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878 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

devassa de quem quiser, para ver se o meu standard é inferior ao do quem quer -perdoem-me V. Ex.ªs que, quebrando os meus princípios, e somente para sublinhar com ênfase a minha afirmação, me seja forçado a aduzir uma nota de carácter pessoal.
Mas quer isto dizer que não é justo que indivíduos que se deslocam das suas terras natais devam ter um suplemento para compensar esse deslocamento? Livre-me Deus de cometer a feia injustiça de o negar! Mas nego a quem quer que seja o direito de julgar do standard de vida dos lares dos funcionários por essa forma como se fez em um documento oficial, agrupando-os em duas classes, de 50 e 150 por conto de suplemento, a título do carestia de vida, segundo tivessem de permanência na metrópole dez anos ou menos! O pão o a carne para estes não são mais baratos, nem ninguém tem o direito de pensar que, dispensando carne e pão, vivem estes últimos avaramente de caldo verde e legumes!
Façam os Srs. Deputados um inquérito na índia e vejam se nos lares indo-europeus ou nos lares puramente indianos dos funcionários que não ficaram mais de dez anos na metrópole o Standard de vida, a hospitalidade, as despesas de representação social, são porventura inferiores às dos lares europeus ou dos que adquiriram o soi-disant grau de europeização de que a lei os investiu através dessa concepção peregrina de mais de dez ou menos de dez anos!
Essa lei, sobre a qual se organizam os orçamentos na Índia, tem de ser revogada por absurda nos seus fundamentos c vexatória nas suas concepções. E mais justo e mais sensato o regresso ao «tatu quo ante: somente a chamada subvenção colonial tem de ser um «subsídio de deslocamento» que vencerão, sem distinções de qualquer outra natureza, os funcionários quo estejam servindo fora da sua terra natal, e não a título de carestia de vida, que afecta a todos igualmente!
Com uma lealdade, com uma franqueza que lhe fax honra, S. Ex.ª o Ministro limitou-se a constatar que há nas leis metropolitanas sobro o recrutamento militar e preparação dos quadros algumas disposições que têm sido alvo de críticas, mas que, não sendo essas disposições da alçada do Ministério das Colónias, se limitará a chamar para o assunto a esclarecida atenção dos Ministérios competentes.
Perdoe-me S. Exa.! Pelo n.° 1.° do artigo 28.° do Acto Colonial a organização militar das colónias é da competência do Ministro das Colónias. Não seria, pois, tempo de ousadamente retomarmos a orientação tradicional da Nação, organizando o exército colonial, como dantes, com quadros privativos adaptados às exigências da ciência e da técnica modernas? Porque ao exército colonial deveu a Nação serviços valiosos que seria feia ingratidão lançar no limbo do esquecimento!
Mas não deixei de folgar que no despacho ministerial se fizesse, pelo menos, a constatação dessas dissonâncias, porque ela representa veladamente o repúdio das opiniões, que no Ministério foram expressas, de que o temperamento dos filhos da índia se não coadunava com as exigências da vida militar. Que dirão os manes de Manuel António de Sousa e de tantos outros soldados e oficiais indianos que lutaram e morreram para assegurar no ultramar, e muito particularmente nas Africas insubmissas, a soberania de Portugal?!
E a propósito, e como simples nota preliminar, que a seu tempo e com elementos concretos conto provar à digna Assembleia Nacional, que dolorosa injustiça se não tem cometido extinguindo os quadros privativos e restringindo algumas das regalias militares dos poucos oficiais que ainda restam nesse quadro em que Paiva Couceiro e João do Almeida recrutaram com orgulho os seus melhores colaboradores - portugueses de Portugal, portugueses do ultramar - na sua grande obra de pacificação africana e do integração das Africas na majestosa Pátria lusitana! Como me dói ter de me referir a essas dissonâncias, que a minha posição nesta Casa me obriga a encarar de fronte erguida e não com a táctica da avestruz, escondendo a cabeça na areia!
Não quero duvidar que questões militares são questões técnicas, dependentes em grande parte de outros Ministérios. Mas todos os Ministérios têm de trabalhar em conjunto harmónico por forma a fomentar a concórdia entre os diversos elementos que constituem a Nação.
Que o presente estado de coisas conduz a injustiças e desarmonias é meu dever revelá-lo à Câmara, para que os dirigentes da Nação lhe dêem o remédio que for preciso. Dessa desarmonia o das injustiças e desigualdades que dela resultam dar-vos-á conta o seguinte telegrama que a Associação Indo-Portuguesa da província de Moçambique dirigiu a S. Ex.ª o Ministro das Colónias. Ei-lo, que me foi transmitido por cópia:

Associação Indo-Portuguesa cumprimenta V. Ex.ª pedindo vénia expor seguinte: Boletim Oficial 46 do 16 corrente publicou anúncio concurso aspirantes quadro administrativo exigindo candidatos termos artigo 128.° Reforma Administrativa Ultramarina terem cumprido serviço militar ou terem sido declarados aptos para ele por junta militar inspecção fins recrutamento. Termos esta disposição foram excluídos anteriores concursos naturais colónias não europeus não indígenas sujeitos pagamento taxa militar abrangidos artigos 20.° e 21.° e seu § único decreto 19:220 de 1931 recrutamento militar colónias. Resultando aplicação disposição citada artigo 128.° R. A. U. injusta discriminação portugueses coloniais esta Associação roga V. Ex.ª ordenar substituição mesma pela condição exigida demais concursos quadros funcionalismo colonial ou seja por comprovação de terem satisfeito lei recrutamento militar na parte aplicável e determinando modificação anúncio concurso. Associação aproveita oportunidade rogar V. Ex.ª revisão leis regulamentos expurgando disposições prejudiciais naturais colónias que explicita ou implicitamente contenham distinções bases étnicas contrárias espírito igualitário tradição portuguesa causadoras divisão filhos mesma pátria que querem através tudo ser portugueses. Presidente, Salvador Noronha. Lourenço Marques, 26 Novembro 1946.
Conheço a odisseia de um caso individual, ocorrido aqui em Lisboa, em que um filho de indo-portugueses, residente em Portugal, não podendo apresentar o documento do pagamento da taxa militar, porque era criança quando saiu da Índia, nem obter a guia de apresentação à junta militar de inspecção para os fins de recrutamento, foi despedido dos correios e telégrafos do continente, após ano e meio de serviço, por não poder produzir o documento de serviço militar que lhe exigiam, e foi reduzido à fome asem ter trabalho, nem onde comer, nem onde dormir» (frases de um memorando particular do interessado).
É justo não respeitar o § único do artigo 21.° do decreto n.° 19:220, de 1931, que organizou o recrutamento militar nas colónias, ou não se procurar uma solução condigna que se não preste a esses sofismas pêlos quais aos filhos da minha terra não só é vedada a carreira militar, mas praticamente se tenta agora vedar em Moçambique o próprio quadro administrativo?
Perante V. Ex.ª, Sr. Presidente, e perante os meus dignos colegas na Câmara, à consciência da Nação peço resposta à pergunta que deixo formulada.
Deveria terminar aqui as minhas considerações. Mas permita-me V. Ex.ª, Sr. Presidente, que aproveite de