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28 DE FEVEREIRO DE 1947 673

O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: julgo que foi entregue a V. Ex.ª, mas pelo menos foi distribuída pelos Srs. Deputados da Nação, uma representação do Grémio Concelhio dos Comerciantes de Carnes do Porto acerca da forma como naquela cidade e concelhos limítrofes, por decisão do Sr. governador civil do distrito, se procede ao abastecimento e comércio de carnes verdes.
Antes de mais nada, quero louvar a frequência com que muitas entidades, cujo número nesta sessão legislativa excede talvez a centena, estão usando o direito consignado na Constituição de representar perante a Assembleia Nacional.
Julgo que isto tem algum significado político, e o significado político que lho empresto é daqueles com que a minha qualidade de Deputado profundamente se satisfaz.
Porquê?
Ao contrário do que sucedia em épocas antigas, o povo habituou-se a respeitar a forma como os Deputados, perfeitamente isentos de qualquer espírito regional ou partidário, zelam nesta Assembleia os verdadeiros interesses gerais.
Vai passado o tempo em que a missão do Deputado, dificultada pelo excessivo partidarismo político ou tolhida pelo espírito de facção, andava nas bocas do mundo como coisa menos digna de crédito. Hoje discutimos e votamos com liberdade completa. Esta Câmara é vivo exemplo disso, exemplo que só não salta aos olhos daqueles piores cegos que, como ontem disse o nosso colega Bustorff da Silva, são os homens que não querem ver!
Sr. Presidente: na Assembleia Nacional todos os homens que dela fazem parte -todos, sem excepção alguma! - não hesitam nas críticas ao Executivo, mesmo quando no Poder se encontram os seus melhores amigos políticos. Ora, repito, isto nem sempre aconteceu no passado, pese a quem pesar, principalmente àqueles que falam nas infindas glórias dos Parlamentos de sessões infindas, onde os discursos eram infindáveis ...
Isto só não salta aos olhos dos cegos que não querem ver, porque ainda na presente sessão legislativa toda a gente pôde verificar, além de numerosas críticas a serviços, no período regimental de antes da ordem do dia, o modo elevado e imparcial como esta Assembleia tem discutido as propostas de lei do Governo, que nem sempre foram aprovadas e que nunca foram aprovadas sem alterações. E nos dois decretos-leis submetidos a uma ratificação recusámos a sua ratificação pura e simples, no primeiro caso por unanimidade e no segundo por maioria escassa.
Pergunto à consciência da gente de bem: qual seria o Parlamento partidário em que a maioria governamental teria coragem de proceder de forma semelhante?
Apoiados.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Isso é uma verdade que muitos ignoram. Eu assisti.

O Orador: - Por isso, Sr. Presidente, aconteça o que vier a acontecer na minha vida política, quero declarar perante V. Ex.ªs e perante o País a minha inteira, mais completa e mais formal solidariedade com a Câmara dos Deputados, porque me orgulho de pertencer a ela.
Não o afirmo para que V. Ex.ªs me apoiem ou mo agradeçam. Digo-o para que não sejam tecidas fantasias sobre qualquer atitude minha no futuro. Tenho orgulho do pertencer a esta Assembleia e sinto que ela procede dentro dos mais altos sentimentos patrióticos.
Ninguém seria capaz de fazer melhor do que fazem os restantes Deputados, e por isso admiro sinceramente a atitude de todos.
Por parte dessa gente que tudo critica pode alegar-se ainda, em relação ao funcionamento desta Câmara, que ele não é absolutamente perfeito.
Sr. Presidente: peço a V. Ex.ª que me desculpe o facto de, arrastado por estas minhas considerações, estar a afastar-me do assunto para que pedi a palavra. Mas V. Ex.ª verá quanta razão tenho para considerá-las oportunas.
Ainda na sua crítica à nossa actuação política, os adversários acusam a Assembleia Nacional de, pelo menos, dois defeitos: primeiro, o de não possuirmos o poder de derrubar Ministérios...

O Sr. Henrique Galvão: - Felizmente...

O Orador: - Segundo, o de não termos a faculdade de elevar despesas, isto é, de criar legislação que porventura as aumente. Atacam-nos porque em ambos estes dois casos, segundo crêem, nos distinguimos desses bons e queridos Parlamentos, maravilhas da democracia, que eles dizem existir em todos os países progressivos do Universo.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Todos não...

O Orador: - Ia já dizê-lo: a maior, mais rica e melhor organizada democracia do Mundo, aquela que fornece mais alto exemplo de progresso, os Estados Unidos da América do Norte, vive em regime presidencialista. Nem a Câmara dos Deputados nem o Senado podem derrubar Ministérios. Eu, como muitos de V. Ex.ª, fomos discípulos dum grande presidencialista, por isso mesmo nos sentimos bem nesta Câmara. Este sistema é bom para o espírito dos anglo-saxões, ou descendentes de anglo-saxões, moderado, pacato, quieto e prudente, que só digere as ideias ao fim de vinte minutos e só as executa uma hora depois de compreendidas. Maior utilidade deve possuir para os bons latinos, precisamente porque nós, latinos, somos quase sempre irrequietos, rápidos ou precipitados. O sistema convém-nos por moderador dos ímpetos políticos. Isto quanto à função política da Assembleia Nacional.
E, quanto à sua função financeira, pergunto aos ilustres oposicionistas que criticam a limitação constitucional do direito a criar despesas quem inventou neste País a famosa lei travão? Não foi, por acaso, o Sr. Dr. Afonso Costa e não esteve ela fèrreamente em vigor em Parlamentos anteriores a 1926?

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Terminado o que tinha a dizer em elogio da frequência com que se apresentam exposições à Assembleia Nacional, volto ao assunto da que nos dirigiu o Grémio Concelhio dos Comerciantes de Carnes do Porto. Recordarei que ainda há poucos dias o Sr. governador civil do Porto, o meu camarada e amigo coronel Joviano Lopes, foi objecto por parte das entidades mais representativas do seu distrito de imponente manifestação de simpatia, altamente expressiva de identificação política, a propósito do 1.° aniversário da sua posse.
Apoiados.
Quero - e vejo, pelos apoiados que escuto, poder contar com o aplauso da Câmara - aproveitar esta oportunidade para me associar a essa justíssima manifestação, porque ela representou, a par do agradecimento por uma orientação política verdadeiramente nacional, gratidão entusiástica pelos cuidados que ao governador civil do Porto vem merecendo o abastecimento da população do seu distrito.

Vozes: - Muito bem!