20 DE DEZEMBRO DE 1951 83
negar ou contrariar os princípios por ele próprio brilhantemente expressos nos pareceres de que foram objecto os diplomas legislativos sobre os quais foi possível organizar e estruturar os organismos primários da agricultura, ou seja os grémios da, lavoura.
Verifica-se, «porém, no parecer em referencia que a Câmara Corporativa entendeu dever considerar a proposta de lei como menos conforme com a ortodoxia da, doutrina básica do Estado, e ter-se-ia deixado influenciar por representações a ela dirigidas por certas indústrias receosas de que o fim do condicionamento lhes viesse retirar o proteccionismo injusto de que tem gozado, usado e abusado, com evidente e lamentável prejuízo para os produtores da matéria-prima.
(Contra tal preocupação apenas se pronunciou o Digno Procurador Dr. Afonso Rodrigues Queiró, mas foi vencido, não obstante a lógica da argumentação usada na sua corajosa declaração de voto.
E assim, dando plena satisfação «às representações enviadas por numerosos industriais, mas negando-a em absoluto àquelas que foram dirigidas, por grémios da lavoura, a Câmara Corporativa deliberou eliminar, «pura e simplesmente, do teor da base VI a possibilidade, única, aliás, concedida pela proposta do Governo, que à lavoura, era dada de satisfatoriamente defender a economia dos seus produtos e o justo rendimento do seu trabalho, sem dependência do mais que discutível direito arrogado agora por industriais que apenas têm conseguido viver e prosperar à custa de um proteccionismo unilateral e contrário aos mais elementares direitos da produção agrícola.
Dentro deste critério, e patenteando receios, ou escrúpulos, quanto a nós inteiramente descabidos, inoportunos e inaceitáveis, propôs a eliminação de os lavradores associados puderem preparar e transformar os seus próprios produtos, forçando-os a seguir apenas dois caminhos: deixar de produzir por lhes ser vedado valorizar a matéria-prima, por forma a compensar satisfatoriamente o seu trabalho, ou produzido prejuízo e unicamente para maior proveito industrial.
Patenteia a Câmara Corporativa o receio de que os lavradores associados possam vir trazer «grande perturbação» em vários, sectores já ordenados, e tal receio leva-a a preconizar a exclusão, única possibilidade que a lavoura teria de ordenar também o seu sector, sem dependências incómodas e prejudiciais de estranhos, ou até de inimigos declarados.
Não pode o lavrador, por nós legitimamente representado, Sr. Ministro, aceitar sem mais veemente protesto o principio individualista, antigregário, anticorporativo, contrário à própria doutrina cristã e aos mais elementares direitos da solidariedade humana, defendido e preconizado pela Câmara Corporativa por forma tão estranha e inconcebível.
O Governo, estamos disso inteiramente convencidos, repudiará semelhante doutrina, e não pode, é evidente, ir negar à lavoura portuguesa o direito que mundialmente é reconhecido ao agricultor de todas as nações civilizadas, direito esse que os estados não só aceitam como preconizam, acarinham e apoiam pelas mais variadas formas.
Não podemos aceitar nem conceber que tal suceda, pois seria o mesmo que negar à vitima - neste caso o lavrador - o mais elementar direito da legítima defesa.
E o Governo do Estado Novo, que nos habituámos a considerar como entidade incapaz de praticar iniquidades, não poderá deixar de, neste caso, atender à solicitação instante que vimos fazer a um dos mais ilustres membros.
Certos de que assim sucederá, mantendo-se para a base VI do diploma a publicar a redacção proposta pelo Governo, aproveitamos a oportunidade para oferecer a V. Ex.ª a solidariedade de toda a lavoura portuguesa, aqui legìtimamente representada pelos seus grémios.
Porto, 28 de junho de 1951 - Pelos Grémios da Lavoura dos distritos do Porto, Braga, Viana do Castelo, Aveiro, Coimbra e Leiria, Augusto da Silva Maia.
O Sr. Presidente: - Estão na Mesa os elementos solicitados pelo Sr. Deputado Pinto Barriga à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, os quais vão ser entregues àquele Sr. Deputado.
Foram recebidos na Mesa, enviados pela Presidência da Concelho, em cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, os n.ºs 259 e 261 do Diário do Governo, de 13 e 15 do corrente, que inserem os Decretos-Leis n.ºs 38:558 e 38:560.
Está na Mesa o original da proposta de lei sobre a reorganização militar.
Também se encontra na Mesa o texto da Comissão de Legislação e Redacção sobre a proposta da Lei de Meios para 1952, e que amanhã será submetido à aprovação da Assembleia.
Pausa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Cândido.
O Sr. Armando Cândido: Sr. Presidente: pedi hoje a palavra por causa de um assunto que se pode tornar muito grave.
Toda a gente que conhece o Vale das Furnas, na ilha de S. Miguel, considera essa estância termal como uma das raras e grandes maravilhas da Natureza.
Não é só o chão que guarda o mistério do fogo, é a lava que respinga da forja, a vegetação que não faz caso do braseiro, a lagoa idílica, a montanha húmida fecha em redondo, o pitoresco forte da paisagem e esse ar de estranho poder e de mágica doçura que nos prende a qualquer coisa de inédito e de indefinível.
É tudo isto, mais o valor das águas mineromedicinais.
Lá existe - escreveu Roldan y Pego, director-geral de Minas e Serviços Geológicos, no perfácio de Portugal Hidrológico e Climático - a mais extraordinária região hidrológica de toda a Europa, tanto pela abundância e variedade das águas hipertermais, como pelas relações evidentes que esses águas apresentam com o vulcanismo ainda incomopletamente extinto.
Furnas, lição viva de hidrologia!
Foi assim que o Dr. Justin Besançon, professor da Faculdade de Medicina de Paris e chefe de clínica e do laboratório de hidrologia e climatologia da mesma Faculdade, começou a descrever as impressões da sua visita ao Vale das Furnas, em 1930. Traduzo mais algumas passagens do seu depoimento:
Tudo o que os livros da hidrologia ensinam sobre as fontes medicinais de origem plutónica se encontra ali, como para mais luminosa das demonstrações.
Não será para admirar que as destilações profundas da crosta terrestre possam fornecer nascentes, umas em ebulição, outras frias, ora oligometálicas, ora carregadas de elementos dissolvidos? Para se compreender um tal fenómeno nenhuma explicação teórica pode forçar a convicção tão vigorosamente como o espectáculo do Vale das Furnas, onde jorram, a pouca distância umas das outras, as nascentes mais variadas.
As possibilidades terapêuticas de um tal centro hidrológico são, sem dúvida nenhuma, ilimitadas. As curas termais sucessivas ou combinadas podem dàr-se, utilizando as nascentes mais diversas, sem a menor deslocação do doente.