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20 DE MARÇO DE 1947 927

Portanto se são indispensáveis as lotas de extermínio, se o monopólio contradiz o bem comum, em proveito de alguns, um poder intromissor complexo, grandioso, omnímodo pode arruinar a empresa ou tornar-lhe a vida dificílima. E isso se tem visto.
Não imagine V. Ex.ª, Sr. Presidente, que este problema é teórico ou desprendido de projecção na vida prática.
Ele é de todos os instantes.
Quando se publica um estatuto; quando se organiza uma coordenação; quando um fiscal entra num armazém de vinho ou numa mercearia; quando se requere uma tarefa; quando se pede a remoção dum obstáculo, a empresa privada pode não saber onde começa e onde acaba o poder de intervenção económica.
Mas o agente público, o interventor corporativo, o fiscal podem não saber também de limites ou considerá-los difusos e então temos a série de atropelos, querelas, conflitos, intromissões que tornam a vida difícil.
A face do problema que eu quero apresentar ainda não é esta. É outra.
Diante dum poder forte a empresa privada não se pode valer duma tábua legal elástica ou imprecisa. Também não lhe serve socorrer-se da autonomia da vontade como princípio jurídico.
Talvez não baste a providência preconizada na conclusão IX.
Sr. Presidente: no meu entender há-de definir-se legalmente um estatuto de defesa da empresa privada, visto que esta é um pilar do regime corporativo; visto que o Estado, entrando a sua porta, há-de parar em certa altura; visto que o corporativismo foi ideado por ela e para ela e não contra ela!
Três, quatro artigos, três ou quatro garantias bastariam para acautelar e defender a iniciativa privada.
Dissemos: a empresa privada está desarmada perante o poder económico; terá a liberdade mas não tem um direito positivo.
A distribuição de encargos - os maiores - pelo contribuinte específico, a rápida e arbitrai decisão de operações, actos ou negócios de centenares de contos, a hipertrofia da coordenação, as intromissões incómodas ou inquisitoriais na vida privada, as faltas de atenção, e agora o temor dos fiscais, a perplexidade perante as ordens superiores, a intranquilidade nas terras, nos armazéns, nas fábricas, nos estabelecimentos, têm de ser acautelados e limitados por um estatuto.
Último ponto capital: a existência irredutível do consumidor.
Todo o produtor, transportador, distribuidor, segurador ou banqueiro figuram no circuito económico como consumidores, e, por isso, uma noção muito forte sobre organização levou à indiferença ou desatenção de uma posição que era fatal pertença de cada um, estivesse onde estivesse.
Muitos autores não escrevem sobre consumo, alguns sistemas o deixam na sombra, várias orientações se tomam com perfeita indiferença e o sistema corporativo pode-se ter desenvolvido, figurando-se alguns dirigentes que o consumo privado não mereceria preocupação maior.
A verdade é que o consumo interessa sobremaneira - fatalidade fisiológica, não se pode passar sem ele; categoria económica, dele depende a poupança e a formação do capital; coroamento do processo da riqueza, ele vem a germinar em emprego e nova circulação de bens.
A economia corporativa não pode ser indiferente ao consumo e há-de orientar-se num sentido de elevação do nível respectivo.
Maiores consumos, melhor qualidade, superior especialização. Tudo quanto não seja isto é retrogradar!
Ora o consumidor, por ser «todos», foi equiparado a nenhum.
Era o senhor «toda a gente» e era como se não fora ninguém.
Eliminou se do número dos que dão que falar. Certos escritores esqueceram-no.
Pareceu anacronismo lembrá-lo e houve mesmo quem se servisse dele como arma de ataque ao regime. Consumidores afinal éramos todos. E os interesses de todos estavam ao cuidado da Assembleia Nacional e do Governo. As autoridades representavam o consumidor e deviam estar da sua banda.
Mas o caso merece reflexão.
Quem manda na produção da riqueza nem é o empresário, nem é o Estado, nem é o dirigente corporativo; manda, em última instância, o consumidor.
Manda autenticamente.
E manda na qualidade, na quantidade e tia especialidade; bem sei que segundo a sua propensão, os seus réditos e escolhas, mas ... manda, e até quer mandar no preço, porque deseja adquirir por baixo, despendendo o menos possível.
Quando foi da grande querela das lãs falou-se aqui muito do consumidor, mas não se desceu aos retoques do quadro.
O estudo do consumidor mostra a imensidade do mundo agrário, a enormidade decrépita da classe média, o poder marginal dos sectores limitados do comércio e da indústria, as aflições dos que têm réditos sem elasticidade.
Vamos traduzir parte disto em números:
Em 1940, 1.811:645 chefes de família.
Por 453:791 agricultores correspondem, trabalhando nas indústrias alimentares, 63:348 pessoas; 08:889 trabalham na indústria das madeiras; 143:201 pessoas empregam-se na tecelagem e correspondem-lhe nada menos de 37:999 guardadores de gado; 181:152 pessoas empregadas no comércio e nos seguros, dos quais 64:389 são comerciantes; 83:864 vivem do transporte.
Na agricultura, pecuária e pesca labutam 1.439:000 pessoas; porem, se lhe juntarmos as mulheres trabalhadoras de campo, obtemos a cifra de 2.658:000, importante para o conjunto da população activa de mais de dez anos.
Em princípio as despesas com dirigentes, pessoal, constituição de fundos não pesariam demasiadamente sobre o consumo se tivessem uma aplicação ou destino reprodutivo.
Se porventura substituíssem pessoal privado por pessoal corporativo, também não carregarão ainda nos preços finais. Se, pela força da coordenação, houver racionalização, eficiência ou eliminação de desperdício também não deveremos preocupar-nos excessivamente com o seu peso.
Portanto, nalguns casos a despesa corporativa será utilidade, noutros será substitutivo de encargos privados, noutros ainda pesará autenticamente sobre o consumidor, que comprou mais caro ou só pôde comprar menos.
Discutem-se assim os 500:000 contos calculados pulo engenheiro Sr. Araújo Correia.
Se pesam como melhor organização ou distribuição, pouco pesarão; mas se pesam como burocracia económica, como retrocesso, como estagnação de negócios, o seu peso tornar-se-á insuportável.
O produtor responde à procura do consumidor. E o consumidor deve ser elemento activo e não um simples resignado.
Por isso questões de consumo representam interesses do maior número. E o maior número pretende que a sua capacidade de compra seja o mais alta possível. Para aproveitar os melhores resultados de uma concorrência regulamentada é preciso não perder de. vista o consumidor - ele não é ninguém mas é toda a gente!