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2 DE MARÇO DE 195l 467

Quanto à primeira, nem a sua extensão nem a sua intensidade dependem exclusivamente de nós.
Nesta hora a defesa nacional não deixará de ser defesa da Nação, visto que a mesma existência das nações é posta em causa, mas também, ao mesmo tempo, defesa supranacional, ou seja defesa de uma civilização em que somos solidários e cooperantes com outras nações.
Também não é fácil dizer ou prever até onde as exigências desta defesa poderão influir no plano a traçar em prosseguimento da nossa reconstituição económica.
Esta atmosfera de incerteza levou o Sr. Presidente do Conselho a sugerir no seu discurso de 12 de Dezembro de 1950 e no relatório enviado a esta Assembleia sobre a Lei n.º 1:914 as seguintes directrizes:

1.ª Mais do que uma lei ambiciosa, devemos conceber um plano modesto de fomento a executar em meia dúzia de anos e ordenado para satisfação de algumas das maiores e mais prementes necessidades do povo português;
2.ª Como não podemos querer tudo ao mesmo tempo, é a altura de definir critérios de preferência, dos quais o fundamental será o seguinte:

Sem desatender alguns grandes empreendimentos de carácter vincadamente reprodutivo - como a energia hidroeléctrica, a irrigação, o povoamento florestal -, há necessidades essenciais para a vida da Nação, como o desenvolvimento das comunicações e a melhoria das instalações de ensino, que não podem ser postergadas por outras, por mais sedutora que se afigure a sua reprodutividade imediata.

E quanto aos meios ou recursos?
Quanto aos meios, o Sr. Presidente do Conselho sugere as mesmas fontes que serviram de base financeira à Lei n.º 1:914, ou sejam as seguintes:

a) As possíveis mais valias e os saldos das receitas ordinárias obtidos pela severidade nos gastos:

Severos nos gastos, moderados nas ambições (discurso de 12 de Dezembro de 1950), abstraindo mesmo das necessidades relacionadas com a perturbação dos tempos, amanhã, como ontem, a regra tem de ser a maior severidade nos gastos e na vida.

b) Além dos saldos, o recurso moderado ao crédito, de preferência nacional:

É salutar que, sempre que possível, o País conte sobretudo consigo, sem que isto signifique menor interesse ou simpatia pela cooperação do capital particular estrangeiro no desenvolvimento de algumas das nossas riquezas...
Mas não se pode esquecer que a plena independência em relação a bolsas estrangeiras nos permitiu nas últimas décadas apreciável liberdade de movimentos...

Com este critério concordaram as directrizes da Lei de Meios apresentada pelo actual titular da pasta das Finanças, a quem me apraz dirigir as minhas saudações deste lugar.
Resta-nos, pois, ver a ambiência política, e as atitudes em face destas novas directrizes. Não podemos desconhecer, Sr. Presidente, que em alguns dos sectores da vida portuguesa se mantém o ambiente de incompreensão que cercou a Lei n.º 1:914 e que ao ambiente de desconfiança sucedeu o de uma audácia nas despesas, de euforia nas realizações materiais imediatas: audácia nas despesas a que já ouvimos chamar a revolução do fomento, mas a que se me afigura caber antes o qualificativo de demagogia económica.
Pedir mais funcionários, maiores vencimentos, mais créditos, mais subvenções é a política fácil que há-de reunir certamente muitíssimos votos.
Mas quem paga?

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Os contribuintes? Respondem que estes não podem pagar mais; dizem, como em 1935, que é preciso desagravar os impostos, desagravar as pautas aduaneiras, em suma, todas as fontes de onde pode vir receita, para se poder fazer esta maravilha: menos receitas e mais despesas.
Então de onde virão os recursos? Não ousam dizê-lo, mas principiam já a suscitar-se dúvidas sobre o valor do princípio do equilíbrio orçamental; descobrem até uns professores vagos que entendem ser melhor o déficit do que o equilíbrio; que não vale a pena equilibrar os orçamentos porque o desequilíbrio, é, afinal, o grande eureka para a Europa futura e para os seus orçamentos.
Entretanto, estão ainda na dúvida, mas vão atacando sem dúvidas o critério e a directriz da severidade dos gastos; não podem admitir a rigidez da contabilidade e as suas disciplinas severas...
Não sabem eles que esses números frios traduzem tanta vez o suor e as lágrimas de um povo que se sacrificou para manter a ordem e o equilíbrio durante vinte e cinco anos!

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ousam atacar a hegemonia perigosa do critério da contabilidade orçamental: reclamam um espirito novo, mais desempoeirado na elaboração dos orçamentos...
Prometer despesas e gastos sem indicar a cobertura possível foi, em todos os tempos, demagogia económica, e atrás dela esteve sempre a demagogia política.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Uma revolução de fomento que advoga despesas sem conta e sem medida pode regressar ao déficit, mas ao fomento nunca.
Como dizia a Câmara Corporativa no seu parecer sobre a Lei n.º 1:914, o déficit crónico, a miséria financeira, tornavam inúteis os queixumes do povo e platónicas as promessas do Tesouro. Gastava-se à larga, mas não em proveito do País: em proveito, sim, dos parasitários que viviam largamente à custa do desgoverno da Nação.
Supúnhamos - eu pelo menos supunha, Sr. Presidente -, que vinte e cinco anos de ordem financeira tinham extirpado para sempre, neste país, o cancro do déficit, que nos tinha levado ao descrédito e à vergonha. Mas quando, há dias, sentado na minha poltrona de Deputado, ouvi nesta tribuna duvidar do valor do equilíbrio orçamental, passou pela minha imaginação a cena a que assisti nesta mesma sala em 1924-1925.
Um Presidente do Conselho - não quero discutir aqui o seu valor, mas era homem sério e digno sob o ponto de vista de honestidade -, acusado por um Deputado da oposição de que tinha mandado passar uma portaria surda para uma emissão de notas, levantou-se, tirou o sobretudo e respondeu:
«É verdade! Mas eu tinha de mandar pagar no dia seguinte os vencimentos e não havia um escudo em caixa. O que queriam os senhores que eu fizesse?».