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250 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 131

vadores das terras centeeiras. Para cada uma destas situações a posição deficitária representa um caso especial.
É frequente ouvir dizer: mas então porque continuam a cultivar trigo?
Várias são as razões:
O horror do lavrador em mudar de ofício;
O não saber como viver no dia de amanhã abandonando a agricultura;
A solidariedade com o próprio pessoal rural quando se é lavrador, porque o seareiro, esse, já voltou a assalariado;
A necessidade de solver encargos nas caixas de crédito e empréstimos de cultura;
A esperança, há tantos anos frustrada, de ter um ano bom;
Encargos que continuam exigidos mesmo depois de suspensa ou interrompida a exploração agrícola, visto empenharem todos os capitais móveis e fundiários;
Necessidades de pastos e palhas para a exploração pecuária;
Um imperativo moral de solidariedade nacional pela consciência da necessidade da alimentação pública;
A esperança de uma modificação favorável da tabela oficial do preço do trigo.
Estas as razões principais da situação da lavoura em geral e da trigueira em especial.
Digo em geral porque uma parte da lavoura não está nestas circunstâncias. Vamos ver qual e porquê:
Não está em crise o lavrador que se fez negociante, diminuindo concomitantemente a sua cultura cerealífera, ou fez a mercado negro»;
Não o está o que baseou a sua exploração na pecuária, porque pouco despende com pessoal e a actual baixa de preços, por recente, ainda não o afectou grandemente;
Não o está igualmente o que tem grandes montados e engorda porcos, bem como o que tem cortiça, apesar da depreciação do já atingido;
Não está ainda o que dispõe de outros rendimentos a que pode recorrer ou tem possibilidade de certas culturas, como a do arroz;
Finalmente, não o estão os de regiões onde culturas variadas, como a da oliveira, a da vinha, a do milho e 03 montados, não os obrigam a depender da cultura quase exclusiva de cereais.
Os desta última são os que devem as grandes quantias à Caixa Geral de Depósitos, ao Crédito Predial e aos outros bancos.
Sr. Presidente: há mais de cinquenta anos que cultivo trigo (desde 1895, isto é, há cinquenta e três anos).
Durante todo este tempo, das lavouras por mim dirigidas devem ter saído mais de 60 milhões de quilogramas de trigo. Nos últimos anos a sementeira tem orçado por duzentos moios só de trigo e outro tanto de segundas, isto é, de cevada, aveia e centeio, sem falar de milho e arroz.
Fui sempre conhecido como produtor de gados selectos, mas a minha maior preocupação tem sido sempre a cultura do trigo.
Não é aqui lugar para uma lição de agronomia, mas posso garantir que desde muitos decénios experimentei todas as adubações orgânicas e químicas, estrumes e siderações, chegando à conclusão de que, se tecnicamente se pode melhorar, econòmicamente se vai de encontro a graves perdas nos anos maus.
Tentei várias densidades de sementeiras e voltei às usuais.
Usei diversas armações de terreno, inclusive o método integral, e tive de voltar à forma corrente na minha região.
Empreguei quase todos os trigos nacionais e estrangeiros, precoces e não precoces, moles e rijos.
Os primeiros trigos seleccionados para semente pelo professor Strampelli vieram para Portugal por minha intervenção, antes mesmo de entrarem primeiramente no comércio.
Adiantei e atrasei sementeiras e colheitas, adubei em cobertura, despontei, mondei à mão e quimicamente.
Empreguei charruas, maquinismos modernos (semeadores, distribuidores de adubos, ceifeiras e ceifeiras--debulhadoras), e cheguei à conclusão de que o clima é o principal causador das boas ou más produções, portanto das boas ou más colheitas.
Em condições idênticas, um ano dá 1:800 quilogramas e outro 350 quilogramas por hectare. E não fui só eu a ter esta opinião; os meus empregados Filipe de Jesus, Manuel Ganhão, Francisco de Sousa, Luís Ramos, Alfredo Farinha e Jacinto Silvério, todos pessoas que deram boa conta de si na vida, têm, ou tiveram, a mesma opinião.
Cheguei, por conseguinte, à conclusão de que o único sistema para ser cultivador de trigo não é forçar a cultura, mas saber não ser colhido, sendo muito económico. O melhor de tudo é não descer à arena.
Estes três últimos anos foram para mim como para Guerrita a colhida no pescoço: «Este es el aviso», já não se sentia em plenas forças. Eu farei o mesmo; já estou avisado pêlos desastrosos resultados de 1946-1947. Vamos a ver se, ao menos, 1948 será, como dizem os franceses - mourir en beauté - com um ano bom.
Sr. Presidente: porquê, como e desde quando se chegou a esta situação aflitiva?
Peço às pessoas que se sentirem atingidas pelo que vou dizer me perdoem.
Sei que todas procuraram acertar, mas errare humanum est - e nisto houve erros.
Não mencionarei nomes; só apontarei factos, mas antes uma premissa aclarativa.
A lavoura é uma indústria de movimentos lentos, mas que sofre de variações bruscas e de desequilíbrios:
Há bosques que para darem seus frutos e amortização levam trinta anos;
Os olivais levam também muitos anos;
Uma vinha, cinco ou seis anos;
Uma seara ide trigo, dois anos.
A montagem de uma lavoura até à sua primeira produção e até à amortização da montagem da empresa leva, pelo menos, cinco ou seis anos. Quer dizer que qualquer variação de preços, durante estes períodos, pode beneficiar ou prejudicar gravemente qualquer destes empreendimentos.
Ora a cultura frumentária tem visto no espaço de vinte e cinco anos - não vou mais longe porque o julgo inútil - mudar constantemente os níveis em que tem navegado:
Mudou o valor do dinheiro;
Mudaram as tabelas do preço oficial do trigo;
Mudou o preço relativo dos adubos e dos petrechos de cultura;
Surgiu a guerra;
Apareceu a concorrência do «mercado negro* e desonesto a desordenar todos os preços de pessoal e de produtos para os agricultores honestos;
Apareceu a organização de moageiros, de salsicheiros, de industriais de lanifícios e de tantos outros ramos a pesar sobre o preço e escoamento de produtos da desorganizada terra, que pelo seu fraccionamento e diferenciação não pode defender-se com as organizações feitas com boa vontade para a proteger.
Mas, dizia eu, desde quando vem esta situação da lavoura cerealífera?
Respondo: desde 1932! E porquê?