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13 DE DEZEMBRO DE 1946 135

massa, que muitas vezes se não encontram por irregularidades de distribuição.
Como é possível que um Estado que se diz pessoa de bem, e o é, na verdade, pela sua doutrina e pela honorabilidade dos seus governantes, imponham aos povos obrigações teoricamente certas mas praticamente absurdas e desconcertantes?
Talvez porque a organização se montou sem os devidos estudos, com o desconhecimento ou com conhecimento imperfeito das realidades o da própria geografia. Um estudo prático e regional da execução das leis poderia facilitar os serviços do distribuição em normas mais cómodas, mais fáceis e mais eficientes, por isso com maior proveito para o País e para o Estado.
Impõe-se uma reforma dos serviços do racionamento e tanto mais urgente e necessária quanto os erros praticados estão prejudicando os sadios c louváveis esforços do Sr. Ministro das Finanças em favor das famílias pobres, visto que todas estas imposições dos organismos pré-corporativos e para-corporativos se lançam sem qualquer discriminação das situações económicas, como manda a lei, atingindo em igualdade de encargos os pobres e os ricos.
Sr. Presidente: numa hora grave e solene de crise económica os senadores romanos impuseram a si mesmos taxas superiores às de todos os demais cidadãos e ao mesmo tempo isentaram de toda a tributação as famílias pobres, alegando que essas famílias pagam à república o maior tributo, que é criar os filhos.
Nesta justa compreensão da finalidade do fisco parece inspirar-se a reforma do imposto sucessório, afirmada e prometida na lei em discussão.
Para que a Assembleia possa colaborar no seu estudo e aperfeiçoamento, em ordem a um resultado mais largo, é preciso que ela conheça o montante do todas as imposições que oneram a economia nacional.
Peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, se sirva solicitar dos Srs. Ministros e demais autoridades do Governo a quem o assunto está afecto se dignem providenciar no sentido de que, no futuro, com a lei de meios, venha a esta Assembleia a informação de todas as receitas que pesam sobre a economia nacional. Só assim a fiscalização poderá ser exacta, justa e eficiente.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Interrompo a sessão por alguns minutos.

Eram 17 horas e 58 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 10 minutos.

O Sr. Pacheco de Amorim: - Sr. Presidente: a palavra «rumo» está hoje muito em voga. Ainda há pouco vi num mesmo mostruário exemplares de três obras em cujo título se lia esse termo: a revista Rumo, Novos Rumos e Linha de Rumo.
Também as palavras estão sujeitas à tirania da moda; também os termos acabam por enjoar, à força de repetidos ; também as locuções se gastam com o uso; também para os nomes há Verão, Inverno ou entre-tempo. Se a linguagem é uma psicologia petrificada, como dizia Stuart Mill, porque nela se registam os estratos mais profundos e mais estáveis das aspirações e gostos do povo que a fala, os termos em voga constituem uma psicologia movediça que traduz as necessidades e as preocupações da hora que passa. O que dá neste momento oportunidade ao termo «rumo» é a incerteza, a preocupação, a angustiosa dúvida em que hoje se vive. Paira no ar o pressentimento de que houve algures um desvio que urge rectificar; que algo na vida portuguesa perdeu o rumo ... ou se desviou dele.
Será assim?
É a nós, Sr. Presidente, como legítimos representantes da Nação, por ela directamente eleitos, que cabe o encargo, a honrosa e nobre obrigação, o espinhoso e amargo dever, de traduzir em palavras claras e insofismáveis a inquietarão geral dos espíritos, a reviravolta que só deu nas almas, a onda de incertezas que assola o País de norte a sul.
Como representação nacional, o Parlamento deve ser como que um pequenino mapa onde os governantes possam ver com a máxima nitidez possível as aspirações espirituais e as necessidades reais da Nação. É por este mapa que os governantes têm de traçar o rumo à nau do Estado.
Enganados vivem os Governos que julgam que as suas melhores informações lhes são fornecidas pela burocracia. Não sou daqueles que negam a esta imprescindível classe todas as virtudes e a odeiam como M incómodos parasitas. Esto conceito de burocracia já não tem hoje razão de ser. Esta classe é tão imprescindível à vida social moderna como qualquer outra das grandes classes em que a Nação se divide. Burocracia ó a força armada, burocracia é o magistério na quase totalidade, burocracia é a magistratura, burocracia é o Estudo. Suprimir a burocracia sem suprimir o Estado, seria regressar à barbárie. Pode suprimir-se o comércio livre, a indústria livre, a agricultura e a banca livres e fazer de tudo isso burocracia, sem que o regresso a primitivas eras seja logicamente necessário. Ò que não pode é suprimir-se o Estado sem voltar aos mais recuados tempos da pré-história.
Simplesmente, nem o exército, nem o magistério, nem a magistratura, nem qualquer dos outros ramos da burocracia, nem toda a burocracia junta, se podem tomar como legítima nem adequada representação nacional, porque nem é essa a sua função legal, nem a sua capacidade natural. E essa função, e essa capacidade, ó a nós, Sr. Presidente, e só a nós, que pertence.
Disse alguém que muito honrou esta Casa com o brilho da sua palavra e fulgor do seu espírito que a pior das Câmaras era melhor do que a melhor das camarilhas. Ora é sabido, porque a História o regista em longas e por vezes bem dolorosas páginas, que onde as Câmaras se apagam as camarilhas surgem, como tentáculos de invisível e misterioso polvo, como secretos agentes de multiforme Proteu que as anima, as maneja, as orienta e as paga. E a camarilha prepara o ambiente, espalha as nuvens de fumo, lança o veneno, colhe a presa e some-se sem deixar vestígios da sua passagem.
Bem diferente é a acção de um Parlamento, Sr. Presidente, porque trabalha às claras, em sessões públicas, que todo o mundo pode presenciar, de que a imprensa dá extensas notícias e o Diário das Sessões faz pormenorizados relatos. O Parlamento é responsável, perante a Nação e perante a História, pelo que diz e faz e polo que consente e cala. A sua responsabilidade é individual e inalienável.
Um Deputado pode errar, que isso é humano, mas fica amarrado ao seu erro no Diário das Sessões.
Um Deputado pode ser subserviente, adulador, sabujo perante o Poder, seja de manto e coroa, seja de pé descalço. Pode, na verdade, mas a curvatura da sua espinha ficará indelevelmente projectada nos anais parlamentares.