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18 DE MARÇO DE 1947 881

cional, secular, dispersa pela nossa costa, especialmente desde Aveiro até ao Algarve, e onde estão investidos elevados capitais. E, em muitos casos, as marinhas constituem um pequeno património de pessoas pouco mais do que remediadas.
Pelo exposto, chamo também a atenção do Governo para o assunto, certo de que saberá impedir a ruína desta indústria e, portanto, a miséria de milhares, muitos milhares de trabalhadores.
Tenho dito.

O Sr. Duarte Silva: - Sr. Presidente: noticiaram os jornais que, sob a presidência de S. Ex.ª o Ministro das Colónias, se reuniu uma comissão de altos funcionários coloniais para tratar das providências a adoptar no sentido de minorar a crise de Cabo Verde.
Era já minha intenção pedir a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que, antes do encerramento da sessão legislativa, me concedesse a palavra, por alguns minutos, a fim de solicitar a atenção do Governo para a angustiosa situação em que se encontra a colónia de Cabo Verde.
A notícia publicada não me levou a desistir do propósito em que estava, antes fortaleceu a minha convicção de que é dever do representante da colónia dizer o que pensa das medidas a adoptar.
Por menos valiosa que seja a minha opinião, não poderá deixar de ser tomada como a opinião de uma pessoa que nasceu em Cabo Verde, ali tem vivido, ali tem os seus interesses, de uma pessoa que à sua terra tem dedicado tanto amor que só a isso deve, certamente, ter sido escolhido para a representar nesta Assembleia.
Sr. Presidente: por um desses caprichos inexplicáveis da natureza, as ilhas de Cabo Verde têm naquilo que, bem aproveitado, poderá ser a sua maior riqueza - a situação geográfica - a fonte da sua constante amargura e preocupações.
É ela, ao que parece, a causa principal da falta e irregularidade das chuvas.
Favorecida, talvez, por circunstâncias provenientes da acção daninha dos homens, a Natureza tem-se mostrado para Cabo Verde cada vez mais avara em chuvas e periodicamente as crises vitimam a sua população, espalhando pelas ilhas a fome e a morte.
Nos momentos agudos, todos se apavoram, improvizam-se medidas que nunca chegam a tempo de evitar alguns milhares de mortes, mas, mal deixam de se ouvir os clamores das vítimas, cessa imediatamente a acção dos dirigentes, para só acordar quando, de novo, o espectro da fome se avizinha.
Esse tem sido o problema cruciante de Cabo Verde.
Mal que se não cura e apenas se ilude, porque se tem adoptado uma terapêutica errada, combatendo somente os sintomas ou efeitos, quando se impunha uma medicação etiológica, indo às causas do mal, procurando eliminar as condições que o favorecem e atenuar, previdentemente, as suas funestas consequências.
O mal tem sido basear a economia da colónia na agricultura, sem dar a esta condições de vida estável.
Impõem-se, portanto, duas ordens distintas de medidas: umas, para ocorrer aos efeitos imediatos da crise; outras, para prevenir as crises futuras.
Quanto àquelas, importa:
1.° Assegurar o abastecimento dos géneros de 1.ª necessidade, nomeadamente o milho, o açúcar, o feijão, a banha e o arroz;
2.° Abrir trabalhos públicos que empreguem o maior número de braços, que não exijam especialização e que se estendam pelas regiões de maior população, estando particularmente indicados; os trabalhos de abertura de estradas, aliás tão necessárias ao desenvolvimento económico do arquipélago;
3.° Alargar a assistência prestada aos que não podem trabalhar, já que o seu número deve ter aumentado por virtude da crise.
Abastecidas as ilhas, garantido o trabalho e assistidos os necessitados, estão tomadas as medidas de ocasião.
Mais complexas são, todavia, as providências do segundo grupo, pois dizem respeito à estrutura económica do arquipélago, exigem o dispêndio de quantias que excedem os recursos próprios da colónia e demandam a elaboração de um plano de fomento que, uma vez adoptado, não fique à mercê dos caprichos ou da fantasia de quem tenha de presidir à sua execução.
Têm-se apontado como principais medidas desse género a arborização do arquipélago e a realização de certas obras de hidráulica agrícola, conducentes a um melhor aproveitamento das águas.
São, efectivamente, dois pontos fundamentais a considerar, cumprindo, porém, desde logo ter em couta que não constituem uma finalidade, mas simples meios de conseguirmos o nosso objectivo, que é dar à colónia uma economia estável, que só poderemos realizar estabelecendo o indispensável equilíbrio entre as duas riquezas que a Natureza lhe proporciona: a cultura da terra e o aproveitamento do porto Grande de S. Vicente.
É incontestável que importa promover a arborização das ilhas, procurando assim melhorar o regime das chuvas e, ao mesmo tempo, criar uma riqueza para a colónia.
Seria injustiça não mencionar que muito se tem trabalhado em tal sentido nos últimos anos, ainda que nos falte a competência necessária para avaliar da orientação e da eficiência do trabalho realizado.
É também evidente que se deve procurar um melhor aproveitamento das águas existentes, pesquisando-as e utilizando-as, de forma a aumentar a área do regadio.
Alguma coisa se tem feito também nesse sentido.
Ocorre, porém, perguntar: ficará desse modo resolvido o problema de Cabo Verde ou mesmo o problema de algumas das suas ilhas?
Não nos parece.
A arborização, sendo, sem dúvida, necessária e urgente, não constitui por si a solução. Deve antes ser olhada como um meio de correcção do regime das chuvas e de defesa do solo, que a erosão reduziu a um lamentável estado de desgaste e empobrecimento. Como riqueza propriamente dita, para constituir a base da economia das ilhas, a sua acção não poderá deixar de ser considerada longínqua e, portanto, muito duvidosa.
O alargamento da área irrigada, inquestionavelmente benéfico, também não resolve por si o problema, sobretudo porque há-de ser forçosamente limitado.
Depois, ainda que os terrenos conquistados para o regadio fossem distribuídos pelas famílias necessitadas, não se encontrariam estas em condições de promover o seu aproveitamento, pois lhes faltam os recursos financeiros para preparar o terreno, fazer as sementeiras e manter-se enquanto esperam pela colheita. E, feita esta, teriam de procurar a colocação dos produtos que excedessem o seu próprio consumo.
Para isso tornam-se necessárias, indispensáveis, as estradas, como necessário é o arranjo dos pequenos portos de cabotagem, pois sucede que nessas ilhas, flageladas pela fome, os agricultores se têm visto muita vez embaraçados com os produtos, que não podem colocar pela dificuldade e carestia dos transportes provenientes da deficiência das comunicações.
Também será conveniente que se não desanimem os produtores com tabelamentos injustificados, como sucedeu em relação a alguns produtos hortícolas cuja plantação, intensificada durante a permanência das forças