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11 DE JANEIRO DE 1951 231

mais tempo o autor demorar em vir a juízo tanto melhor paira ele, porque mais dificultará a prova que em sua defesa o réu é obrigado a fazer.
Talvez por isso, em matéria de acidentes de trabalho - em que, contudo, o legislador tem um interesse manifesto em proteger as vítimas ainda mais amplamente do que tratando-se de acidentes de viação - a Lei n.º 1:942 concede (artigo 32.º) apenas o prazo de um ano, a contar do acidente, para o operário ir a juízo reclamar o que lhe for devido.
Pois fim matéria de acidentes de viação o assento de 26 de Janeiro de 1937 concede às respectivas vítimas o prazo de trinta anos para poderem accionar os condutores dos veículos!
Elas só terão de demonstrar que no dia tal de 1922, por exemplo, foram atropeladas pelo veículo número tal, pertencente ao Sr. Fulano, o que, sendo verdade, a todo o tempo se pode provar, inclusivamente pelos jornais ou pelos registos da polícia.
Eles, os condutores dos carros (ou possivelmente os seus herdeiros), é que terão - a trinta anos de distância - de provar com testemunhas (que na sua maioria morreram ou desapareceram) a forma como tudo se passou!
É simplesmente assombroso!
Só me espanta que, num tempo em que pulula para aí tanto aventureiro à cata de negócios, ainda não tenhamos deparado com anúncios deste género publicados nos jornais: «Direitos litigiosos de vítimas de acidentes de viação ocorridos há mais de vinte anos e menos de trinta anos compram-se por bom preço».
O cessionário destes direitos, accionando, em massa, os donos dos carros, faria fortuna em pouco tempo. Faria, se estas minhas exortações não encontrarem nenhum eco; porque, se encontrarem, deverá publicar-se uma disposição legal estabelecendo para a propositura destas acções de responsabilidade civil um prazo razoável, por exemplo, um ano, como está estabelecido em acidentes de trabalho, prazo que já permite largamente às vítimas coligirem os seus elementos ofensivos, mas que também não deixa os réus sem possibilidades de defesa.
Um dos casos anais estranhos que nesta ordem de ideias há que referir é o do assento de 9 de Julho de 1937 (37).
Esse, então, foi tirado sem um voto de discrepância pelos seus doze signatários e recebeu geral aprovação dos jornais de direito onde veio publicado (37) - como se a fascinação de um erro tivesse produzido um fenómeno colectivo de mimetismo intelectual.
Contudo, a doutrina do assento, que deixou um acto criminoso impune, é de tal forma imoral que os próprios signatários se declararam confrangidos por deixar impunes actos que repugnam aos sentimentos humanos e à moral social e é tão antijurídica que o Prof. Marcelo Caetano, nas suas Lições de Direito Penal, se refere nestes termos ao assento: «é nitidamente ilegal, e espanta como foi votado e assinado, nos termos de verdadeira inópia jurídica com que está redigido, por todos os Venerandos Conselheiros» (38).
O caso é o seguinte:
Determinado proprietário lançou fogo a um edifício seu, situado fora do povoado, não habitado, nem destinado a habitação, com o fim de receber das companhias seguradoras a respectiva indemnização.
Fora condenado em 1.ª instância, absolvido na Relação, novamente condenado no Supremo Tribunal de Justiça e finalmente absolvido outra vez, e desta definitivamente, pelo tribunal pleno. A eterna dança das decisões, mas em que, desta vez, estas oscilaram com o ritmo certo e a amplitude máxima do metrónomo!
Pois o assento de 9 de Julho de 1937, lamentando muito qne, em sen entender, uma lacuna da lei o forçasse a julgar assim, declarou que este facto não era punível!
Como o artigo 468.º do Código Penal, onde a incriminação poderia fazer-se (e onde a tinha feito o acórdão recorrido), remete, na parte que interessa, para os casos previstos nos artigos 463.º e 464.º, o assento declarou que a hipótese do processo - fogo posto em edifício fora do povoado, não habitado nem destinado a habitação - não era nenhuma das indicadas nesses artigos 468.º e 464.º
Ora o n.º 1.º do artigo 464.º fala expressamente em «embarcação, armazém ou qualquer edifício, dentro ou fora do povoado, não habitados nem destinados a habitação».
Exactamente aquilo que o criminoso incendiara no processo em que foi proferido o assento.
A atenção dos doutos signatários deste foi, portanto, desta vez lamentavelmente traída.
Mas, mesmo que o não tivesse sido e que a culpa da deplorável decisão coubesse a uma deficiente redacção da lei, isso seria apenas mais um motivo para urgentemente corrigir o que está errado.
O que é inadmissível é haver em Portugal certos crimes de fogo posto em que o nosso mais alto tribunal manda em paz o incendiário, embora lamente muito ter de fazê-lo, e diga para o prejudicado, em ar de consolação: «Tenha paciência, irmão; não pode ser».
Sr. Presidente: para não fatigar demasiadamente a atenção desta Câmara (não apoiados) aludirei apenas a mais dois assentos do Supremo, os de 9 de Julho de 1948 e 18 de Maio de 1949, ambos respeitantes a matéria de processo (39).
O assunto é o menos próprio para ser desenvolvido aqui, e portanto limitar-me-ei a um ligeiro apontamento.
Pelo artigo 690.º do Código de Processo Civil, os advogados deverão terminar as suas alegações escritas de recurso perante os tribunais superiores pela indicação resumida dos fundamentos em que as baseiam. São as chamadas conclusões.
Se à alegação faltarem essas conclusões, devem os juizes convidar os advogados a formulá-las, sob pena de não se tomar conhecimento do recurso - diz ainda o mesmo artigo 690.º
O assento de 9 de Julho de 1948 julgou que para o Supremo poder conhecer de recurso fundamentado em ofensa de lei é indispensável que esta seja especificada nas conclusões das alegações.
Quer dizer: se a lei transgredida foi invocada seis linhas atrás, no contexto das próprias alegações, isso de nada servirá. Sem que nenhuma lei expressamente o diga, o assento exige que a citação do artigo se repita no fecho da minuta.
Como o artigo 690.º declara, como já vimos, que, no caso de faltarem conclusões à minuta, o recurso não ficará perdido sem que o tribunal convide o advogado para as formular, havia quem sustentasse que, se a minuta continha conclusões, mas deficientes no entender do Supremo, por lhes faltar a indicação da tal lei ofendida, com maioria de razão nessa hipótese também se deveria convidar o advogado para suprir a omissão.
Veio então o assento de 18 de Maio de 1949 e fechou também essa porta, consignando que e o convite ao advogado, a que se refere o artigo 690.º do Código de Processo Civil, só pode fazer-se no caso da falta absoluta de conclusões na alegação de recurso».
De modo que ficou consagrado este tremendo absurdo: se um advogado se esquece totalmente de formular conclusões na sua minuta, não há perigo nenhum, porque o tribunal convidá-lo-á a reparar a falta.
Mas se o lapso foi muito menor, o advogado formulou conclusões e apenas se esqueceu de nelas reproduzir a citação de um artigo de lei, porventura men-