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640 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 86

ordem profissional e de ordem política que dificilmente poderão tentar-se a um lugar de notário ou conservador ao cabo de alguns anos de exercício efectivo da profissão.
Na verdade, tal como disse o Sr. Deputado Sá Carneiro, a faculdade concedida aos advogados, ou, melhor, a prerrogativa concedida ao Poder de recrutar juizes para o Supremo Tribunal de Justiça de entre o corpo de advogados, é meramente uma afirmação de princípios.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - V. Ex.ª, como jurista, entende então que há leis que existem apenas para afirmar princípios, e não para se cumprirem?

O Orador: - Mas podem aplicar-se.

O Sr. Morais Alçada: - Afirmar princípios é abrir possibilidades.
V. Ex.ª disse que só tratava de mera afirmação de princípios; esse aspecto tem interesse. Abrem-se possibilidades; se elas vêm ou não a ser aproveitadas, isso é outro aspecto.

O Orador: - Suponho que VV. Ex.ªs deveriam ter-me deixado chegar ao fim.
Eu esclareço. Quando digo afirmação de princípios, quero dizer que o Estado, em presença do corpo de advogados portugueses, pratica a atitude reverente de julgar que de entre eles alguns sejam capazes e com aptidões especiais para o cargo em questão.
Mas desta afirmação de princípios extrair a conclusão, que se pode julgar natural, de converter no quadro normal do funcionalismo deste departamento todos os advogados, independentemente de um concurso, a que envolve erro de funestas e injustas consequências. A par disto pode afirmar-se que o abrir-se a possibilidade de os advogados conseguirem esses lugares é ferir a sua magnífica independência. Esse espírito pode confundir-se com uma certa subserviência, a fim de se obterem posições cómodas.
É como advogado independente que repudio a proposta do Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu.
Disse.

O Sr. Paulo Cancela de Abreu: - Sr. Presidente: devo dizer a V. Ex.ª que tomei a iniciativa desta proposta animado de dois sentimentos: o de justiça e mesmo o de humanidade, sob certos aspectos.
Apoiados.
E por isto não me julgo advogado menos independente dos que perfilhem opinião contrária.
O que propus não quer dizer que sejam nomeados notários e conservadores os incompetentes. Lá estão, o Ministro e os conselhos respectivos para o obstarem. Disse-se que a minha proposta fechava a porta a outros. Mas há lugar para todos, e é justo que a porta se abra quando se trata de praticar um acto de justiça e de humanidade.
E pergunto ainda: se uma disposição de lei que permite aos advogados serem nomeados juizes do Supremo Tribunal de Justiça é uma mera afirmação de princípio, sê-lo-á também a que permite que o sejam para o Supremo Tribunal Administrativo ao fim de dez anos de advocacia? Como assim, se vários advogados têm sido nomeados para este Tribunal?

O Sr. Morais Alçada: - ...e são juizes distintos.

O Orador: - E serão, porventura, mais competentes do que os advogados com tirocínio os diplomados com 14 valores a que se concede na lei aquele privilégio e alguns dos quais mereceram aquela classificação só porque estudaram bem a sebenta...

O Sr. Pereira de Melo: - É difícil dar boas provas na vida quando se não soube estudar a sebenta.

O Orador: - Sim, mas já tem sucedido não saberem fazer um requerimento... Falta-lhes a prática.
Porque não hão-de, pois, ser abertas as portas daquelas profissões aos advogados que durante dez anos no exercício da profissão deram boas provas?
Resta-me dizer que, se as últimas expressões do discurso do Sr. Deputado Pereira de Melo tiveram um sentido pejorativo, permito-me devolvê-las à sua origem.

O Sr. Pereira de Melo: - Eu não tive a intenção de ofender V. Ex.ª e, se acaso assim o entendeu, peço desculpa de não ter sido bastante claro.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: eu não vou falar senão como jurista e como pessoa que se interessa pela boa organização dos serviços.
Parece-me que não há nenhum paralelismo entre a possibilidade de se escolherem advogados com certo tempo de profissão para juizes conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça e o facto de se dispensarem advogados do concurso de habilitação para as funções de conservadores ou notários. Parece-me, dizia, que não há nenhum paralelismo, visto que, necessariamente e pela própria função de conselheiro do Supremo, nunca poderia admitir-se que fosse escolhido (e os conselheiros são recrutados por escolha, nos termos do Estatuto Judiciário) um advogado que não se tivesse marcado definitivamente como jurisconsulto.
Tratando-se do desempenho de funções de notário ou de conservador, o problema não se põe precisamente nos mesmos termos.
Na proposta apresentada pelo nosso ilustre colega Sr. Dr. Paulo Cancela de Abreu dispensar-se-iam os advogados do concurso de habilitação, não para amanhã serem escolhidos, mas para amanhã poderem apresentar-se ao concurso de nomeação - concurso de nomeação em que aparecem como concorrentes, além deles, pessoas com concurso de habilitações e outras já conservadores ou notários.
Neste concurso há-de haver naturalmente uma hierarquia de preferências, de harmonia com a qual o Ministro se decida. Decide-se por aqueles que fizeram concurso; por aqueles que já estão na função; ou pelos advogados que, por serem dispensados de concurso, concorrem também? E depois a que conservatória ou a que lugar de notário podem concorrer estes advogados com dez anos de serviço? A uma conservatória de 3.ª classe ou a um lugar de notário de 3.ª classe?
Permito-me perguntar: um advogado com dez anos de serviço vai abandonar a posição de advogado para concorrer a uma conservatória de 3.ª classe ou a um cartório de notário de 3.ª classe?
Isto quer dizer, Sr. Presidente, que, a ser aceite essa proposta de alteração, se havia de ser conduzido a que amanhã, porventura, teríamos nos lugares de notário de 3.ª classe e nas conservatórias advogados que, com dez anos de serviço, não conseguiram triunfar, isto é, advogados que, assim como não triunfaram na advocacia, não triunfariam talvez também nos concursos para as funções de conservadores ou notários.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Esta ordem de considerações, Sr. Presidente, é que me conduz a entender que realmente não é de aceitar a proposta de alteração apresentada pelo Sr. Deputado Paulo Cancela de Abreu.

Vozes: - Muito bem, muito bem!