13 DE DEZEMBRO DE 1946 141
E acrescentávamos:
O problema monetário tem duas fases, ama interna e outra externa. A cada uma destas fases corresponde um problema particular, que tem de ser estudado em separado.
No caso português actual a solução que se pede e deseja, tanto da parte do público como do Estado, é a fixidez do poder de compra, ou seja a estabilidade dos preços no mercado interno, dentro das possibilidades permitidas pelo estado de guerra.
Para a face externa, a solução que o Governo tem determinado é também a da estabilidade em relação à libra esterlina, embora se preveja a possibilidade de oscilações, que podem ir longe mas que até agora se limitaram à queda da libra da vizinhança de 110$ para 100$.
Foi na vigência deste regime monetário que a circulação fiduciária aumentou em dois anos de 35 por cento. E se este regime se mantiver a inflação e o seu cortejo de efeitos desastrosos continuarão, ainda mesmo que a polícia se lhes oponha na sua máxima força.
Isto foi escrito em meados de Fevereiro de 1941, para ser publicado no dia 18.
Seguia-se no artigo a técnica a aplicar, e que era pura e simplesmente a técnica usada a América anos antes para a chamada esterilização do ouro e que consistia no levantamento dos empréstimos precisos para recolher as notas à medida que elas fossem saindo do Banco do Portugal. Mais tarde, quando viesse a vazante, o empréstimo seria amortizado pela venda das cambiais que lhe serviam de contrapartida. O artigo terminava assim:
Quanto aos juros e mais despesas inerentes à gestão do empréstimo, podiam sair dos próprios lucros da operação e do rendimento dos valores-ouro e cambiais da sua contrapartida.
Os lucros da compra e venda do ouro, valores-ouro e cambiais da contrapartida dos empréstimos de esterilização dependem da solução que se pretender dar à outra parte do problema monetário, isto é, à face externa, ou seja ao problema cambial, mas isso é já outra questão que fica para o próximo artigo.
O artigo aqui prometido não chegou a ser escrito por este ter sido suspenso.
Tive pena que a censura se tivesse mostrado tão incompreensível e sempre supus que não era papel seu intrometer-se em assuntos deste quilate, que nada tem que ver com a estabilidade social nem tão-pouco com a Constituição Política, ou segurança do Estado.
Foi no mês de Janeiro de 1941, Sr. Presidente, que se começaram a fazer sentir aquelas correntes que obrigavam a fazer unia correcção nas agulhas das finanças publicas. Fez-se por acaso essa correcção? Não.
Recorreu-se à polícia e aos tabelamentos para evitar as necessárias consequências da inflação. Entortaram a vara e queriam que a sombra continuasse direita. O recurso aos empréstimos veio muito depois, tarde e a más horas, e com tal timidez que os seus resultados foram diminutos.
E o que resultou deste conjunto de circunstâncias foi que aos males monetários da inflação se acrescentou um outro, o pior de todos, que num país poupado pela guerra podia muito bem ser evitado: a distorção dos preços.
Disse o Sr. Ministro das Colónias no seu notável discurso:
No nosso País, como nos outros, a alta dos preços constitui centro de atenções gerais. Fonte de dificuldades do Governo é também o factor principal de descontentamento e o pior conselheiro do povo.
Peço licença para discordar de S. Ex.ª A cansa profunda do mal-estar e da irritação da grande massa da população, cá e lá fora, não é a inflação dos preços, mas a sua distorção. O que importa ao trabalhador, ao operário, ao empregado de escritório, ao funcionário público, que constituem a imensa maioria da população mundial, não é que os preços subam, é que os seus ganhos os acompanhem. Só a classe dos que vivem de juros ou rendimentos equivalentes, que é uma pequeníssima fracção populacional, é que põe o problema como o Sr. Ministro das Colónias o pôs. O povo do campo, que tem um sentido muito apurado das coisas económicas, dizia e com razão: «deixem subir os preços e subam também os salários. Ficará tudo certo».
O agravamento não proporcional dos preços é que foi a causa dos atropelos e dos desesperos em que foi lançada a imensa maioria do povo português.
Foi a distorção dos preços que deu origem às extorsões de que foram e estão sendo vítimas os produtores de cereais, de azeite, de lenhas o de todos os géneros agrícolas tabelados. Foi ainda a distorção dos preços que enriqueceu e está enriquecendo certos sectores da indústria e do comércio. O grande mal de que a Nação enferma vem daqui.
E que remédios nos são propostos para que estes males findem?
A paciência evangélica, a fim de aguardarmos os efeitos da «ordem natural das coisas». Ora a ordem natural das coisas, ajudada pelas brigadas de combate ao «mercado negro», deu isto que V. Ex.ªs acabaram de ouvir e muito bem conheciam antes que eu lho dissesse.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Que dará este plano daqui em diante? Eu o vou dizer a V. Ex.ªs
Segundo as notícias que têm vindo a lume da Inglaterra, França e até da América do Norte, o mercado internacional só começará a ser fornecido sofrivelmente daqui a um ano ou dois.
A nossa balança comercial já está deficitária, mas a balança de pagamentos está ainda favorável. Quando é que esta se tornará também desfavorável? É possível que dentro em breve, mas ninguém o sabe ao certo. O que se pode afirmar de ciência certa é que, enquanto o mercado internacional não for abastecido com largueza, os saldos da nossa balança de pagamentos, mesmo que sejam negativos, serão muito pequenos para produzirem um desfalque sensível nas reservas de ouro e cambiais. É preciso não esquecer que temos grandes partidas de vinhos do Porto para exportar e muitos outros produtos, cuja procura não afrouxará tão cedo, felizmente.
Consequentemente, só lá para daqui a dois anos é que o nosso stock de ouro e cambiais começará a ser desfalcado de modo sensível. E daqui até lá que vai suceder?
Se o movimento de baixa nos depósitos à ordem, a que já nos referimos, continuar, e é natural que continue, visto que o dinheiro começa a ter procura e o juro está com tendência altista, segundo consta, se assim suceder, depressa os bancos comerciais começarão a levantar os seus depósitos no Banco de Portugal o a rubrica «Bancos e banqueiros» passará a esvaziar-se. Isto significa, como já foi dito, a passagem da circulação potencial para a actual. E teremos então dois movimentos simultâneos: a deflação da moeda bancária e a inflação da moeda propriamente dita, num montante que a pode levar a mais de 15 milhões de contos.
Ora só esta inflação importa directamente ao custo da vida e só por esta se faz o alinhamento dos preços. Quando daqui a dois anos, ou mais, começar a nossa balança de pagamentos a ser fortemente deficitária, já a