção contra certos defeitos e exageros do parlamentarismo, entre os quais se apontava aquele que o nosso ilustre colega Mário de Figueiredo já aqui referiu e se verificava em certa nação europeia onde as comissões parlamentares, designadamente a comissão de finanças, exerciam uma verdadeira ditadura sôbre os govêrnos.
Direi de passagem, entretanto, que esta ditadura exercida pela comissão de finanças podia ser desagradável ao Govêrno, que ficava privado de certa liberdade de movimentos, mas não redundava em desprestígio do órgão político que servia porque os pareceres emanados dessa comissão tinham uma tal autoridade, em razão dos membros que as constituíam e do valor intrínseco dos próprios pareceres, que de facto traziam grande prestígio ao órgão político a que essa comissão pertencia.
Veio, pois, como reacção, uma Constituïção e um Regimento em que não se previa, dentro da Assemblea Nacional, a existência de comissões permanentes de trabalho. Ao mesmo tempo argumentava-se que êsses órgãos de trabalho não eram necessários, visto existir a Câmara Corporativa, que funcionaria como órgão de trabalho da Assemblea Nacional.
A experiência demonstrou, ao fim da legislatura, que não bastava isso. E parece-me que esta consideração simples de que os órgãos de qualquer corpo, para poderem ser eficientes e desempenhar a sua função, devem estar dentro dele e não fora, conduziu ao reconhecimento de que não basta a Câmara Corporativa como órgão de trabalho para que esta Assemblea possa produzir aquilo que o País espera dela.
Então verificou-se que era necessário qualquer cousa que suprisse esta falta e fizesse com que as decisões desta Assemblea fôssem mais criteriosas, possìvelmente mais ordenadas.
As sessões de estudo, quero reconhecê-lo, tiveram esta intenção e representaram neste aspecto um progresso sôbre o que antes delas se passava.
Mas, Sr. Presidente, como tudo neste mundo tem o seu lado bom o seu lado mau, e, como diz a filosofia, não há nada tam bom que não tenha o seu lado mau e não há nada tam mau que não tenha o seu lado bom, as sessões de estudo revelaram também os seus inconvenientes graves, que já aqui foram apontados.
Parece-me, efectivamente, que as assembleas políticas vivem do público e para o público e têm tudo a lucrar em que o número das suas sessões públicas seja o maior possível. Na verdade, não deixava de me causar uma impressão de tristeza o ver freqüentemente que os relatos parlamentares dos jornais se limitavam a duas linhas, em tipo miúdo, registando apenas que a Assemblea Nacional tinha passado a funcionar em sessão de estudo. E permitam-me que duvide de que o País acreditasse que a Assemblea Nacional estava efectivamente a estudar no silêncio discreto de um gabinete.
Não quero, repito, acrescentar mais razões àquelas que foram apresentadas e às quais não poderia emprestar mais brilho e apenas desejo frisar uma circunstância que me parece interessante: dentro de uma Assemblea política naturalmente nem todos têm a mesma preparação, nem todos têm as mesmas afinidades para todos os assuntos, e, portanto, a existência de comissões permanentes permite uma divisão de trabalho e uma utilização de valores que, não tendo vocação oratória ou vocação tribunícia, são, no entanto, elementos da mais alta importância para os trabalhos da Assemblea.
Sr. Presidente: vem a proposta governamental de alteração a Constituïção, e a meu ver nìtidamente, no sentido de valorizar a Assemblea política do País. Deduzo isso, entre outros factos, precisamente do de se aumentar o número dos seus Deputados, o que tem grande importância e enorme significado, visto que torna mais eficaz a representação do País na variedade das suas aspirações, necessidades e queixas, porque torna possível uma maior fiscalização da política e da administração do Govêrno, e ainda porque torna também possível uma maior selecção de valores na representação nacional e assim elevar-se o nivel do trabalho da Assemblea.
Procura depois o Govêrno ampliar os poderes de fiscalização e, consignando na proposta que a Assemblea Nacional tem entre as suas atribuïções a de apreciar os actos do Govêrno e da Administração, estabelece de tal modo expressamente o controle político da vida do País.
Pode dizer-se que a Assemblea já exercia essa função, mas a verdade é que ela não estava no texto constitucional e difìcilmente se pode por uma benévola interpretação enquadrar nesse texto.
Nessa mesma ordem de ideas o Govêrno propõe que a Assemblea possa funcionar em comissões de trabalho. Pretende-se que o trabalho da Assemblea seja valorizado em profundidade por um estudo sério, reflectido, dos melhores valores da Câmara para cada um dos assuntos que lhe são submetidos.
Se é esta a intenção do Govêrno, se se pretende aperfeiçoar o trabalho da Assemblea em relação às sessões de estudo, eu não vejo, na verdade, por que não havemos de acompanhar à proposta governamental nas suas intenções, e, se votámos outrora a experiência das sessões de estudo e se o seu funcionamento revelou inconvenientes graves, que é útil evitar, não vejo nem consigo explicar por que não havemos de procurar enriquecer a actividade da Assemblea com as suas comissões permanentes ou eventuais.
Em todas as grandes assembleas, sejam elas de que natureza forem, é impossível um trabalho profundo, um trabalho sério — e não digo isto em sentido pejorativo — sem a constituïção, dentro do próprio corpo, de pequenos órgãos especializados de trabalho.
Sr. Presidente: votarei, portanto, a proposta governamental, porque me parece que ela representa uma tentativa de valorizar ainda mais os trabalhos da Assemblea.
Tenho dito.
Vozes: — Muito bem, muito bem!
O Sr. Presidente: — Como não está mais ninguém inscrito, vai votar-se a proposta do Sr. Deputado Antunes Guimarãis, porque foi a primeira que chegou à Mesa.
Submetida à votação, foi rejeitada.
O Sr. Presidente: — Vai votar-se agora o artigo 95.° da proposta governamental, com as duas alterações apresentadas pelo Sr. Deputado Querubim Guimarãis.