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464 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 77

ainda hoje supõem que uma lei desta natureza poderia ser executada por um organismo independente do Governo.
Seria preciso que esse organismo fosse supergovernamental; de outra forma, se a lei na sua acção coactiva se dirigiu aos organismos superiores da Administração, não se compreende como seria possível a formação de um organismo que estivesse acima da própria acção governativa.
Não estou fazendo uma construção jurídica de ocasião ou para efeitos parlamentares.
Quem reler o relatório da Lei n.º 1:914, ou quem ler mais detidamente o próprio relatório do Sr. Presidente do Conselho mandado a esta Assembleia, encontrará confirmada esta característica da Lei n.º 1:914.
Eu, abusando da paciência desta Assembleia, vou ler as passagens da Lei n.º 1:914, de 1930, que abonam esta maneira de ver, e chamarei a atenção da Assembleia para ia passagem do relatório do Sr. Presidente do Conselho que confirma esta maneira de ver.
No relatório lêem-se estas palavras:

Fixada a orientação oral, será mais fácil a preparação dos trabalhos para serem efectuados em harmonia, com as necessidades da acção governativa...

Relativamente aos recursos, dizia também o relatório da Lei n.º 1:914:

O emprego de recursos obedecerá em qualquer caso à preocupação de evitar a inflação do crédito ou dos meios de pagamento e de não alterar o equilíbrio da economia nacional em relação ao exterior.

É evidente que nenhum organismo exterior do Governo poderia influir na acção governativa ou intervir no conhecimento dos recursos disponíveis do Tesouro.
Mas claramente confirmativas desta maneira de ver são as palavras do relatório que está em discussão que passo a ler:

A Lei de Reconstituição Económica não pode considerar-se como tendo aprovado um plano de quinze anos nem pode catalogar-se entre as do mesmo tipo de leis que noutras partes estabeleceram planos quinquenais ou decenais.
Para se apreciar devidamente a sua execução importa definir-lhe o carácter, e este consiste sobretudo, em ter partido do cálculo das possibilidades financeiras presumíveis nos anos mais próximos pura prescrever uma linha geral de aplicação ao desenvolvimento da economia do País e da capacidade defensiva da Nação. Saneadas as finanças públicas, equilibradas solidamente as contas, provida com abundância a tesouraria, entrevista a possibilidade de operações financeiras no mercado interno em condições aceitáveis, sentida a necessidade de actuar com amplitude nos grandes factores da riqueza nacional, o Governo entendeu que era conveniente evitar a dispersão de esforços e de meios e propor se fixassem ao trabalho da administração pública grandes linhas de orientação.

Esta era de facto a finalidade e a característica especial da Lei n.º 1:914.
E, porque estas características eram novas e especiais, não admira, é perfeitamente explicável, a incompreensão com que foi recebida e algumas críticas inconsideradas que nesse momento lhe foram feitas.
Não se pode dizer mesmo que o Governo não criasse os organismos indispensáveis para a boa execução da lei.
Recordam-se VV. Exas. que foi posteriormente que se criou o Ministério da Economia, como organismo de coordenação. Depois disso criou-se o Conselho de Ministros para o Comércio Externo, órgão de coordenação dentro da acção governativa. Depois disso criou-se o Conselho Técnico Corporativo. Depois disso criou-se o Centro de Estudos, a que fez aqui há dias elogiosa referência o Sr. Dr. Mendes Correia.
Concentrou-se ainda no Ministério das Obras Públicas toda a execução destas. E não sei se, ao analisar detidamente a execução da lei, não temos de queixarmos antes de um excesso de concentração do que propriamente da falta de órgãos executores!
Politicamente, suponho que nós temos a ideia de que os organismos que porventura funcionam mal, porque à frente deles se não encontram os homens que nós supomos mais competentes, poderiam facilmente ser substituídos por outros, melhorados em competência.
Infelizmente não é fácil encontrar os homens ideais; e por isso a ideia da criação de organismos novos parte de um equívoco ou ilusão: a de que são sempre mais competentes os homens postos à frente dos organismos criados de novo, o que nem sempre acontece.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas, se o ambiente em que foi votada a Lei n.º 1:914 era de incompreensão, foi também de desconfiança. Como diz o parecer da Câmara Corporativa, vivia-se nessa altura, em 1935, num ambiente de crise económica, de desordem monetária - tinham acabado de afundar-se as duas grandes moedas-padrão, o dólar e a libra - e de perturbação social. Isto ajudava o ambiente de desconfiança com que foram recebidas as previsões dessa lei.
Como VV. Exas. recordam e tem aqui sido já largamente explicado, a proposta previa possibilidades financeiras num volume dos 6.500:000 contos, que viriam das seguintes fontes: dos caldos já amealhados (essa verba não oferecia dificuldades, pois estavam já amealhados 717:000 contos de saldos); mais valias, que se calculavam em 3.000:000 de contos; saldos anuais, 50:000 contos, ou seja nos quinze anos, 750:000 contos, e empréstimos, até ao valor de 2.000:000 de contos.
Pois bem, se o Ministro das Finanças, que conseguira equilibrar o orçamento, tinha já nesse momento a sua reputação feita na Europa, todavia muitas pessoas em Portugal não acreditavam que fosse possível manter um ritmo de vida equilibrada no nosso país, e por isso muitos desconfiavam da solidez das fontes donde deviam provir as possibilidades financeiras para a execução da lei.
Era precisamente nessa altura, recordam-se VV. Exas., que se dizia, e o próprio parecer da Câmara Corporativa faz alusão a isso, que era preciso desagravar os impostos, que a política dos saldos era perigosa e incomportável. O slogan era este: o Tesouro está rico e o País está pobre. Portanto, desconfiança justificada em relação às mais valias e aos próprios saldos anuais.
Dizia-se, por outro lado, que a ditadura do Ministério das Finanças conseguia saldos à custa das fracas ou insuficientes dotações dos serviços, e, por isso, era preciso fazê-los reverter para os serviços. Logo, desconfiança da possibilidade dos nossos saldos.
Quanto a empréstimos, o próprio parecer da Câmara Corporativa dizia claramente não poder pensar-se em empréstimos no mercado interno, quanto mais para se atingir a soma, que se considerava nesse momento impossível, de 2.000:000 de contos. Portanto, desconfiança em relação às possibilidades financeiras.
Os Estados Unidos da América do Norte haviam declarado que não fariam empréstimos aos países que não tivessem pago as dívidas de guerra, entre os quais se