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140 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 64

O plano é simples: esperar que a deflação se faça do mesmo modo que se fez a inflação, a saber: pela ordem natural das coisas.
Ora vejamos o que dou a ordem natural das coisas desde o princípio da guerra até hoje.
Em Dezembro de 1940 escrevia eu estas palavras, que foram publicadas em número de Ano Novo de 1941 de O Comércio do Porto, a respeito do custo da vida:

A média dos números-índices dos primeiros dez meses de 1939 foi de 100,2; a dos mesmos meses de 1940 (únicos publicados à data) foi de 110,1. O aumento é de 10 por cento, o que não é muito numa Europa em apertado regime de racionamento, quando não de fome.

E mais adiante, a propósito do numerário circulante:

O aumento médio foi (entre as mesmas épocas) de 16,6 por cento e portanto superior ao aumento médio do custo da vida.

E acrescentava:

Logo, para explicar o aumento do custo da vida de 1940 não é preciso recorrer directamente ao estado de guerra, pois bastam para tanto os naturais efeitos do aumento do numerário circulante.

Nos fins de Janeiro seguinte, isto é, de 1941, verifiquei, com certo espanto, que a inflação monetária já ia em 35 por cento. Isto levou-me a iniciar imediatamente uma série de artigos para o mesmo jornal, a dar o alarme. Saiu o primeiro logo no dia 4 de Fevereiro, intitulado «Inflação». O segundo, intitulado «O fulcro», foi publicado a 11. O terceiro, com o título «Esterilização», devia sair no dia 18 do mesmo mês, mas não saiu porque a censura não deixou.
No primeiro artigo fazia um resumo da história da inflação da nossa moeda durante e depois da outra guerra, e tirava para o caso presente as conclusões que a lógica impunha.
São desse artigo as seguintes palavras:

Claro que, se a circulação fiduciária duplicar, embora a libra esterlina continue a 100$, como estamos supondo, o poder de compra do escudo descerá, por mais esforços que as justiças empreguem contra os chamados açambarcadores. A libra esterlina poderá continuar a 100$; o custo da vida é que subirá de cerca de 100 por cento, pelo menos... Isto é o que diz a razão o a experiência vai confirmando, pois o custo da vida está subindo já, e basta o aumento da circulação fiduciária para explicar essa subida, como vimos no nosso artigo do Ano Novo.

E acrescentava:

Quer dizer, embora a origem da actual inflação monetária seja diversa da da outra guerra e os seus efeitos em parte sejam diferentes, noutra parte tom de ser os mesmos. E deve dizer-se que é justamente na parte mais importante para o público e para o Estado que os efeitos desta inflação são exactamente os mesmos da outra. Seja qual for a origem da inflação monetária, logo que ela ultrapasse certos limites a desvalorização interna da moeda é certa e inevitável. Ora, desvalorização da moeda quer dizer carestia da vida, e é nisto que todos estamos interessados - nós e o Estado.

E terminava esto artigo com estas palavras:

Os povos compreendem que há um mínimo de sacrifícios a que se não pode fugir, e que por isso é preciso aceitar de cara alegre. Quem assim não fizer agrava a sua situação, não a melhora. Querer levar os governos a afastar esse mínimo de sacrifícios é tempo perdido, pois é agravar os males que hão-de vir.
O mais que os povos podem exigir é que os governos reduzam as dificuldades e os encargos ao mínimo indispensável, ao estritamente necessário. Aplicando esta doutrina ao nosso problema, também nele há um mínimo de dificuldades que são irremediáveis. Esse mínimo teremos de o suportar, quer queiramos quer não. O que é preciso é procurar qual é esse mínimo e a forma de o alcançar. Todo o problema está nisso.

Ora, Sr. Presidente, este mínimo de sacrifícios nem implicava a inflação, nem implicava a distorção dos preços que anarquizou a economia nacional e deu pretexto à espoliação da imensa maioria dos portugueses a que já nos referimos. Este mínimo era muito mais humano.
No segundo artigo, depois de demonstrar com toda a clareza e evidência qual a origem da inflação em curso, dizia:

Este grave problema (o da inflação) não se compadece com meias soluções, com meias medidas. É preciso pô-lo nos seus verdadeiros termos e dar-lhe solução adequada.
Como vimos no nosso último artigo, a experiência da Grande Guerra faz prever que o valor total da nossa moeda continue a crescer enquanto durarem as hostilidades e que esse aumento se prolongue ainda durante alguns meses depois delas findas, devendo passar para além de 40 milhões de libras esse valor total. Passados, porém, alguns meses sobre o armistício, a nossa balança de pagamentos tornar-se-á negativa, e o valor total da nossa moeda começará a decrescer e descerá lentamente abaixo da média de 20 milhões de libras.

E, depois de explicar o mecanismo desta baixa, concluía:

A queda dos preços e a rarefacção do numerário seriam verticais e a crise que daí resultaria não ficaria a dever nada (salvo as devidas proporções) à que se deu na América em 1929.
A inflação em marcha não tem só os inconvenientes que lhe apontámos no nosso último artigo no que respeita à carestia da vida e ao círculo vicioso em que põe as finanças públicas; tem também este: o de nos lançar para uma crise fiscal de gravíssimas consequências.

O terceiro artigo desta série tinha, entre outras passagens que por brevidade omitimos, as seguintes:

Se as coisas continuarem no caminho que estão levando, não só os preços subirão para mais do dobro, mas iremos direitos a uma crise financeira e económica que deixará a perder de vista a de 1923-1924, que foi talvez a mais aguda por que passámos há cinquenta anos. Para sair deste plano inclinado é preciso tomar providências desde já, mas não basta, evidentemente, recorrer à polícia.