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770 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 155

iniciativa privada não poderá ser de outra forma. Se assim não fosse, teríamos economias arregimentadas de produtores funcionários.
Ha, porém, obras de fomento de utilidade geral, que compete ao Estado realizar, ou, pelo menos, colaborar na sua realização. É quanto a estas que se põe a questão do financiamento. Tratando-se de regiões ainda no período inicial da sua formação, e, portanto, na fase de 1.º estabelecimento, não poderá contar-se com grandes sobras dos particulares para financiar as obras públicas.
Entendo, por isso, que os capitais destinados às obras de fomento deverão vir principalmente de fora e, naquela medida fiscalmente justa e económicamente conveniente ou possível em que o imposto poderá facultar receitas extraordinárias, deverão elas ser colhidas sobre os lucros efectivamente -realizados, e não sobre lucros presumíveis, que muitas vezes se não realizam, provocando as mais iníquas desigualdades e atrofiando a iniciativa privada, declarada incompetente para a administração sem tutela da riqueza que produz. A excelência da administração privada reconhece-a, talvez sem querer, o legislador quando acentua a «excepcional prosperidade» das províncias ultramarinas, a não ser que ele a considere obra do acaso e que tudo o que existe em África é pura ilusão.
O decreto contém erros e imprecisões formais, que o tornam de difícil execução. Ao pretender basear a sobrevalorização na comparação das cotações de 1949 das Bolsas de Londres e Nova Iorque com as do período em que a exportação se efectiva desconhece que não existem naquelas praças bolsas que transaccionem a maior parte dos nossos produtos ultramarinos. Com efeito, não há em Nova Iorque bolsas onde se vendam sementes de algodão, copra, sisal, castanhas de caju ou manganês. Em Londres sucede o mesmo com grande número de produtos.
Noutros casos as bolsas estiveram encerradas em 1949, como se deu com a bolsa de cacau de Londres, por exemplo.

O Sr. Botelho Moniz: - E lá os preços são quase meramente teóricos.

O Orador: - São os preços-base, não são os preços reais.
Deve ter-se tomado a nuvem por Juno e confundido mercados com bolsas. Naqueles as cotações não têm carácter oficial. Passam de boca em boca e são conhecidas por transmissão oral entre o trads.
Não será possível, nos termos do decreto, fazer o confronto de muitos produtos nele previstos ou de outros a que o decreto não se refere especificadamente.
Diz também a lei que a sobrevalorização será determinada periodicamente, sem indicar quais os períodos ou datas a que se refere. Serão períodos semanais, mensais, trimestrais ou anuais? Será referida à data da venda ou à data do embarque? A alfândega fará a liquidação na base da sobrevalorização determinada para o período imediatamente anterior ao embarque ou será na altura do embarque feita uma liquidação provisória enquanto se não apura a sobrevalorização respeitante ao período em curso? Gomo poderão efectuar-se vendas a prazo se não pode prever-se qual a sobretaxa que estará em vigor no período em que o embarque tiver de realizar-se? E, no entanto, o escoamento normal das colheitas terá de ser escalonado durante o ano por vendas antecipadas nas ocasiões apropriadas. Se elas se não puderem efectuar nas oportunidades próprias, colocaremos os produtores na contingência de verem acumular-se os produtos nas fazendas na época das colheitas sem possibilidades de escoamento imediato ou a preços
convenientes, reduzindo o volume e protelando a entrada de divisas no País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O Decreto n.º 38:405, relativo às sobrevalorizações na metrópole, não pode servir como antecedente, pois a base da tributação é inteiramente diferente.
Trata-se na metrópole de verdadeiros direitos de exportação, cuja liquidação é feita nuns casos pela aplicação de sobretaxas- específicas e noutros de sobretaxas ad valorem, todas elas referidas a unidades de peso ou volume ou a preços absolutos, e não a diferenças de cotações. Assim, cada província escolherá o período e, portanto, a base de incidência que lhe convier e poderá alterá-lo ad libitum, provocando não só desigualdades fiscais internas, como desigualdades entre os produtores do mesmo género nas diferentes províncias.
Será mais uma vez quebrada a unidade nacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O decreto tem graves vícios orgânicos, que o tornam inexequível dentro da justiça fiscal e da conveniência económica. Visiona tributar sobrelucros e acaba afinal por tributar actividades que não só nenhuns sobrelucros têm, e é o caso dos produtores de cacau, e de copra, como ainda estão muito longe de ter recuperado a posição perdida.
Tomando mais pesada do que já é a fiscalidade no ultramar, agrava, em vez de atenuar, a desigualdade existente entre certas (provinciais e a metrópole, contrariando os novos investimentos em África e colocando o ultramar numa terrível e perigosa posição em face de regiões produtoras concorrentes.
Enquanto o café paga em Angola 14 por cento e passaria a pagar aos preços actuais cerca de 40 por cento na exportação, incluindo direitos, sobrevalorização e contribuição para o capital de fomento, no Brasil ele é apenas tributado em 3 por cento de imposto de vendas.
O decreto estabelece a chamada sobrevalorização em bases que, na maioria dos casos, se não verificam, pela inexistência em Londres e Nova Iorque dos organismos a que se refere.
O decreto ressuscita os condenados impostos de exportação e, penalizando os sobrelucros, não institui equivalente compensação para os sublucros quando eles ocorram, como ocorreram no passado, com mais frequência do que os sobrelucros e hão-de no futuro voltar a dar-se.
O decreto, pelas suas repercussões económicas, tão fundas e tão variadas, não realiza os propósitos que pretende atingir, cria o clima contrário às próprias intenções e, alterando profundamente a feição da conjuntura africana, faz nascer nos espíritos a dúvida que quebra os entusiasmos e assusta a iniciativa, tão afoita em correr riscos quando eles vêm da Natureza, mas tão tímida quando é chamada a sofrê-los contra a ordem natural das coisas.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Em conclusão:
Dizia eu no meu anterior discurso que o decreto continha em si o mesmo germe da própria destruição. Com efeito, ou ele se aplica à risca e desanima os colonos e os capitais e não há povoamento nem fomento privado, ou se não aplica à risca e não há receitas e, portanto, não há fundos para custear o povoamento e o fomento, que o Estado tomou a seu cargo. Não serve para ninguém