1 DE MARÇO DE 1947 693
desde 1931 haviam de percorrer o Mundo inteiro. Na verdade, o barómetro financeiro e monetário português indicara durante tantos anos mau tempo e até grossa tempestade que custava a supor que tivesse passado para região de tempo mais bonançoso. Os banqueiros teriam razões sérias de desconfiança. Aos primeiros estremecimentos da crise que se avizinhava a frágil agulha não mudaria de rumo e voltaria a indicar o abismo? Desde 1891 que tínhamos abandonado o padrão-ouro, salvo um pequeno período em 1907
Mas desde 1914 até 1928 deficits orçamentais constantes, uma circulação fiduciária que vai até 1:990 milhares de contos, inúmeros bilhetes de Tesouro, saldo negativo na conta «Caixa», depreciação fantástica em relação ao ouro, a possibilidade de uma tutela estrangeira, mil e um sintomas alarmantes, atestavam, a gravidade da doença. Como supor então que já em 1930 estão em via de regularização as finanças públicas portuguesas? Há saldos positivos e liquidam-se os compromissos da dívida flutuante externa. A dívida flutuante está a desaparecer.
A contabilidade pública vai-se tornando mais clara e mais exacta.
A reforma tributária está em marcha, regularizou-se o crédito.
Tão brusca transformação devia desnortear o observador superficial. No momento crítico em que vão naufragar as mais poderosas moedas com largos pergaminhos de estabilidade e seriedade, o escudo português renasce, como a Fénix, das suas cinzas. Ë que, nas palavras do autor da reforma monetária portuguesa, uma vez regularizadas as finanças públicas, a circulação da moeda deixou de ser afectada pela» necessidades de tesouraria ou pelas existências dos deficits e passou apenas a ser determinada pelas condições económicas.
Em 9 de Junho de 1931 a reforma monetária consagrava os resultados da política de estabilização.
A agulha do barómetro português, no meio da tempestade geral, teimosamente, heroicamente, indicava o bom tempo.
O Banco de Basileia, entretanto, acudia aflito ao desmoronar do Credit Anstalt austríaco. A seguir eram os bancos alemães e o banco hungaro Magyar Nemzeti Bank. Os câmbios oscilam loucamente. Em Setembro era a libra que caía, arrastando vários países. As próprias reservas de ouro americanas afiguram-se ameaçadas. O Banco tem de socorrer numerosos países, navegar perigosamente numa onda de inflação que arrasta o Chile, a Grécia, o Sião, o Peru, a União Sul-Africana. Não me consta que se tivesse de preocupar com a situação portuguesa. O alinhamento com a libra, ditado por razões de realismo económico indiscutíveis, pôde fazer-se sem o auxílio do Banco Internacional. O abandono do padrão-ouro realiza-se, portanto, num ambiente de absoluta confiança na solidez da moeda nacional.
No centro internacional onde se discute a seriedade das moedas o escudo português começa a ser aceite sem discussões. No caos monetário em que mergulha a Europa, esta moeda apresenta-se com características clássicas que impõem respeito ...
Mas, Sr. Presidente, o silvo triste das locomotivas em marcha para os mais variados, destinos continua a perturbam a calma serena do Banco Internacional.
Desaparece no fumo ténue do passado a sua luta a favor do padrão-ouro, as suas desilusões perante a política monetária americana.
Em 3 de Julho de 1933 nasce o chamado bloco-ouro constituído pela Bélgica, França, Itália, Holanda, Polónia e Suíça. Mas logo a seguir temos Otawa a proclamar que o verdadeiro problema a resolver é conciliar a estabilidade dos câmbios com uma estabilidade razoável do nível dos preços internos e mundiais. É certo que o Banco exulta com os resultados da Conferência de Londres (27 de Julho de 1933), que proclama o predomínio do ouro, e nem o Silver Purchase Act, que determina o aumento das reservas em prata dos Estados Unidos, consegue destruir o seu optimismo.
Esta fé extraordinária no ouro que o Banco Internacional manifestava estava perfeitamente nas tradições dos banqueiros. O que caracteriza o sistema do padrão de ouro, sob o ponto de vista internacional, não é a possibilidade da conversão do papel em metal, mas, sobretudo, a disponibilidade de divisas sempre prontas a serem libertas e a encontrarem tomador logo que uma moeda atinge os gold points. A moeda é um meio de medir, trocar ou poupar riqueza. O ouro pareceu desde remota antiguidade reunir as condições próprias de uma boa moeda: prolongar-se no espaço a sua aceitação, manter-se constante o seu poder de compra.. Não admira, portanto, que o Banco Internacional se tivesse pouco a pouco tornado o defensor intransigente do padrão-ouro. A gigantesca produção das minas, sobretudo desde 1890, época em que começam a ser exploradas mais intensamente as minas do Transvaal, permite uma intensa vida económica mundial, uma prosperidade incrível até à guerra de 1914. As velhas e clássicas lutas entre monometalistas e bimetalistas terminam. Na realidade eram os factos económicos a impor o ouro, mais que a teoria: uma produção intensa das minas - as reacções entre si dos mercados monetários para evitar conversões de moeda de ouro em prata ou de prata em ouro.
A extensão da área do padrão-ouro era cada vez maior. Estava criada, por assim dizer, uma unidade de preço internacional, um denominador de valor comparável ao metro para o sistema linear.
E uma das características da história humana de repetir periodicamente as mesmas experiências.
A primeira reunião de peritos para tratar deste momentoso assunto julgo ter sido em Génova, de 29 do Outubro de 1445 a 21 de Junho de 1447. A guerra de cem anos dura há mais de um século e a grande República de Veneza sofre com a desordem monetária que vai pelo Mundo. No fim de dois anos de trabalho o relatório foi apresentado pelos peritos.
Uma minoria, com Gaspare Gentile Luciano Grimaldi, aconselhava um estranho sistema de três moedas: ouro, prata e moeda desvalorizada estrangeira. A maioria, dirigida por Benedetto Centurione, recomendava o padrão-ouro. Era bem conhecido dos portugueses, pois seu irmão Paulo negociava em Lisboa.. A casa tinha até a distinção de contar entre os seus viajantes Cristóvão Colombo, que uni dia havia de ser célebre.
O que é certo é que todas as letras sobre Génova passaram a ser emitidas na nova moeda - o ouro. Esta solução da casa Centurione não era isenta de ganância comercial, pois organizava imediatamente uma expedição em busca de minas de ouro no Sudão. Contudo, dera ao Mundo um sistema que durante imenso tempo funcionou satisfatoriamente.
Sr. Presidente: não posso duvidar que passaram por Basileia evocações desses velhos tempos. Parecia que Centuirione é que tinha razão e que fora muito mais feliz que os numerosos peritos reunidos, também em Génova, em 1922.
Estes tinham encontrado três recomendações a fazer aos Governos:
Uma referente a estabilização dos preços; outra, aquilo que se chamou o Gold Exchange Standard, e, finalmente, a cooperação dos bancos emissores.
Os peritos achavam que seria suficiente estabilizar o crédito, e assim se mantinham as moedas ao par entre