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884 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 104

relatório é, ainda hoje, fonte de luminosos ensinamentos.
Recordo-me que, nessa altura, num quarto do velho Hotel Aliança, ao Chiado, alguns elementos dessa comissão discutiam a isenção do imposto sucessório em favor dos descendentes, isenção que, apesar de ser considerada lógica e justa, no entanto foi considerada intempestiva pela voz esclarecida e autorizada de alguém que nesse momento decidia sobre os destinos dessa comissão.
Mais tarde, na sessão de 6 de Fevereiro de 1935, foi apresentado a esta Assembleia um projecto de lei no qual se preconizava também a isenção, em favor dos descendentes legítimos, de todo o imposto sucessório. Mas ainda nessa altura não foi julgada oportuna a declaração de tal isenção de imposto.
Depois os serviços, do Instituto Nacional de Estatística publicaram trabalhos de tal maneira completos que já davam lugar à efectivação de cálculos tendentes à perfeição dos estudos relativos a tal assunto, e foi depois de tais trabalhos que surgiu, por parte do Governo, a proposta da lei de meios para 1946, na qual o Governo se propôs estudar uma reforma do imposto sobre sucessões e doações, isentando daquele imposto as transmissões por título gratuito, incluindo as quotas legitimarias, a favor dos descendentes, até ao limite de 150 contos por cada descendente.
A par destes trabalhos, realizados pelo Ministério das Finanças, a outros trabalhos se procedia, por parte do Ministério da Justiça, tendentes à alteração da forma de remuneração do pessoal judicial.
Não passaram despercebidos aos estudiosos destas matérias tais trabalhos do Ministério da Justiça e, analisada a proposta de lei em discussão e comparada com o que dispôs o § 2.° do artigo 4.° da lei n.° 2:010, de 22 de Dezembro de 1945, alguém poderá querer ver que o Governo ficou aquém das balizas que haviam sido marcadas ou estabelecidas por este referido § 2.°
Será realmente assim, isto é, o Governo com a proposta de lei em discussão haveria ficado aquém das balizas estabelecidas ou, pelo contrário, teria ido para além dessas balizas?
Não tenho a menor dúvida em afirmar que o Governo, estabelecendo isenções totais apenas até 100 contos, e não 150 contos, foi, no entanto, bastante mais além do que aquele § 2." estabelecia, visto que, tendo em consideração os pequenos patrimónios, tratou nesta proposta de lei, e muito bem, não só do imposto sobre sucessões e doações, mas também das custas dos inventários orfanológicos, isentando-os na sua grande parte. E peço licença a V. Ex.ª, Sr. Presidente, e à Câmara para repetir o «Aqui d-el-rei!» que aqui proferi em sessão de 12 de Dezembro de 1945, mostrando que ainda havia casos de inventários orfanológicos em que a acção tutelar do Estado custava a uma viúva mais de 70 por cento e a cada filho mais de 8T por cento daquilo que recebiam, e a este meu brado de t Aqui del-rei!» respondeu a audaciosa e justa atitude do Sr. Ministro da Justiça, ao qual não posso deixar de dirigir o mais caloroso aplauso.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - É que desde há muito tempo, desde os bancos da escola, me tinha acostumado a ouvir, quer ao povo em geral, quer até a um sábio professor que já ocupou, e brilhantemente, a Presidência desta Assembleia, que um inventário orfanológico era um desastre.
E assim é, de facto, um desastre em seguida a outro desastre; depois da morte do pai ou da mãe a espoliação pela justiça dos filhos e do cônjuge sobrevivo.
Perante as disposições desta proposta de lei quase se chega a pôr a dúvida se é um sonho ou uma realidade aquilo que ela consente.
Ela vem realmente atender a um grande número de casos que até só pela sua generalidade já mereceria voto de louvor.
Bastaria ver o número de descendentes que recebem valores até 100 contos, que são 109:389; os que recebem valores entre 100 e 150 contos, que são 377, e os que recebem valores de mais de 150 contos, que são 715.
Quer dizer: a proposta de lei que se discute vai abranger não só um número muito elevado de contribuintes, mas justamente atender aqueles que mais merecem protecção e amparo.
Mas será, com efeito, absolutamente perfeita esta proposta de lei em discussão?
Tanto não me atrevo a afirmar e creio que algumas observações ela merece.
Em primeiro lugar, esta proposta de lei não trata da revisão do regime do adicionamento a que se refere o § único do artigo 4.° da lei n.° 2:019, a qual estabelece que tal regime do adicionamento será revisto quando entre em vigor a reforma prevista pelo § único do artigo 4.° da lei n.° 2:010, de 22 de Dezembro de 1945, acerca da incidência e prazos de pagamento do imposto sobre doações e sucessões.
Esta proposta de lei não toca na revisão deste malfadado adicionamento.
Já tive ocasião de me referir aqui à incongruência que vejo em tal regime de taxa uniforme, que igualmente é condenado no parecer da douta Câmara Corporativa.
E na realidade é grave a existência desta taxa uniforme, como novamente à face dos números vou demonstrar.
Do Anuário Estatístico das Contribuições e Impostos de 1945 constam os seguintes dados:
Imposto sobre sucessões e doações liquidado em favor dos descendentes: 41:143 contos de imposto e 31:102 contos de taxa uniforme; em favor de ascendentes: 2:844 contos de imposto e 1:021 contos de taxa uniforme; em favor de cônjuges: 12:918 contos de imposto e 4:450 contos de taxa uniforme; em favor de irmãos: 12:021 contos de imposto e 3:119 contos de taxa uniforme; em favor de colaterais até ao 3.° grau: 17:307 contos de imposto e 3:068 de taxa uniforme; finalmente, em favor de estranhos: 29:583 contos de imposto e 3:284 contos de taxa uniforme.
Quer dizer: a sobrecarga com que aguentam os descendentes é de mais de 75 por cento e aquela com que aguentam os estranhos não chega sequer a 12 por cento!
Creio que, em face destes números, se acha demonstrado, de uma maneira evidente, que o regime de taxa uniforme, além de contrário ao regime do nosso direito tributário quanto a imposto sobre sucessões e doações, está muito longe também de estar de acordo com a doutrina que nós defendemos e que está na base de todo o nosso sistema político - a defesa da família.
Há, Sr. Presidente, ainda uma segunda observação que entendo dever fazer à proposta de lei em discussão.
Refiro-me ao pagamento de sisa por tornas.
De todos os factores determinantes da desagregação dos patrimónios familiares eu considero o pagamento da sisa por tornas aquele que mais actua e, sobretudo, que é mais antipático ao povo português.
O contribuinte, embora com sacrifício, reconhece que deve pagar as custas porque vê os respectivos serviços judiciais; reconhece que deve pagar o imposto sucessório, mas na altura em que o Estado, além de lhe exigir esses dois pagamentos, lhe vai exigir ainda a sisa por aqueles prédios com que, para poder realizar unia