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23 DE JANEIRO DE 1953 509

Depois, se a sua efectividade nos abre os braços e nos toca, enraíza-se a amizade. E esta (é da sua essência) não vê sombras. Discípulo, há trinta e tal anos, do Prof. Fezas Vital, os acasos da vida pública levaram-me a trabalhar sob a sua digníssima presidência no Conselho Permanente da Acção Educativa e na Junta de Educação Nacional.
Não já propriamente outros acasos, mas coincidência de doutrinas aceites e vividas e de anseios iguais, fizeram que eu mais de perto e com maior frequência tivesse a oportunidade de um mais estreito convívio. E parece-me que não vejo sombras que empalideçam a personalidade intelectual e moral do saudoso mestre. Numa prolongada e progressiva marcha para a morte, não lhe faltou a resignação no duro sofrimento, olhos postos na Cruz do Salvador; a luz da mais profunda Fé cristã iluminou sempre o seu magnânimo espírito. São longos os caminhos de Deus e limitada a nossa vida terrena, que só é verdadeiramente grande na peregrinação deste vale de lágrimas para a Eternidade. Pois ele viveu essa vida terrena como cristão, num exemplo edificante que constitui unia grande lição. Dois altos sentimentos o dominaram sempre: a fé na Omnipotência e na Misericórdia Divinas e o .entranhado amor pela salvação e continuidade da Pátria.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Fiel a três grandes verdades para ele, para mim e para tão grande número de portugueses - Deus, a Pátria e o Rei -, viveu e morreu como homem de uma só fé. Cristão e católico, foi fiel a um imperativo eterno; monárquico, foi exemplo de fidelidade à tradição e à, grandeza e perenidade da Pátria!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Honrado com o nobilitante encargo de lugar-tenente de S. Alteza Real o Sr. Duque de Bragança, cumpriu, conforme o seu conceito de acção, as imposições de tão alto cometimento. Tinha a preocupação constante das suas responsabilidades, procurando conciliá-las com os interesses nacionais que a Revolução do 28 de Maio em boa hora tomara em suas mãos. Jamais submeteu ao acidental e transitório o essencial e permanente; mantendo-se fiel ao princípio de evolução natural da acção política, em vez de se perder nas encruzilhadas da História e se envolver nas arriscadas aventuras das soluções incompletas e dos hibridismos condenáveis e, tantas vezes, estéreis e fatais.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Por patriotismo - assim o entendia e proclamava-, e sempre atento às possibilidades políticas do momento, nunca deixou de subordinar a sua acção ao que sempre entendeu ser o interesse nacional.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não é o momento ainda de serenamente ajuizar da sua acção política. Mas uma conclusão se impõe desde já, justa e necessária: foi persistente e leal na condução dessa acção política. E morreu com a mesma fé com que viveu. Por ela se alistou entre os da Galiza, debaixo das ordens de um grande capitão, sem olhar ao sacrifício de um futuro que o alto quilate da sua inteligência lhe augurava, nem ao temor da morte que anda sempre a rondar os cavaleiros de um ideal. Ajudou a manter o fogo vivo da tradição portuguesa e deu um magnífico exemplo de fidelidade, virtude sem a qual a acção não pode enobrecer-se aos olhos dos coetâneos e da posteridade.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: todos os que, embora por caminhos diferentes, anseiam por uma verdadeira unidade nacional, garantia da grandeza e da continuidade da Pátria, por certo não regateiam a sua concordância com as pálidas palavras que acabo de proferir em homenagem a quem por sua vida, se mostrou digno de as merecer.
Não lhe faltou a virtude de ter morrido pobre, numa época em que, infelizmente, não é difícil enriquecer quando o prestígio do nome e as qualidades de inteligência se não confinem às limitações de um carácter íntegro e de uma moral austera. Ele constituiu, acima de tudo, um exemplo de fidelidade aos princípios nas boas como nas más horas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Na pedra que há-de cobrir o seu túmulo, onde hão-de cair as lágrimas de uma numerosa família carinhosamente dedicada e de muitos amigos que lhes juntarão as suas de sentida saudade, poderiam, sem desmerecimento, inscrever-se aquelas admiráveis palavras que o grande jurista e são doutrinador José Acúrsio das Neves lançou nas Cartas de um Português aos seus Concidadãos: a Haveis de conhecer-me porque sempre me achei convosco, tanto nos tempos de crise, como nos de bonança».
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Sr. Presidente: não quero deixar passar este momento sem dizer uma palavra de piedade sobre a morte do Doutor Fezas Vital.
A emoção foi tão forte que eu não pude pensar, um momento, em alinhar o turbilhão que me bate o peito para referir o que foi essa forte personalidade. Ela foi marcada, a traços vivos, no discurso do Sr. Dr. Carlos Moreira.
Eu não tenho nada que corrigir; se tenho alguma coisa a acrescentar, esse alguma coisa não me ocorre neste momento.
Entendi, não obstante, que não devia deixar de dizer uma palavra, eu que fui seu colega na Universidade de Coimbra e que lhe sucedi na presidência da Junta Nacional da Educação.
Tive sempre por esse homem a admiração que se tem por um carácter forte, a admiração que se deve a uma ordem que, como notava há pouco o Sr. Dr. Carlos Moreira, pôs diante dos olhos muito cedo um ideal e se manteve através da vida sempre fiel ao mesmo ideal.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não quero referir neste momento os seus ideais políticos; quero aludir ao ideal que é a expressão da sua concepção da vida.
Para quem trabalhou com ele, como eu, sabe que esse domínio era para ele, e, ai de nós, porque tem de ser para todos o domínio da fé, e esse homem que era, ao tomar uma decisão no terreno dos problemas científicos, um hesitante, era no terreno dos problemas da fé um definitivo.
É daí que vem o respeito que sempre teve pelas posições diferentes da sua que os outros tomavam.