20 DE MARÇO DE 1947 929
pela papelada, contra a qual tantas vezes nos temos aqui revoltado.
O Sr. Botelho Moniz: - V. Ex.ª dá-me licença?
Apenas para dizer que a Junta Nacional dos Produtos Pecuários, a Intendência Geral dos Abastecimentos e outros organismos, uns de coordenação económica e outros que se chamam não sei como, são como v. Exa. muito bem disse, organismos completamente estranhos à doutrina e à organização corporativa e, como também já se disse nesta tribuna, na maior parte dos casos completamente auticorporativos.
O Orador: - Exactamente. Mas os factos que a ponto pertencem ao número dos que criam um estado de espírito adverso à organização corporativa, embora não se referiram a esta organização. Alguns deles, se não fossem as suas desastrosas e lamentáveis consequências, poderiam até figurar numa nova «Campanha Alegre», nas Farpas, como aquele caso bem conhecido de, para se exportar uma pequena quantidade de palitos, ter sido necessária uma licença Junta de Exportação de Madeiras ou Concelho Técnico Corporativo.
Já nesta Assembleia se aludiu também ao facto de a lenha ser paga ao pobre proprietário na origem a 30$ por tonelada, acontecendo que, se esse proprietário viver na capital, terá de pagar depois aqui essa mesma lenha a 320$ por tonelada.
Estas anomalias são chocantes e escandalosas. Embora deseje não me alongar em casos de pormenor, citarei ainda a anomalia estranha de um produto de azeite haver recebido a indicação, por carta, de um distribuidor para fazer entrega de determinado comprador, recebendo logo esse distribuidor por aquela simples carta a importância de 1$20 por cada litro de azeite.
Reconheço também que a todo o tempo se deve emendar um erro, mas é preciso ser mais prudente em certos casos de condicionamento industrial, dando valor aos dispêndios de capital e de trabalho com o desenvolvimento de certas indústrias. É o caso dos lacticínios de Aveiro, já aqui focado pelo Sr. Deputado Querubim Guimarães.
Haja mais prudência com exigências e autorizações, a que correspondem garantias que depois se eliminam bruscamente em reviravoltas de critério. Bem sei que o condicionamento industrial não depende directamente da organização corporativa. Mas todas asa faltas apontadas atingem fundamente esta na opinião pública.
Ainda um caso estranho de chamada coordenação económica:
Os números serão apenas aproximativos, mas a Junta paga por um couro de uma rês morta 300$ e vai, ela própria, vender o mesmo por 600$.
Isto excede todo a medida do sensato e do razoável.
Alguém disse, e foca-se isso no parecer da Câmara Corporativa, que a posse de um alvará, com meio de especulação comercial, constituía, em certos casos um verdadeiro tesouro, uma mina.
Mas todos os males descritos resultam, acima de tudo, e o parecer da comissão o mostra de uma maneira iniludível, como, de resto, é a minha impressão própria pelo contacto que tenho tido com alguns organismos dessa natureza, tudo isso resulta, acima de tudo, repito, da incompetência de uma grande parte do pessoal, sendo, pois, muito de aplaudir o que se consigna numa das conclusões do relatório da comissão de inquérito. É necessário pensar na preparação, formação e selecção do pessoal; utiliza-se o Gabinete de Estudos do Concelho Técnico Corporativo, como sendo um centro dessa formação pessoal.
Aquando dos centenários, que ontem foram aqui recordados, neste debate, pelo sr. deputado Teotónio Pereira, procurei, na organização de um congresso de ciências da população, para a sua secção económica, entre as pessoas mais competentes do País na matéria, alguém que escrevesse algum trabalho sobre economia corporativa. Apenas o Sr. Dr. António Cruz, director do Gabinete de História da cidade do Porto, fez uma síntese sobre a história dos misteres e das corporações nesta cidade, trabalho esse que, tendo grande mérito no ponto de vista da investigações histórica, não era o mais necessário em relação aos tempos de agora.
E porque é que eu não consegui encontrar mais ninguém?
É que o nosso escol nessa matéria é reduzidíssimo u estava todo ocupado com actividades anais imperativas. Dessa limitação vem o fracasso de um grande número das organizações em questão. Dela resulta muitas destas não corresponderem ao seu objectivo. Mas o mal é tão generalizado! E tão frequente esquecerem-se os fins de uma instituição ou cargo!
Quando exerci a presidência de uma autarquia local, encontrei-me, num serviço dessa autarquia, perante entidades que reclamavam contra certos aspectos do funcionamento do dito serviço. Ouvi uns e outros e, que final da discussão, o então director desse serviço - pessoa intelectualmente distinta e noutras actividades muito competente- fez uma proposta de solução em que dizia obtemperar a todas as reclamações e protestos. Essa proposta satisfaria os reclamantes. Perguntei-lhe se ela era, por sua vez, eficaz para a finalidade dos serviços. Ele respondeu: «Isso não, não se faz mais nada». Então perguntei-lhe como se chamavam os serviços de que ele era director. Caiu em si e procurou outra plataforma.
Na organização económica do País é afinal esse um dos grandes males: pessoas mesmo inteligentes, cultas e probas perdem facilmente o pé no que respeita à consecução dos objectivos superiores que lhes cumpre visar. E o mesmo em muitos domínios da vida nacional. Pelo que é pormenor, acidente, episódio, esquece-se consta sómente o fundamental, o que constitui o objectivo de um cargo, de uma função, de um organismo.
Associo-me, portanto, a todos os votos tendentes a uma boa formação de pessoal para a organização corporativa como para a direcção da nossa vida económica. Mas vou lembrar à comissão que, além do Gabinete de Estudos do Conselho Técnico Corporativo, colabore nessa formação o Centro de Estudos Económicos, criado em boa hora, pelo ilustre Ministro das Finanças, no Instituto Nacional de Estatística. Porque não há-de este Centro realizar estudos, investigações, que concorram naturalmente para a formação do pessoal, desse escol de que necessitamos?
Associo-me igualmente ao que disse o ilustre Deputado Sr. Dr. Bustorff da Silva relativamente ao que há de inadmissível nos lucros excessivos e incompreensíveis e no fausto das instalações de alguns dos organismos económicos. Basta percorrer 03 números que nos dá a comissão de inquérito para se verificar que existem por vezes desproporções enormes entre as receitas e as despesas. E, se é certo que muitos desses organismos necessitam para o seu funcionamento de fundos de maneio, de fundos de compensação ou de fundos especiais, certo é também que as receitas que afinal pesam sobro os membros desses mesmos organismos ou sobre o público não devem ir além do estritamente necessário para o desempenho do papel atribuído a essas entidades.
E evidente, pela leitura das estatísticas relativas á organização corporativa, pelos relatórios publicados sobre a mesma organização, como ainda também pelo presente relatório da comissão de inquérito, que o cor-