16 DE JANEIRO DE 1952 177
especiais para situações especialíssimas e as deixou regular pelas disposições que presidem à aposentação normal dos funcionários.
O termo que empreguei «afalcoar» não é um neologismo, como por erro tipográfico parece ao ler o Diário das Sessões n.º 117, mas sim um revelho verbo de sabor regionalista. Sinto pelos elementos que citei que fui injusto com a burocracia dessa instituição e orgulhosamente me servirei das palavras que o meu saudoso pai pronunciou nesta Casa: «Fazer justiça eleva e engrandece a consciência e fá-la pairar muito acima de um apequenado e mal-entendido amor próprio».
Folgo, portanto, por prestar as minhas homenagens a uma administração que tem a presidi-la um homem cujo desinteresse material, a probidade e o inteligente tacto de organização honram o nome que herdou e a quem tanto deve o direito civil português. Rejubilo-me de generalizar esse testemunho de consideração aos seus coadministradores e a todo o restante pessoal, que "trabalha com zelo -inexcedível, embora desfalcado no seu número por uma aplicação irreflectida da lei-travão, que deveria apenas ajustar-se aos quadros pletóricos, e não a serviços económicos como este.
A comparação que marquei entre a participação dos lucros do Estado e o termo médio do rendimento do quinquénio da carteira de títulos foi uma crítica puramente caricatural, que não está nos meus hábitos políticos, mas que resultou da exacerbação que me produziu uma suposta negligência na aposentação dos reintegrados. Agora, calmamente, digo: o problema tem de ser encarado não restritamente neste aspecto comparativo, mas em relação aos lucros gerais e à necessidade de fazer face às perdas resultantes da desvalorização dos títulos publicos. O exame deste assunto só pode ser feito .oportunamente na discussão das contas públicas; mas desde já afirmo: quaisquer que sejam as minhas divergências, elas nem de perto nem de longo afrontam o zelo e a competência da Administração e do seu pessoal.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem !
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Duarte Silva: - Sr. Presidente: não sei se valerá a pena, voltar mais uma vez a tomar à Assembleia alguns minutos do seu precioso tempo para me ocupar de assuntos que já foram objecto de várias intervenções minhas, as quais, todavia, mais não lograram do que calorosas palavras de apoio .da imprensa cabo-verdiana e algumas cartas de felicitações a mini dirigidos por pessoas que se interessam pelas coisas de Cabo Verde.
Seja como for, :Sr. Presidente, admitindo mesmo que deste novo apelo nada de útil venha a resultar para Cabo Verde, julgo do meu .dever insistir em solicitar a atenção do Governo para dois problemas de interesse vital para aquela província ultramarina e que demandam solução urgente: o apetrechamento do Porto Grande de S. Vicente e as comunicações marítimas entre as diversas ilhas.
Creio ter já, nas minhas anteriores intervenções, demonstrado suficientemente a necessidade de valorizara Porto Grande. Não vou, .pois, reproduzir as razões apresentadas, o que seria fastidioso e, porventura, inútil. Mas, já que elas se mostraram inoperantes, vou procurar acrescentar-lhes alguma coisa de novo e reforçar as minhas afirmações com argumentos alheios.
Para mim. a maravilhosa posição fio Porto Grande. no meio do Atlântico, no cruzamento de linhas importantes de navegação que ligam as Américas à Europa e à África, e a sua relativa proximidade de países fornecedores de óleos combustíveis claramente ò indicam
para dele se fazer não apenas um grande porto de reabastecimento, o que, com boa orientação, já seria muito,, mas um verdadeiro centro de distribuição, onde as mercadorias destinadas a outros portos, sem ligação com os países de origem, seriam armazenadas para serem reembarcadas na primeira oportunidade. Isso justificaria, a meu ver, a construção de grandes armazéns e o estabelecimento de um regime de franquia aduaneira permitindo que tais mercadorias não fossem oneradas com mais despulas do que aquelas que resultassem da descarga e do reembarque e unia pequena taxa de armazenagem.
Admito, todavia, que isto seja um sonho. E compreendo, |por isso, que se não perca tempo a avaliar, por alto que seja, as obras de vulto que a minha imaginação de visionário requeria.
O que, porém, não compreendo, Sr. Presidente, é que numa torra geralmente conhecida como pobre, sujeita a crises que periodicamente flagelam a sua população, perturbam a sua economia e lhe arruinam as finanças, se menospreza um valor real, uma riqueza incontestável, como é o porto de S. Vicente.
Não será um crime, Sr. Presidente, deixar aviltar-se. e porventura perder-se, a melhor riqueza que a província conta?
Não sou eu apenas quem o diz.
Do relatório que precede o projecto do orçamento de Cabo Verde para o corrente ano transcrevo as seguintes palavras do chefe dos serviços de Fazenda, ao que tenho ouvido, um dos mais distintos funcionários de Fazenda do ultramar:
A interpretação deste quadro, no que concerne às duas primeiras rubricas, conduz à paradoxal conclusão de que se está processando o retorno à. normalidade agrícola, confinando-se a acepção do termo «normalidade» à acanhada mediania de que as ilhas não têm conseguido emancipar-se. Registamos apenas a nossa convicção de, ser o Porto Grande de S. Vicente a maior garantia da estabilidade do equilíbrio orçamental de Cabo Verde, pelo que se impõe transformá-lo numa rica fonte de receitas vitalizadoras.
Pois, Sr. Presidente, é essa garantia da estabilidade do equilíbrio orçamental que está em perigo. É essa possível fonte de receitas vitalizadoras que estamos em risco de perder.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - O nosso porto, de excepcionais condições naturais, vê dia a dia decair a sua importância. Enquanto os governos estrangeiros valorizam os seus portos, que vêem aumentado o respectivo tráfego, em grande parte à custa do Porto Grande, nós continuamos adormecidos, numa apatia que, repito, chega a ser criminosa.
Bem sei que o apetrechamento de, um porto exige o dispêndio de quantia considerável . Mas que é isso pais um país que tem realizado obras de muito maior vulto, que tem construído portos de importância menos evidente e até mesmo em Cabo Verde tem gasto, em obras de utilidade duvidosa, quantias que melhor seriam aplicadas se se destinassem ao apetrechamento do porto
Pelo seu custo elevado, tem-se tido receio de encarar o apetrechamento do porto, mas vão-se gastando em trabalhos, de emergência a quantias que afinal acabam por ultrapassar o que era necessário para tão produtivo emprego.
Cada dia que passa representa uma perda considerável, pois os portos concorrestes vão firmando as suas pó-