1038 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 167
em cada um dos projectos de colonizarão ornamentados posteriormente ao ano de 1940; e mais do número de projectos de colonização elaborados, datas de conclusão dos mesmos e número de famílias a instalar segundo cada um deles».
O Sr. Manuel Domingues Basto: - Sr. Presidente: é sobre mais uma praga, que em regiões de pequena lavoura assume proporções de verdadeira calamidade, que desejo chamar hoje a atenção desta Câmara e, através dela, a atenção do Governo, especialmente dos Srs. Ministro da Economia e Subsecretário de Estado de Agricultura.
Talvez o problema focado nesta intervenção se afigure a alguém de pequena monta, de menos importância, insignificante pormenor, sem relevo económico nem projecção social que justifiquem se dê ao assunto a honra do o trazer a esta Câmara.
Se assim fora, eu esqueceria lamentavelmente o adágio latino De minimis non curat proetor e não mereceria que VV. Ex.ªs. Sr. Presidente e Srs. Deputados, me dispensassem alguns minutos de atenção. Mas, porque assim não é e como, para estudar bem e resolver com justiça qualquer caso, assunto ou problema, é preciso vê-lo no quadro em que ele se encontra e dentro das realidades em que se situa, a praga e calamidade de que me proponho tratar, porque é uma injustiça e violência à lavoura de qualquer região, assume no Minho, província de pequena propriedade, aspectos de completa ruína da modesta economia agrária regional.
Em Monção, terra da minha naturalidade, de que há muito me encontro ausente por força dos deveres do meu ministério e apostolado sacerdotal, foi há tempos arrastado aos tribunais um lavrador porque dentro das suas propriedades matou à cacetada um coelho que lhe estragava e roía os mimos da horta, parte indispensável e para ele muito importante do seu ganha pão.
Era tempo de defeso, em que a caça é proibida, e por isso o lavrador tinha, em homenagem à volúpia dos caçadores e ao prazer de lhes proporcionar caça em abundância, de deixar roer e estragar pêlos coelhos as suas culturas hortenses, realizadas com muito amor e resultado de muitas canseiras.
Defende-se o agricultor do míldio pelo sulfato, do oídio com o enxofre, gasta dinheiro no combate ao escaravelho da batata, mas as uvas, as frutas, os morangos, as ameixas e os mimos da horta tem de resignar-se a vê-los destruir ou danificar pelas aves daninhas de toda a espécie ou pelos coelhos que lhe invadem as culturas hortenses, pois não lhe é lícito exterminar tais inimigos do fruto do seu labor e das suas canseiras.
Louvavelmente anda a Junta Nacional das Frutas a fornecer indicações aos lavradores para que nas várias regiões do País se intensifique a cultura da fruta e daquelas variedades mais produtivas em cada região e que adaptando-se melhor ao clima e à natureza do terreno, assegurem maior colheita e melhor resultado económico da cultura de árvores de fruto.
Mas para quê todo esse esforço, se o lavrador tem de resignar-se a ver inutilizado todo o seu trabalho por aves e animais daninhos e até arriscado a ir parar à cadeia se, num legítimo direito de defesa, os abate a tiro ou lhe prepara armadilhas para impedir a sua acção destruidora e maléfica?
Pode o lavrador matar as galinhas e os coelhos mansos do vizinho quando umas e outros lhe entram na propriedade; pode entregar à prisão o ladrão que lhe rouba as colheitas, mas no tempo de defeso estipulado pelas comissões venatórias não tem defesa nem qualquer direito de defesa contra aves ou animais que possam ser de qualquer forma objecto das excursões venatórias dos caçadores.
Estes os factos e a situação em que nos encontramos que, como fàcilmente se vê, não estão certos e são de uma injustiça flagrante.
Há possibilidade e maneira de harmonizar os incontestáveis direitos da propriedade com os prazeres da caça e a satisfação dos caçadores de encontrarem vales e montados em que exercitar o seu desporto favorito, mas não há direito de sacrificar as culturas e de estragar as colheitas, numa preferência à caça, que, para exercer-se à larga, não carece de fazer-se de uma maneira afrontosa e vexatória para os agricultores.
O Sr. Melo Machado: - Porque uma coisa é essencial e outra é divertimento.
O Orador: - São causas deste estado de coisas, verdadeiramente anárquico e injusto, a lei, que, por anacrónica, precisa de ser actualizada, e a forma como nas aldeias se exerce a fiscalização e o policiamento, quase sempre de costas voltadas aos legítimos interesses da lavoura e às justas reclamações dos lavradores.
Este último aspecto da questão é ilustrado pelo contraste no procedimento das entidades a cargo de quem se encontra o policiamento das aldeias. Tais agentes da autoridade são prontos em multar o agricultor que, por um justificável esquecimento, deixou em casa a licença de trânsito do seu carro de trabalho e vêem de olhos complacentes a invasão das hortas e culturas hortenses estragadas pêlos cães e pelas botas dos caçadores.
O Sr. Marques Teixeira: - É também lamentável que muitos caçadores façam o derrube dispensável de muros de vedação.
O Orador: - Vou já tratar do assunto.
O mesmo injusto critério leva-me a não dar importância ao facto de os caçadores, para apanhar um coelho, arrasarem uma parede que servia de vedação ligeira à propriedade, em a deixarem com as suas culturas à mercê de ser invadida por toda a espécie de animais.
Não permite o Estado o exercício da caça nas suas propriedades, e nem mesmo nos montados entregues ao regime florestal, sem licença dos respectivos serviços. Porque há-de tratar-se de maneira diferente o lavrador nos seus direitos de propriedade ? Está bem que a caça seja permitida nos montados, nas bouças e nas terras abertas, embora pertencentes a particulares, em épocas em que a caça não prejudique as culturas.
Deixemo-nos, porém, de abusos e exageros em favor dum desporto, contra a necessidade e o dever de produzir mais e a obrigação de respeitar o que se produz e redunda em melhoria económica de todos os portugueses.
Contra o que se passa, o não passa de abuso, já o Grémio da Lavoura de Monção apresentou ao ilustre Subsecretário de Estado da Agricultura, Sr. Eng. Vitória Pires, a sua justa reclamação. Deste lugar e nesta Câmara a secundo e apoio, rogando aos Poderes Públicos que não seja mais «uma voz que clama no deserto».
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: comecei por citar o aforismo latino: De minimis non curat proetar. A quem se encontra bem instalado na vida talvez pareçam coisa insignificante estes pequenos casos da vida dos rurais portugueses, e a que, por pequenos, não deve o pretor, ou seja o governante, dar atenção, ele, que está tão absorvido com os grandes casos da política geral. Mas, para quem é pequeno e pobre, todos os pequenos casos são coisas sérias e graves, porque é devido aos muitos pequenos danos que vai sofrendo em cada dia que a