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15 DE MARÇO DE 1947 874-(5)

«de carácter documental, artístico e cultural», como se um filme «documental» não fosse tantas vezes «artístico» (veja-se Paul Rotha, Documentary Film, Faber and Faber, Londres), e como se a «arte», em todas as suas expressões, não devesse considerar-se «cultura». Já na tabela do artigo 2.º se distingue entre «filme cultural» e «filme educativo», como se «educação» não fosse «cultura» também. No 11.° 7.º deste mesmo artigo preceitua-se que as disponibilidades do Fundo se aplicarão ainda «ao pagamento dos encargos relativos às licenças de exibição». Esta redacção presta-se a dúvidas. Encargos de pessoal? Parece não haver necessidade de mais funcionários para a passagem das licenças de exibição e para a contabilização da respectiva receita, porque o serviço corre pelo Secretariado da Informação, que tem a sua contabilidade, e pela Inspecção dos Espectáculos, que funciona, ou vai funcionar em breve, no mesmo Secretariado, onde existe já, como ficou dito, uma secção de cinema. Talvez o disposto no artigo 1.°, in fine, nos esclareça quanto à natureza dos encargos a que faz referência o n.º 7.º do artigo 5.° Com efeito, a taxa de licença inclui o «visto» da Comissão de Censura; desde que a importância integral da referida taxa reverta para o Fundo, deixa de existir a verba pela força da qual os censores são pagos; e daí, porventura, a necessidade de autorizar a Administração a prover a esse encargo. Como, porém, do mesmo Fundo terá de sair também a importância das senhas de presença aos vogais do Conselho do Cinema (àqueles, apenas, que representam a Junta Nacional da Educação e os organismos corporativos interessados; não aos funcionários do Secretariado ou da Inspecção dos Espectáculos), convirá dar ao n.° 7.° do artigo 5.° outra redacção. Os restantes artigos deste capítulo contêm matéria em grande parte adjectiva. Não há, porém, inconveniente em mante-los com as alterações resultantes da criação do Conselho. O disposto no § 2.° do artigo 5.° deve constituir matéria de um artigo novo, que será o último. Com efeito, não é preciso regulamentar apenas a administração e contabilidade do Fundo, mas toda a lei. Há referências ao regulamento em outros pontos do texto (§ 3.° do artigo 17.º, artigo 22.°)

3.ª - DEFINIÇÃO DE FILME PORTUGUÊS E DEVESA DA SUA GENUINIDADE (capítulos III e IV).

Os capítulos III e IV (definição do filme português; dobragem e legendas de filmes estrangeiros) podem reunir-se, para efeito de estudo, num único capítulo: defesa da genuinidade do espectáculo cinematográfico nacional.
Desde que se trata do filme português, convém, naturalmente, definir a natureza e limites daquilo que só protege. A definição terá de ser, com pequenas alterações, aquela que se contém no artigo 10.° e suas alíneas O legislador considerou portugueses: a) os filmes «falados em língua portuguesa»; a) os filmes «produzidos em «estúdios» e laboratórios pertencentes a sociedades portuguesas instaladas em território português»; c) os filmes «representativos do espírito português, pelo seu tema, ambiento, linguagem e encenação, sem prejuízo dos grandes temas da cultura universal». Quanto à alínea a), nenhuma dúvida se oferece. Oxalá a língua portuguesa seja de futuro prezada, quer nos filmes nacionais, quer nas legendas dos filmes estrangeiros, mais do que, com honrosas excepções, tem sido até aqui. No que respeita à alínea a), convirá, como foi observado na douta Assembleia Nacional, substituir «sociedades» por «empresas». Com efeito, a entidade produtora pode não ser uma sociedade. Quanto à alínea c), permite-se esta Câmara algumas observações. Sem dúvida, o «tema» e o «ambiente» constituem características da produção nacional; mas o cinema estrangeiro pode utilizar (já o tem feito) temas e ambientes portugueses sem deixar de ser estrangeiro; e o cinema nacional, como o teatro nacional, pode lançar mão de temas estrangeiros sem por isso deixar de ser português. A «linguagem», já na alínea a) foi dito que deve ser a portuguesa: inútil repeti-lo. Quanto à «encenação», importa considerar que se trata de uma técnica, susceptível de enriquecer-se peio contributo universal, e não de uma característica nacional propriamente dita. O facto de ter havido mestres encenadores ingleses, franceses, russos, alemães, italianos (Max Reiuhard, Bragaglia, Lugné-Poë, Piteeff, Alexandre Tairoff, Gordon-Craig), não quer dizer que haja uma encenação francesa, inglesa, italiana, alemã, russa ou, ainda menos, portuguesa. Se isto é verdade no teatro, muito mais ainda o é no cinema. Judiciosamente, o legislador ressalvou, na alínea em exame, que de nenhum modo o produtor nacional se encontra inibido de escolher «temas da cultura universal». Evidentemente, Ésquilo não deixou de produzir teatro grego quando escreveu os Persas; nem Shakespeare teatro inglês quando extraiu da novela de Luigi da Porto o Romeu e Julieta; nem Corneille, Racine, Beaumarchais, Hugo, Giraudoux, Valéry ou Anouille fizeram teatro menos animado do clarão do génio francês quando escreveram o Cid, Berenice, Casamento de Fígaro, Ruy Blas, Judite, o Fausto ou a Antígona. A expressão, porém, «temas da cultura universal» induz em erro. Com efeito, não se trata apenas de «temas da cultura», mas de «temas da vida». Um assunto (conflito moral resultante da oposição de caracteres e da interferência, de séries de acontecimentos humanos) não constitui «tema de cultura» senão depois de convertido em obra-prima da literatura, do teatro ou do cinema. Não é decerto fácil precisar estes conceitos, mormente num texto jurídico; mas, desde que o artigo 5.° pretende ser uma definição, devemos torná-lo quanto - possível nítido e preciso. A Câmara propõe para o n.° 7.° deste artigo nova redacção, nestes termos: «ser representativo do espírito português, quer traduza a psicologia, os costumes, as tradições, a história, a alma colectiva do nosso povo, quer se inspire nos grandes temas da vida e da cultura universais».
Passemos a outro problema, não menos delicado: a dobragem de filmes estrangeiros. O artigo 12.° proíbe a exibição em todo o território nacional de filmes estrangeiros dobrados em língua portuguesa. Na legislação espanhola adoptou-se por muito tempo e na italiana adopta-se ainda o critério oposto: impôs-se como obrigação aos distribuidores e exibidores precisamente aquilo mesmo que, pelo decreto-lei n.° 36:062, praticamente se proíbe no nosso País, ou seja a dobragem da língua nacional. Não foi sem justificadas hesitações que esta Câmara procurou marcar a sua posição perante o problema. Como se compreende -pergunta-se - que se haja manifestado por formas tão contraditórias o mesmo espírito de protecção nacionalista? É fácil a explicação. O legislador procurou atingir objectivos diferentes no nosso País e nos dois outros países novi-latinos. Em Espanha e na Itália protegeu-se a língua, proibindo que se ouvissem no cinema idiomas estrangeiros. Em Portugal procura-se proteger a produção cinematográfica nacional. Assim, 03 filmes portugueses distinguir-se-ão dos estrangeiros em ser fadados em português; e o público, quando não haja sensível diferença de qualidade, preferirá os filmes portugueses, porque os entende melhor. É uma forma indirecta de protecção, que consiste em não permitir que se torne extensivo ao cinema estrangeiro um elemento de compreensão, e portanto de atracção, cujo privilégio o cinema nacional reserva para si: a língua pátria. Ao mesmo propósito obedece o disposto no artigo 13.°, que proíbe