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20 DE MARÇO DE 1953 935

sagradas à sua memória nesta Casa, em que tantas vezes se fez ouvir com brilho e convicção a sua oratória de parlamentar de vastos recursos e grande prestígio.
É difícil encontrar quem tenha reunido tantos predicados pessoais e os tenha afirmado, não só em tão variados meios e actividades, mas também em tão longa e prestimosa folha de serviços ao País e a diversas instituições nacionais.
As suas qualidades e a duração da sua existência, numa actividade que manteve até às últimas horas que teve de vida, fizeram-no uma figura representativa de três épocas distintas da história política, intelectual o social do Portugal contemporâneo, mantendo, aliás, através dessas três épocas as características fortes do uma personalidade inconfundível e de grande poder de irradiação.
Possuindo uma adaptabilidade que fazia contraste com o imobilismo desdenhoso, anquilosado e estéril de muitos, nunca ultrapassou os limites desejáveis e legítimos, nunca abdicou dessa personalidade, do seu modo de ser, das suas normas, dos seus princípios, da sua lhaneza, das suas amizades, da sua fé.
Houve assim unidade, continuidade perfeita, na longa e multiforme actividade que desenvolveu em épocas tão diversas, no ensino, na vida clinica, na tribuna parlamentar, nas academias, sociedades e congressos científicos, nas suas múltiplas relações sociais.
Poucas individualidades terão sido tão representativas de épocas, meios e actividades tão diversos e, simultaneamente, sempre tão iguais a si próprios, de tamanha coerência e invariabilidade de atitudes e de princípios.
A sua expressão, a sua cabeça, a sua própria figura física mantiveram sempre, até final, a irradiante simpatia, o vigor robusto e até um certo ar de romantismo que imprimia atracção e colorido ao seu labor de médico, de professor, do escritor, do orador, de académico, de homem público.
Sem pretender traçar neste lugar e neste momento uma biografia de Moreira Júnior, não quero deixar de assinalar os seus méritos de clínico e de professor de Obstetrícia - ainda há meses presidiu, com brilho, ao Congresso Luso-Espanhol de Obstetrícia, que se realizou no Porto -, a vivacidade da sua acção parlamentar - além de leader respeitado e prestigioso do partido progressista no antigo Parlamento monárquico, fez neste brilhantes discursos políticos -, as suas actividades meritórias, no ponto de vista cultural e nacional, na Academia das Ciências e na Sociedade de Geografia de Lisboa, cujas presidências ocupou com elevação e onde prestou grandes serviços, como na Sociedade de Ciências Médicas e noutras importantes agremiações culturais o empresas económicas.
Mas porei sobretudo em relevo actos governativos que realizou como Ministro, alguns dos quais tiveram os mais importantes efeitos e traduziram a sua rasgada e patriótica visão de estadista.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Refiro-me especialmente às suas iniciativas para combater as dolorosas crises do Cabo Verde, à fundação da Escola Superior Colonial - providência de alto alcance para o progresso da nossa administração e cultura ultramarinas - e às importantes medidas de fomento, como a construção do caminho de ferro de Moçâmedes à Cheia.
Sobre a Escola Superior Colonial repetirei que, depois do ensino das primeiras letras e do da defesa da saúde do corpo e da alma, não creio que haja outro mais estrutural e imperativamente nacional.
É modelar e documentado o relatório ministerial do Prof. Moreira Júnior sobre administração ultramarina publicado em 1905, com as propostas de lei que apresentou à Câmara dos Deputados sobre navegação para as colónias, cabos submarinos, ensino, serviços agronómicos, algodão e açúcar coloniais, caminhos de ferro em S. Tomé, Angola e Moçambique, matas da índia, etc.
O Prof. Moreira Júnior conservou até morrer o seu dinamismo, a sua tenacidade, a sua eloquência espontânea e exuberante, a multiplicidade das suas faculdades, os dons primorosos da sua afectividade.
Nos seus alunos, nos seus colegas, nos seus doentes, em todos os que com ele conviviam ou que recebiam a influência benéfica das suas qualidades de alma, ganhava simpatias, amizades e gratidões. Mas ele sabia ser, como poucos, amigo leal, dedicado e carinhoso.
Não esquecerei jamais a gentileza do seu trato e da sua amizade, o carinho com que até há poucos dias acompanhou o meu exercício do cargo em que tive a honra de lhe suceder na Sociedade de Geografia de Lisboa.
Desejo evocar, sobretudo, a amizade dedicada e leal que ligou o Prof. Moreira Júnior ao estadista da Monarquia conselheiro José Luciano de Castro, cujo elogio traçou, como os de Sousa Martins, Curry Cabral, Fernando de Magalhães e outras individualidades ilustres.
Ainda conheci pessoalmente - era eu um rapaz -, na sua casa de Anadia, o conselheiro José Luciano. Conservei de algumas visitas ali feitas em companhia de meu pai a recordação grata de uma figura de trato encantador, de grande brilho intelectual e de excelentes intenções, mesmo de simpática bonomia, que a doença e os ataques políticos não abalavam.
Senti que havia muita injustiça e uma malevolência feroz e inexplicável naqueles ataques e no ambiente hostil que se procurou estabelecer perduravelmente em torno de José Luciano. Pois o Prof. Moreira Júnior foi amigo verdadeiro daquele estadista, e manteve-se fiel a essa dedicação, com a firmeza, que resiste, não apenas à queda do poder político, mas até ao apartamento definitivo pela morte.
Sr. Presidente: com o falecimento do Prof. Moreira Júnior desaparece alguém que teve um lugar de relevo inconfundível na vida de Lisboa e do País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mas, com ele, como que descem à frialdade, ao silêncio e às trevas da sepultura algumas das últimas evocações vivas, nele personificadas, de Lisboa de três quartos de século, de Portugal dos últimos decénios da Monarquia, duma notável geração de médicos, intelectuais e políticos que, no âmbito ideológico e social do seu tempo, serviram com dedicação e talento a sua profissão, a cultura e aspirações da sua época, e, nas difíceis condições em que viveram e lutaram, a Pátria.
Prestemos homenagem à nobre intenção, à linha de ideal, à beleza e valor de atitudes que se contam na vida profissional e política de Moreira Júnior o que, sejam quais forem os conceitos e os destinos dum mundo perplexo e ansioso, constituirão saudável e permanente exemplo de bondade, préstimo, inteligência e civismo.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.