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2 DE MARÇO DE 1951 463

É tudo isto que querem significar as saudações que dirijo a V. Ex.ª ao tomar de novo contacto directo com esta Assembleia, e digo contacto directo, porque o contacto espiritual nunca o perdi.
Nunca deixei de ser Deputado e de acompanhar os trabalhos da Assembleia, através da leitura atenta do seu Diário.
Dos velhos e queridos companheiros que aqui deixei, eu não os lia apenas, ouvia a sua voz, que me era familiar, ao perpassar os olhos pelos seus discursos, e, quanto aos novos Deputados, ia aprendendo a conhecê-los e a admirá-los no contacto espiritual com os seus estudos e trabalhos.
Permita-me V. Ex.ª que a todos torne extensivas, nesta hora, as minhas mais sinceras e amigas saudações.
Na altura em que me é dado intervir neste debate não desejaria cansar a Assembleia, já suficientemente elucidada pelos brilhantes discursos proferidos nesta tribuna por pessoas cuja competência não me seria nunca dado igualar.
Quero felicitar, de uma maneira geral, o ilustre relator deste aviso prévio, porque, se bem que nem sempre pudesse estar de acordo com S. Ex.ª - e no decorrer s minhas considerações aflorarei um ou dois desses pontos -, no entanto, as pequenas divergências não diminuem a minha consideração pelo seu brilhante trabalho, cheio de análise penetrante, de competência e saber.
Se eu bem compreendi, a intenção de S. Ex.ª ao trazer este aviso prévio e o objectivo que consta expressamente do relatório de S. Ex.ª o Presidente do Conselho que está em discussão não é fazer deste debate uma discussão parcelar de contas públicas, mas antes poder tirar da análise da Lei n.º 1:914, da sua experiência económica, dos seus resultados, novas directrizes para habilitarem o Governo a formular nova proposta de lei que permita continuar a obra de reconstituição económica ou de reconstituição nacional iniciada pela Lei n.º 1:914.
O simples enunciado deste objectivo divide o assunto em duas partes: a análise da Lei n.º 1:914 e as possíveis directivas da nova proposta de lei.
Cada uma destas partes poderia e pode desenvolver-se sob vários aspectos, alguns deles, como disse, já aqui brilhantemente tratados.
Permiti-me, por isso, contribuir para a elucidação desta Assembleia com alguns aspectos financeiros do problema. Pareceu-me que a escolha deste aspecto era para mim dever de oficio, ou, melhor dizendo, consequência das responsabilidades assumidas como modesto colaborador (não apoiados) do ilustre titular que foi da pasta das Finanças, o Dr. Costa Leite, com quem trabalhei durante seis anos.
Repito, Sr. Presidente, modesto colaborador, porque em matéria de finanças fiquei apenas compreendendo melhor o valor de determinados princípios, ao vê-los funcionar em face das realidades e da grandeza dos terríveis problemas que passam por esse sector da administração pública, porventura um dos mais ingratos, e ingrato porque todos acham muito quando se paga, e todos acham muito pouco quando se recebe.
Nenhuma glória me cabe, Sr. Presidente, na inteligente e competentíssima administração do Sr. Dr. Costa Leite, mas, neste lugar ou em qualquer outro, não tenho dúvida em assumir as responsabilidades que a essa administração se pedir.
O ilustre relator deste aviso prévio principiou por fazer algumas alusões históricas ao ambiente em que foi votada a Lei n.º 1:914, e eu reputo tão valiosos os ensinamentos que se podem tirar desse ambiente histórico que me permito, com licença de S. Exa., glosar algumas das suas considerações sobre este aspecto.
Não sei qual o ambiente que reinava no Governo do tempo ao ser redigida e apresentada a proposta. Sobre isso poderiam dar-nos valiosa elucidação os dois ilustres membros desta Assembleia que nessa altura dele faziam parte, Srs. Deputados Linhares de Lima e Engenheiro Sebastião Ramires, que ocupava a pasta do Comércio e Indústria, naturalmente ligada ao desenvolvimento da proposta da Lei n.º 1:914.
Mas o que eu sei, Sr. Presidente, é que essa proposta foi recebida na Câmara Corporativa e nesta Assembleia num ambiente da maior incompreensão e da maior desconfiança.
O parecer da Câmara Corporativa confessa lealmente que foram tão pouco compreendidos os objectivos da Lei n.º 1:914 que o ilustre redactor desse parecer, aliás um homem público experimentado e duma honestidade inconcussa, só se habilitou a redigir o seu parecer depois de ter consultado directamente o Sr. Presidente do Conselho e de ouvir da sua boca os objectivos dessa lei. E é explicável essa incompreensão. Vivia-se nesse momento num ambiente internacional de planismo; começavam a desenvolver-se nessa altura os 500 códigos da acção dirigista rooseveltiana, na América, com os quais se procurava atenuar as consequências do crack de 1929, em que o «fordismo» se afundara, e atenuar por um dirigismo apertado a situação de crise em que se encontrava a economia americana.
O planismo na Itália, onde Mussolini fizera o grande plano da Bonifica, preparando a euforia social para a aventura da Etiópia, planismo que na Rússia apresentava os seus famosos planos quinquenais, que viriam denunciar o erro colossal do gigantismo económico aplicado a um único sector sem ser correspondido pela acção desenvolvida noutros. Suponha-se pois que a Lei n.º 1:914 não passava de um mimetismo legislativo, indo na corrente do planismo internacional.
A verdade é que a Lei n.º 1:914 tinha alguma coisa de novo sobre todos os aspectos. Era uma fórmula antecipada e precursora daquilo que deveriam ser mais tarde os chamados orçamentos económicos apresentados pelos Ministros das Finanças dos grandes países, em correspondência com os orçamentos financeiros anuais.
Outros supunham que a Lei n.º 1:914 não passava de um simples plano de obras públicas, e os próprios juristas não chegavam a compreender que fórmula de lei nova era esta cuja acção coactiva funcionava apenas para determinado prazo e cujo sujeito de obrigação se não achava bem definido.
Todas estas incompreensões eram explicáveis, visto que se tratava de uma fórmula nova, em que o génio de Salazar era, não imitador, mas precursor nesta matéria, como tem sido em tantas outras.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A característica verdadeira da Lei n.º 1:914 era, pois, a de uma lei orçamental ou, diremos melhor, superorçamental, que condicionaria durante quinze anos a própria acção governativa e, sobretudo, as despesas extraordinárias dos orçamentos anuais durante o seu prazo de vigência.
Era esta a sua verdadeira característica.
Quem era o sujeito das obrigações que ela impunha coactivamente?
Não eram os cidadãos, eram os próprios elementos do Poder Executivo - os órgãos da administração pública. A esta se dirigia a sua acção coactiva.
Era o Governo que ficava preso a determinadas linhas gerais.
Creio, Sr. Presidente, que «a simples característica especial desta lei me leva a discordar e a não compreender a posição tomada nesse momento por aqueles que supunham que para executar a Lei n.º 1:914 se podia criar uma junta económica, como aqueles que