24 DE MARÇO DE 1947 991
E essas virtudes estão bem definidas pela sua inteira abnegação, tendo sido seu mister manter íntegro aquele ideal de sempre, quo se traduz na tradição da honra, e no desinteresse, qualidades quo constituem a personalidade e a elevação de carácter dos seus oficiais, que na sua missão altamente moral, como outra não lia superior, de antemão sabem que hão-de morrer pobres, que têm de ser honestos e que devem estar sempre prontos a dar a vida em defesa da tranquilidade pública e dos lares e da soberania da Nação. É, de resto, a sua moral, a sua fé, a sua mística.
Por isso, a V. ,Exa., por não regatear à força pública a confiança e estima e a admiração que ela merece, endereço, como militar que sou, as minhas mais efusivas saudações.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: entra em discussão nesta Assembleia a proposta de lei de reorganização dos serviços de defesa nacional, enviada pela Presidência do Conselho e que mereceu já o respectivo parecer da Câmara Corporativa.
Foi ainda pedida urgência para a sua discussão, embora se anuncie o propósito de se apresentar na próxima sessão legislativa uma proposta de lei sobre a organização geral da Nação para o tempo de guerra, onde, naturalmente, se exporá o esquema geral de questão tão decisiva para a eficiência, nacional na emergência de uma beligerância, ou até simples neutralidade, um presença de grave e extenso conflito entre grupos de Estados.
Fugindo às considerações que a filosofia da história permitiria trazer para aqui na análise crítica da oportunidade, justeza, alcance e elaboração da proposta em causa, justificada doutamente pela Câmara Corporativa a razão da conveniência da transformação da lei n.° 1:905, explicando-se os motivos e a evolução por quo têm passado os organismos semelhantes na França e Inglaterra,, limitar-me-ei, a mero título elucidativo, a enunciar os princípios que informam a mobilização dos Estados, princípios que a Comissão de Defesa Nacional desta Assembleia entende que serão respeitados no presente projecto, depois de algumas alterações propostas pela Câmara Corporativa.
A organização militar (a que se chama também orgânica militar) fixa os princípios que devem presidir à criação e disposição das instituições militares e define as condições técnicas da sua conservação e aperfeiçoamento. No direito positivo de cada Estado adaptam-se às circunstâncias especiais que o informam os princípios da ciência da organização militar. As vitórias finais resultaram sempre de vantagens de organização, assim como os erros ou vícios desta constituem a causa profunda das derrotas.
As instituições militares devem adaptar-se às restantes instituições constitutivas do Estado. Mais do que razões técnicas, são as determinantes sociais que explicam a evolução orgânica, vindas dos exércitos mercenários aos exércitos permanentes e destes aos exércitos milicianos. Esta adaptação constitui objecto da política militar. Ainda mais: os mesmos factores sociais justificam a forma como os exércitos são recrutados e organizados; a evolução industrial influi nos meios de acção materiais; o conjunto forma a constituição dos exércitos.
A preparação militar dos Estados para a guerra constitui a chamada mobilização dos Estados.
Sendo a guerra sucessivamente mais complexa e justamente designada por guerra total, a sua preparação deve compreender todas as actividades nacionais.
A mobilização militar é apenas um capítulo da mobilização dos Estados, que compreende também a mobilização moral, ou seja a educação cívica da Nação, e
a mobilização civil nos seus vários aspectos, mas onde sobressai o económico.
O plano de mobilização geral dos Estados é, pois, um documento de grande significação na existência soberana da Nação o que deve ser organizado em harmonia, não só com as actividades nacionais, assegurando o seu regular funcionamento na emergência de uma interrupção de relações pacíficas e permitindo a passagem rápida da situação de paz para a de guerra, mas também deverá atender à intervenção oportuna e eficiente na parte que ao Estado competir na segurança colectiva, cujas bases não podem deixar de constantemente preocupar os dirigentes das diferentes potências mundiais.
A proposta de lei apresentada substituirá a lei n.° 1:905, de 22 de Maio de 1935, tratando dos organismos superiores da defesa nacional.
Ligada a esta lei veio, na mesma data, a lei n.° 1:906, criando o Conselho Superior do Exército. A seguir, regulamentando a lei n.° 1:905, o decreto n.° 25:857, de 19 de Setembro do mesmo ano.
Este decreto criou, com o fim de coordenar e impulsionar todas as actividades normais desde o tempo de paz, os seguintes altos organismos:
a) O Conselho Superior de Defesa Nacional;
b) O Conselho Superior da Direcção da Guerra;
c) O Conselho Superior Militar;
d) A Comissão de Estudos da Defesa Nacional;
e) A Secretaria Geral da Defesa Nacional;
e foram igualmente criados os seguintes órgãos de trabalho, consulta, e preparação do exército para a guerra:
f) O Conselho Superior do Exército;
g) O Estado Maior do Exército.
Duas razões podem apresentar-se a explicar o motivo por que a tentativa de 1935 - há doze anos - não teve resultados práticos:
Por defeito do esquema orgânico?
Por incompreensão da economia do sistema, não lho dando os principais responsáveis o necessário - o indispensável - impulso que poria à prova as suas deficiências ou defeitos, «não obstante a regulamentação» quase imediata (decreto n.° 25:857, de 19 de Setembro de 1935)?
A parte preambular da proposta do Governo nos diz da medíocre eficiência de tal conjunto de conselhos e comissões, esfriando o impulso objectivo do Conselho Superior de Defesa Nacional, isto é, «para paralisar a acção, arrefecer entusiasmos e possibilidades de determinação instituiu-se um conjunto de organismos vários, consultores e de estudo, mais intervindo em discutir do que em resolver, mais próprios à meditação prudente do que a acção eficaz. O sistema conduziu ao desastre na generalidade dos países que observaram os seus métodos ou seguiram a sua orientação».
É para obviar a esse moroso arrastar das soluções com que se procura resolver os problemas da defesa militar, e conforme a experiência colhida, na ultima guerra, que se apresentam à apreciação desta Assembleia umas novas bases para a organização e funcionamento dos organismos superiores da defesa nacional.
A lei n.° 1:905 trata, de uma maneira geral, da direcção da guerra, atribuição de carácter privativo do Governo, como prescreve, aliás, a base I.
O esquema geral dos seus organismos está, com efeito, mal definido.
Chama-se hoje à polícia militar «direcção da guerra» e à estratégia «conduta de operações». As suas relações são contínuas, mas com predomínio da direcção da guerra.
A actual concepção da guerra total ou outra integral veio dar actualidade ao assunto. Discutiu-se muito até que ponto a política podia intervir nas operações