26 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 59
O director da escola tem no 1.º semestre dezasseis horas e no 2.º doze horas de serviço semanal docente; não há nenhum professor na escola que tenha mais serviço e até há apenas um cujo serviço é igual, o de Didáctica !
Este serviço docente, que exige ao director preparação longa, cuidada e difícil em duas disciplinas fundamentais- Pedagogia e Psicologia -, coloca o director, por exemplo, na necessidade de classificar 80 alunos em duas disciplinas diferentes e básicas; calculando que, para uma classificação conscienciosa, é necessário, pelo menos, um exercício por mês em cada uma das disciplinas, temos que o director é forçado a ler por mês, pelo menos, cento e sessenta exercícios escritos, o que, à média provada de quatro por hora, representa mais quarenta horas de trabalho mensal, ou seja mais cerca de duas horas em cada um dos dias lectivos. Somando estas horas ao tempo de prelecção e ao de preparação das lições, tem de reconhecer-se que estamos em face de um trabalho absorvente e extenuante.
Mas, além de todo este serviço relacionado com a sua função docente, o director tem a seu cargo, evidentemente, a direcção da escola, com o que isso representa de horas consumidas no estudo e despacho do expediente, na solução dos pequenos problemas diários de disciplina e organização, na recepção de alunos, pais de alunos e outros interessados, nas diligências junto das autoridades locais, nos serviços de representação, etc.
Mas há mais ainda: o director tem a seu cargo a presidência do conselho administrativo, com o que isso acarreta de responsabilidade no doseamento das verbas, na disciplina das compras, nos pagamentos, nos descontos por faltas ou outros motivos, etc. Tem a seu cargo a direcção das dez escolas primárias de aplicação, com a competente obrigação de fiscalizar o seu funcionamento, presidir aos seus conselhos, superintender ao recenseamento, à matrícula e aos exames de passagem de classe das crianças, processar os vencimentos dos professores, dar despacho ao expediente dessa secção d t- ensino primário, determinar o serviço de assistências e regências dos alunos - mestres, etc. Tem de presidir a todo o serviço de exames da escola, exames de admissão, de saída e de Estado, com o que isso significa de classificações de provas escritas, interrogatórios em provas orais, conselhos de júris, avisos, pautas e relatórios, etc. Tem de organizar o estágio, distribuir os estagiários, ler os seus relatórios e os dos professores orientadores do estágio, organizar as sessões e conferências pedagógicas, presidir a todas elas, etc. E tem, finalmente, de solucionar todos os imprevistos que surgem a cada momento numa escola que é frequentada por 200 crianças do sexo masculino, 200 do sexo feminino, 140 alunas - mestras e cerca de 20 ou 30 alunos - mestres.
De forma que para o director da escola há apenas duas soluções: ou aguentar-se até ao esgotamento total das suas energias físicas e mentais... e desistir em seguida (como já fizeram alguns), ou resignar-se com um deficieintíssiimo cumprimento cios seus deveres...
Sr. Presidente: todo o pessoal da escola e das escolas de aplicação é da escolha do Ministro, que, para tanto, não consulta a direcção da escola. Como, porém, o Ministro não conhece os professores locais nem as necessidades práticas da escola, a sua escolha recai, evidentemente, nas pessoas que lhe são indicadas por certos influentes da localidade, que não conhecem o problema pelo seu lado pedagógico e técnico.
Isto é, o director da escola é. responsável pelo bom funcionamento dos serviços, e portanto pela competência dos seus colaboradores; mas o seu pessoal é-lhe
imposto por indicações alheias, .sempre ou quase sempre pedagogicamente irresponsáveis!
Os resultados práticos conhecem-se: à frente de algumas escolas de aplicação, servindo, portanto, de orientadores metodológicos aos alunos - mestres, estão hoje alguns professores dos chamados «paraquedistas», quer dizer, para orientar a prática de alunos - mestres que acabam de frequentar as aulas de Pedagogia, Psicologia e Didáctica escolheram-se alguns professores que nunca frequentaram uma escola do magistério. E porquê?... Porque, não possuindo classificações nem tempo de serviço que lhes permita serem nomeados para uma escola da cidade, se serviram dos tais influentes e das suas recomendações, com manifesto prejuízo de gente mais competente!
É uma situação incongruente, com a qual um director sério só pode conformar-se se possuir uma dose invulgar do tal citado espírito de sacrifício...
Sr. Presidente: apenas quatro professores pertencem ao quadro privativo da escola e estão em condições de dedicarem a ela a sua atenção e o seu tempo (o de Pedagogia e Psicologia, o de Desenho e Trabalhos Manuais, o de Didáctica e Legislação e a professora de Educação Feminina; os outros seis -a maioria, portanto- são por lei professores do liceu local, que a emprestam umas horas à escola. E a lei, já pela irrisória remuneração, já pelas complicações burocráticas e pelas despesas que andam ligadas à sua nomeação anual, criou a estes professores uma situação tal que foi necessário improvisar um decreto para os obrigar a prestar o referido empréstimo de serviço.
Quer dizer: a escola não possui um corpo docente! Que é como quem diz: é um estabelecimento sem personalidade.
Os programas foram, sem qualquer sombra de dúvida, arquitectados à pressa, mal doseados e, em certos casos, hipotéticos ou até errados. Veja-se, a título de exemplo, este dislate pedagógico: a Pedagogia estuda-se logo no 1.º semestre, isto é, antes de se ter estudado a Psicologia, que lhe deve servir de base! Outro aspecto: a Educação Física incluiu no programa longas caminhadas e acampamentos demorados, mas não se previu o pagamento das horas extraordinárias e dos dias que o professor perderia se quisesse cumprir cabalmente!
Conclusão: o programa de Pedagogia só se pode cumprir... dogmatizando-se, o de Educação Física só se pode cumprir... sonhando-se.
Sr. Presidente: onde os programas são excessivos, errados e ilusórios o sistema de exames não pode deixar de ter defeitos. Aqui, como é natural, peca-se por excesso: para um curso de dois escassos anos lectivos há um período de mais de um mês para exames de admissão, um período de mais de um mês para exames de saída e um período de mais de um mês para Exames de Estado!
Os exames de admissão são a repetição inútil de alguns exames liceais; e ainda se não elaborou para eles o prometido regulamento, de forma que se vêm fazendo desde 1942 de acordo com o regulamento e os programas do decreto n.º 30:968, de 14 de Dezembro de 1940. Mas, coisa lamentável!, estes programas e regulamentos não se destinavam as escolas do (magistério - pois estas nem sequer funcionavam ao tempo -, unas sim ao cumprimento do decreto-lei .n.º 30:901, de 10 de Dezembro de 19J-0, que era, já de si, uma lei de emergência, precisamente a que criou os «paraquedistas»! Onde estará a lógica desta curiosa adaptação?
(Os exames de saída são a repetição intútil das disciplinas que acabam de cursar-se na escola; os alunos recebem as classificações da frequência em meados de Fevereiro e entram nos exames de provas escritas de saída