300 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 75
E não peca por exagero computar-se em cerca de 20 por cento da receita bruta o montante das contribuições e impostos pagos por cada industrial!
De resto, o preço de venda das especialidades farmacêuticas não depende do livre arbítrio do produtor. A disciplina dos preços tem forte e apertada regulamentação legal (decreto-lei n.º 29:537, de 18 de Abril de 1939, artigo 15.º, e citado despacho de 15 de Abril de 1941, artigo 7.º e parágrafos).
Com efeito, os preços de venda ao público dos medicamentos especializados são propostos pelos fabricantes à Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos. Por isso, não pode a indústria nacional de especialidades farmacêuticas, ao contrário do que sucede com a totalidade ou quase totalidade das restantes indústrias, fixar e alterar livremente os preços dos seus preparados, visto tal fixação e alteração dependerem, sempre e obrigatoriamente, de prévia autorização daquele organismo de coordenação económica.
E, no exercício desta competência, tem sido a Comissão Reguladora tão escrupulosamente cautelosa que, ao ser-lhe submetido algum pedido de fixação ou de alteração de preço, exige do requerente uma detalhada justificação, acompanhada da competente prova, só concedendo a solicitada autorização depois de se assegurar de que no preço não há vislumbre de especulação ou de lucro desmedido.
Para tanto, exige do requerente a mais minuciosa discriminação e justificação do preço de fabrico e, frequentemente, não anuindo ao proposto preço de venda, altera-o, reduzindo-o.
Quando autoriza o aumento de preço de venda, limita-o escrupulosamente ao correlativo aumento de preço das matérias-primas e das embalagens, o que, em relação àquele, reduz a percentagem de lucro líquido.
Acresce que os aumentos de preço de venda têm sido insignificantes, tanto em número como em valor, dado que os industriais, cônscios da gravidade do momento que passa, só tem recorrido a esse meio quando as circunstâncias em absoluto o impõem.
E - o que é mais - logo que se anteolha hipótese de barateamento do medicamento nunca os industriais deixam de o praticar (por exemplo: em 1946 foi pedida u Comissão Reguladora autorização para baixar o preço de venda de 111 especialidades nacionais).
Nestas condições, torna-se aos industriais de especialidades farmacêuticas absolutamente impossível a menor especulação com os preços (e, ainda que lhes fosse possível praticá-la, nunca a fariam, pois bem conhecem os deveres primários que a defesa da saúde e da economia públicas lhes impõem), que, como se disse e não é demais repisar, não são fixados livremente por eles, mas antes pela Comissão Reguladora rios Produtos Químicos e Farmacêuticos.
Se fosse fundada a persuasão dos referidos Srs. Deputados - qual a de que cos lucros auferidos pelos fabricantes de especialidades farmacêuticas são muito grandes» -, a Comissão Reguladora tinha negado a razão de ser básica da sua existência, certo como é que lhe compete c... disciplinar e fiscalizar ... a indústria dos produtos farmacêuticos, tendo principalmente em vista ... a manutenção do justo preço dos produtos» (decreto n.º 30:270, artigo 4.º, n.º l.º), para o que deverá «fixar ... os preços dos produtos ...» (citado decreto, artigo 5.º, n.º 11.º).
Cabe aqui fazer referência, ainda que célere, a uma circunstância que onera fortemente o preço de várias especialidades farmacêuticas nacionais: o preço do açúcar.
Na verdade, desde Fevereiro de 1945 que o preço do açúcar para a indústria de medicamentos especializados (que, assim, ficou com tratamento igual ao dado à indústria de confeitaria ...) foi aumentado para 12$ por quilograma, por ter sido elevada para 6$20 a taxa destinada ao fundo de compensação de fretes marítimos! Quer dizer: o aumento de preço da matéria-prima que é o açúcar foi superior a 100 por cento.
O agravamento anual das despesas com este aumento vai de 5.580$ a 148.800$ para os laboratórios que consomem mensalmente cerca de 2:000 quilogramas de açúcar, o que para alguns representará uma absorção total de lucros, pois são muitas as especialidades em que na respectiva composição entra o açúcar, e especialmente nas formas farmacêuticas, xaropes, granulados, confeitos e alguns elixires entra em larga percentagem (em algumas em mais de 40 por cento).
Se as empresas auferissem os lucros muito grandes que se lhes imputam, seguramente não teria o Sr. Ministro das Finanças julgado procedente a solicitação que este Grémio teve a subida honra de formular para que «no lançamento da contribuição industrial às empresas suas agremiadas haja o maior cuidado e ponderação, de forma a evitar-se que as que se propõem desenvolver certos fabricos, que impõem a inversão de copiosos capitais, fiquem exageradamente sobrecarregadas e desistam dessas iniciativas s (Setembro de 1945).
E, do mesmo passo, não teriam sido julgados procedentes os recursos e reclamações que a quase totalidade das empresas levou da liquidação do imposto sobre lucros extraordinários de guerra.
Parece, assim, manifesto que os lucros dos industriais aqui representados são bem modestos, por o preço dos medicamentos ser módico; mas, se lhes fosse possível diminuir os preços dos produtos, gostosamente o fariam, para mais ainda contribuírem para a situação ideal de todos os portugueses se poderem tratar - problema social de projecção decisiva na saúde pública e na vida da Nação.
Sr. Presidente: a indústria portuguesa de medicamentos especializados é hoje uma realidade e um valor na economia nacional, como exuberantemente o patenteiam as 2:142 especialidades farmacêuticas nacionais (muitas delas compreendendo formas farmacêuticas diversas) que os ficheiros deste Grémio registavam no último dia do ano que findou há pouco e que todas as farmácias do País dia a dia fornecem para sarar os achaques da população portuguesa.
Acalenta ela a esperança d« mais e mais prosperar, científica e industrialmente, pois, se é certo que com o fim da guerra o consumo de especialidades importadas voltou a subir (e esta ascensão seguramente tomará maior vulto quando os medicamentos importados chegarem em maior volume, parecendo indúbio que a indústria estrangeira fará todos os esforços para reconquistar o mercado português), não é menos certo que poderá rapidamente ser sustado se os Poderes Públicos tomarem as medidas proteccionistas a que a indústria nacional tem inteiro jus - medidas que serão tomadas não só «m favor dos seus legítimos direitos e interesses, como ainda nos da própria economia nacional, em que os do consumo se integram.
(Todos os elementos estatísticos referidos nesta exposição podem ser comprovados pelo Ministério das Finanças ou pela Comissão Reguladora dos Produtos Químicos e Farmacêuticos).
Estas as considerações que este Grémio entendeu dever levar ao esclarecido conhecimento de V. Ex.ª, Sr. Presidente, e ao dos Srs. Deputados à Assembleia Nacional, alicerçadas em exclusivo na eloquente e incontroversa linguagem dos números.
Lisboa, 17 de Janeiro de 1947. -A bem da Nação. - Grémio Nacional dos Industriais de Especialidades Farmacêuticas, a Direcção: Bernardo Augusto da Costa Simões- Manuel Leite â a Silva - José Sebastião Viegas.