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11 DE JANEIRO DE 1951 229

Segundo a outra corrente, o recurso tem viabilidade, porque os artigos das duas leis vigentes à data dos acórdãos são absolutamente idênticos, e assim as decisões foram proferidas no domínio da mesma legislação.
A questão tem sido largamente discutida e ainda recentemente foi estudada, num douto artigo publicado na Revista dos Tribunais, pelo ilustre jurisconsulto, e nosso querido colega, Dr. Sá Carneiro (20).
Considero, como ele, infundamentada a corrente rigorista do Supremo.
O recurso para o tribunal pleno tem por objectivo não só permitir que ao recorrente se faça justiça nó caso vertente, mas, principalmente, permitir a uniformização, e o consequente prestígio, da jurisprudência e pôr termo ao caos das decisões contraditórias.
Ora, se o preceito legal é o mesmo, não é por estar inserto em diplomas legais diferentes que a contradição dos acórdãos desaparece ou se atenua.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - V. Ex.ª dá-me licença?
Eu sustentei na Ordem dos Advogados precisamente essa opinião: desde que o texto é o mesmo, que o assento prevalecesse. Mas a minha opinião foi vencida.

O Sr. Sá Carneiro: - Quando o Código de 1939 começou a vigorar, surgiu este problema: estariam revogados os assentos anteriores produzidos com base na legislação anterior, embora a legislação de 1939 fosse idêntica? E admitiu-se que estavam todos revogados.

O Orador: - O que é preciso é que não haja transposição das questões.
A decisão que se tome quanto ao problema da vigência dos assentos sobre matéria de processo depende da noção em que assentarmos sobre o que é o domínio da mesma legislação, e não é a inteligência desta expressão que pode depender da solução do outro problema. Um é causa e outro efeito.

O Sr. Sá Carneiro: - Revogados estão todos os assentos sobre processo. Estão revogados porque o assento não pode ser discutido.

O Orador: - Eu sei que se observa, e com mais subtileza de dialéctica do que justa razão, que o texto de dois artigos pode ser igual, mas a sua interpretação dever ser diferente, porque podem ter variado o espírito, o sistema, ou outros preceitos dos diplomas em que se integram.

Mas, se assim é, torna-se necessário demonstrá-lo.
Admito que as palavras dos dois preceitos podem ser iguais, e, contudo, às vezes significarem coisas diversas (só excepcionalìssimamente, porém, tal acontecerá, porque o legislador, quando quer que ao novo preceito se dê uma interpretação diferente, não vai empregar redacção idêntica à antiga); mas muito mais facilmente admito ainda que as palavras de dois preceitos podem ser diversas, e, não obstante, significarem a mesma coisa.
Por conseguinte, determinar se as duas decisões em conflito foram ou não proferidas no domínio da mesma legislação não é questão a resolver apenas pelo confronto material das palavras, nem da data, nem dos números dos respectivos decretos ou leis.
E uma questão de essência, é uma questão substancial.

O Sr. Mário de Figueiredo: - V. Ex.ª dá-me licença?

E para trazer um elemento de elucidação ao problema que está posto: é conhecida a lei uniforme em matéria de letras.
A lei uniforme tem o mesmo texto e contexto nos vários países em que vigora. E pode ser diversamente interpretada, em consequência de sistemas diferentes de Direito em que se integra. Pode aparecer com um conteúdo diferente imposto pelos sistemas de Direito em que se integra; e, no entanto, a disposição é a mesma.

O Orador: - Agradeço a V. Ex.ª a informação que me presta.
Quando o recorrente cita um acórdão oposto ao recorrido proferido no domínio do artigo tal do Código de Processo de 1876, igual ao artigo tal do de 1939, o Supremo não pode - entenda-se, mão deve poder - indeferir còmodamente o recurso, sob o pretexto de que os dois códigos constituem legislações diferentes.
Se essa diversidade ide legislação alterou, no entender do Supremo, a inteligência do preceito em causa, há que dizer em quê e porquê.
E se houver razões para demonstrar concretamente em cada hipótese, e anão teoricamente, aprioiristicamente e em abstracto, que realmente o preceito tem um alcance distinto do preceito anterior, apesar da redacção idêntica, então sim -e só então- haverá motivo para recusar seguimento ao recurso.
Julgo indispensável, numa eventual reforma da lei, eliminar também a este respeito qualquer possibilidade de dúvida.
Antes de encerrar este capítulo acerca do processo ou da mecânica por que são tirados os assentos, apenas esta ligeira nota:
O Supremo Tribunal de Justiça manteve durante certa época uma jurisprudência inabalável no sentido de que contra os seus assentos não eram admissíveis sequer aquelas reclamações que o código faculta no caso de uma decisão conter um lapso manifesto, um erro de escrita ou ide cálculo, uma inexactidão material, etc. (21).
Contudo, em arestos posteriores, embora com votos de vencido, o nosso primeiro tribunal já tem julgado em sentido inverso (22).
Creio ser conveniente, para evitar novas flutuações futuras, estabelecer expressamente que contra os assentos podem ser deduzidas reclamações - muito embora se preveja qualquer sanção especial contra o litigante que infundadamente, apenas para incomodar ou protelar, põe em andamento a demorada e complicada máquina que é o tribunal pleno.
Sr. Presidente: já não é sem tempo que chego à segunda parte das considerações que me propus fazer.
Consiste ela em apreciar algumas das conclusões concretas a que o Supremo Tribunal de Justiça tem chegado nos conflitos de jurisprudência que lhe são submetidos. Até hoje aquela corte tem já proferido mais de cento e trinta assentos.
Decerto a esta Assembleia será grato prestar homenagem ao intenso e digníssimo labor desenvolvido por aquele venerando Tribunal.
Apoiados.
E de elementar justiça destacar que na enorme maioria dos assentos proferidos o Supremo soube sempre escolher a melhor de entre as soluções possíveis e que muitos desses arestos são modelos perfeitos, pelo seu conteúdo, pela sua concisão e até pela elegância literária com que estão redigidos.
Apoiados.
Mas, a par disto, ninguém poderá estranhar - visto que a perfeição absoluta não está ao alcance da pobre Humanidade - que algumas das decisões proferidas sejam mais discutíveis e outras, felizmente poucas, francamente infelizes.
De resto isso nem sempre acontecerá por culpa dos doutos conselheiros que tiram os assentos. Algumas