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734 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 96

Aludi, é certo, ao passado, mas a fim de obter o claro-escuro indispensável para bem destacar as linhas do destino para que nos encaminhamos. Procurarei, todavia, ser suficientemente realista para em problemas de tanta monta não demorar a atenção em águas passadas...
O futuro, sim, esse é que importa!
A uma pobre multidão apoquentada por dificuldades de abastecimento, insuficiências de géneros ou de réditos, angústias diárias, o pavor do dia de amanhã, esclarece-a bem e melhor a informação das probabilidades dos melhores dias que se aproximam do que a história pregressa do que foi ou poderia Ter sido a situação monetária.
Daqui o rumo que inicialmente dei e que desejo manter nas minhas considerações.
Ouvi embevecido o Sr. Dr. Pacheco de Amorim quando discorria sobre a especial predisposição dos matemáticos e dos juristas para o estudo das ciências económicas.
Persisto, porém, na minha.
O mal não provém dos estudiosos, sejam eles homens de cultura científica ou homens de ciência juridica; antes se contém, específicamente, na própria ciência.
É que esta «ciência económica» anda estreitamente ligada ao exame das crises económicas.
As crises económicas actuais são, por sua vez, um fenómeno nascido já em pleno regime capitalista.
E não me afasto grandemente da linha dorsal do problema se acrescentar que a juvenilidade de tal «ciência» origina, repetidas vezes, autênticas bizarras por banda dos respectivos cultores.
Um exemplo recente e flagrantíssimo basta:
Ninguém ignora que são conceitos clássicos da moeda os de que esta é:
Uma mercadoria;
Um meio de trocas;
Uma medida de valor;
Um instrumento de capitalização e um capital.
São axiomas ou proposições que nenhum cultor da ciência económica, matemático ou jurista, perde tempo a discutir? Pois não, Sr. Dr. Pacheco de Amorim?
Todavia, em fins do ano transacto -1940 - as Presses Universitaires de France editaram a Physiologie de la Monnaire, da autoria do Prof. Henri Mathieu, prefaciada pelo conhecido professor Gaël Fain, da École National d'Organisation Économique et Soeiale, alguém no mundo dos sábios desta especialidade científica; e no capítulo V, a pp. 99 e sgs., sustenta-se e demonstra-se que, afinal:
A moeda não é uma mercadoria;
A moeda não é um instrumento de trocas;
A moeda não é uma medida do valor;
A moeda não é um instrumento de capitalização, nem, sequer, um capital.
A moeda não é mercadoria, porque perde a qualidade de moeda desde que se transforme em mercadoria: uma libra que se manda derreter para se fazer um anel deixa de ser moeda o passa então a ser mercadoria.
A moeda não é meio de trocas, porque o direito positivo distingue entro troca e venda. E a troca de um objecto contra determinada moeda não é troca, mas sim venda.
A moeda não é medida de valor, porque o seu valor é variável. Servo, portanto, tão-pouco para medir o valor como um metro fabricado de elástico serviria para medir o comprimento fosse do que fosse.
E por ai adiante...
Como se vê: jogos malabares de inteligência, especulações metafísicas, brincos de palavras, artifícios, incertezas, diversões, em que o brilho da hermenêutica e o capricho da novidade imperam...
Foi aos teóricos desta «ciência» que me referi. Tomaram-me noites sucessivas do concentração e de estudo; obrigaram-me a acumular notas sobre notas; levaram-me ao convencimento inabalável de que...

O Sr. Mário de Figueiredo:- ... não era mercadoria.

O Orador: - Exactamente... levaram-me ao convencimento de que os seus cultores vivem ainda suficientemente afastados dos tais mil e um imponderáveis da evolução do Mundo para me nào merecerem confianças incondicionais.
A eles, e não ao ilustre Prof. Dr. Pacheco de Amorim, pretendi aludir.
Ainda bem, todavia, que S. Ex.ª tomou para si o cortês gracejo, pois, se assim não fora, teríamos sido privados das interessantes considerações do início do seu discurso.
E podemos continuar sossegados!
Se a situação do País ameaçasse o menor risco, S. Ex.ª, patriota ardente, não reputaria propício o momento para discutir, com o seu habitual brilho, as vantagens da ciência sobre a técnica e não faria reserva das fórmulas salvadoras, que à curiosidade do Sr. Dr. Ulisses Cortês apeteceu saber quais fossem...
Vejo das notas que consegui tirar que o Prof. Pacheco de Amorim sustenta haver grande semelhança entre as autuações monetárias de 1918 e 1940 e até entre o espírito dominante em ambas as épocas.
Peço vénia ,para continuar a divergir.
Materialmente, em 1918-1919 as nossas reservas de ouro ou prata eram, em saldo, de zero.
Em 1946 atingem as 300 toneladas de ouro, no valor de mais de 8 milhões de contos, a que não me canso de aludir, umas e outras fortalecidas por um crédito, não reduzido nem redutível, de 80 milhões de libras, ou 8 milhões de contos, com garantia-ouro.
Social ou politicamente, em 1918-1919 vivíamos em plena barafunda parlamentar e política.
Concentrem V. Ex.ªs a sua atenção, procurem fazer reviver os ecos desta sala, atentem: é o Dr. Álvaro de Castro, acerca de cujas honradas intenções não é justo opor dúvidas, a protestar, como há dias referi, que «não se associará a uma política de esbanjamentos como a que se tem feito e continuará a fazer-se» (Diário, p. 23).

O Sr. Botelho Moniz:- Ao dizer que essa politica de esbanjamentos continuaria a fazer-se, demonstrou que conhecia bem os seus correligionários.

O Orador:- O Sr. Prof. Pacheco de Amorim vai contrapor-me que não se referiu aos homens ou ao ambiente politico, mas sim racionou sobre números-índices.
E eu contexto: o que valem eles numa paisagem como a descrita pelos próprios que dela faziam parte integrante?
Comparar 1918-1919 com 1945-1946 só é possivel se se quiser que numa e noutra fase da nossa história os dias tinham... vinte e quatro horas cada um.
Em tudo o mais o confronto é impossível.
É impossível interna e até internacionalmente.
Quanto ao que se passava adentro das nossas fronteiras, o que resumidamente recordei, é decisivo.
Internacionalmente, a previsão da marcha para a normalidade era bem mais fácil em 1918, porque se acabara uma guerra efectiva, indiscutivelmente; reinava a paz por toda a parte e economistas, diplomatas e homens de Governo discreteavam e talhavam os seus