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4 DE FEVEREIRO DE 1948 249

Aludi a que fora possível vender-se o milho, apesar dos pesados encargos que a sua lavoura acarreta, a preços inferiores aos do trigo.
As circunstâncias, porém, sofreram grande alteração e prejudicaram por tal forma o referido equilíbrio económico das famílias rurais que actualmente já não é aconselhável, nem seria possível, manter-se o antigo diferencial de preços entre cereais sensivelmente equivalentes no custo de produção e no respectivo poder alimentício.
Resumindo, para concluir:
Na minha opinião não pode conceber-se a cultura do trigo sem remuneração condigna dos que nela trabalham e dos capitais ali colocados.
Mas, simultâneamente com as grandes explorações, é aconselhável conseguir-se viabilidade para as pequenas lavouras.
Para defesa das nossas disponibilidades no estrangeiro e na previsão deplorável de se repetirem acontecimentos bélicos, é da maior conveniência que nos bastemos no que respeita ao pão nosso de cada dia.
Para tanto seria de aceitar o recurso a misturas que permitam o aproveitamento de todos os nossos recursos cerealíferos, sob condição, porém, de que os cereais utilizados sejam pagos na proporção das suas qualidades alimentícias e que desse pão de mistura não resultem perturbações no consumo dos tradicionais tipos de pão regional.
O alvitre da utilização da farinha de arroz para a confecção de pão de mistura, que envolveria o aumento da área destinada à respectiva cultura, deve ser considerado no duplo aspecto do encarecimento daí resultante para tão basilar alimento e das consequências daí resultantes para a saúde dos trabalhadores e das populações vizinhas.
A muitas outras conclusões se poderia chegar em face do que venho de expor, mas termino felicitando os autores de tão oportuno aviso prévio e faço votos para que do seu longo e inteligente estudo resultem benefícios para a lavoura nacional, que tão carecida deles está, e para a Nação.
Dou por concluídas as minhas considerações sobre tão obcecante problema.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa uma moção assinada pêlos Srs. Deputados Nunes Mexia e Cortês Lobão, que vai ser lida.

Foi lida. Ê a seguinte:

«A Assembleia Nacional, considerando a repercussão do problema do pão nas condições de vida da população portuguesa e na economia nacional, reconhece:
1.° Que o Governo se não tem poupado a esforços para abastecer de trigo o País;
2.° Que convém, por motivos económicos e de segurança nacional, restringir ao máximo as importações de trigo, e neste sentido parece impor-se a intensificação na metrópole e províncias ultramarinas da produção dos diversos cereais panificáveis;
3.° Que para a consecução dos objectivos acima mencionados se torna indispensável fazer a política dos tipos de pão regionais e completá-la com a total substituição na panificação de farinhas estremes de trigo por farinhas de mistura, se estudos técnicos acurados não vierem a desaconselhar tal solução, de modo a dotar a população portuguesa de um ou mais tipos de pão que atendam às condições de vida das diversas classes e possuam as características de qualidade indispensáveis.

Sala das Sessões, 3 de Fevereiro de 1948. - João Garcia Nunes Mexia - António Cortês Lobão».

O Sr. Presidente:- A moção fica em discussão juntamente com o aviso prévio.
Tem a palavra o Sr. Deputado Rui de Andrade.

O Sr. Rui de Andrade: - Sr. Presidente: não fazia tenção de falar. Desadornadas são as minhas palavras e o que pensava dizer poderia ser interpretado como crítica molesta e talvez injusta.
Depois de ter ouvido os meus colegas, reflecti longamente e resolvi tomar parte no debate.
Não importuno com extensas citações e números.
Destes só direi que a lavoura cerealífera devia em 1947 às caixas de crédito agrícola e de empréstimos sobre searas, segundo os algarismos citados pelo nosso colega tenente-coronel Cortês Lobão, 170:000 contos. Quanto deverá aos bancos particulares, aos bancos hipotecários, aos grémios, às companhias de adubos e a particulares por demora no pagamento de contas de rendas atrasadas e por contribuições em atraso?
A quanto montará a venda d« arvoredos, de gados e de propriedades para vencer posições aflitivas?
O dobro? O triplo?
Como compreendem, é difícil obter elementos certos. É, porém, seguro que esta situação existe.
Se for da ordem dos 300:000 a 500:000 contos (pomos por hipótese 400:000), ela representa, grosso modo, o encargo de 1$ por cada quilograma de trigo que venha a colher-se este ano, se a sementeira for de 500.000:000 de quilogramas em 500:000 hectares e der oito sementes ou 400:000 toneladas.
Se o custo da colheita deste ano for, como a prática me diz e as minhas contas confirmam, superior à tabela (isto depende da produção que tivermos, e eu parto para esta dedução de uma média de oito sementes), a lavoura ficará na situação presente, senão pior, devendo entrar em conta com os juros de 4 por cento, em anedia, a pagar sobre a quantia que deve e que representa cerca de duas dezenas de milhares de contos.
Quer dizer que a lavoura trigueira se afunda, mas convém fazer aqui notar que na região do trigo há grandes diferenças- de lavouras para lavouras:
Umas são feitas em bons terrenos para trigo, os quais sempre foram cultivados com este cereal e em que a rotação de trigo e fava é tradicional. Nestes terrenos, em geral, as fundas em trigo rijo são elevadas, mas o custo da cultura é caro e o movimento de gados pequeno. Ë o que acontece na zona dos barros de Beja, Ferreira, Cuba, Alvito, Serpa, Moura e pouco mais nos campos de Beja; é ainda o que se observa nalguns terrenos de Elvas e de Campo Maior;
Há depois um grupo de terras menos ricas, mas ainda boas para trigos moles, como Alter, Fronteira, Estremoz, Borba, Vila Viçosa, Redondo, parte de Elvas e de Campo Maior, Arronches, Viana, Alvito, Reguengos, Portel, Vidigueira e outras que menos conheço no distrito de Beja;
Há ainda a considerar as terras da borda de água, boas, mas tão sujeitas nestes últimos tempos a sucessivas e destruidoras cheias;
Há, finalmente, o grupo dos párias cerealícolas, constituído pela maioria dos distritos de Portalegre e Évora, com as suas terras de centeio levadas a trigueiras à custa de adubações esgotantes; há as areias dos distritos de Santarém e Setúbal; há os xistos do baixo distrito de Beja.
A despeito das más condições dos agricultores das boas terras de barro, mais graves são hoje as dos culti-