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20 DE MARÇO DE 1953 937

Somente porque em 1939, quando a orgânica dos serviços do registo e do notariado era completamente diferente do que é hoje, apareciam no Ministério da Justiça queixas contra recusas injustificadas por parte dos funcionários, provenientes muitas delas de circunstâncias que abonavam pouco a acção disciplinar sobre eles exercida, pois até a ganância na cobrança de emolumentos se apontava como causa de ilegítimas recusas.
Mas deve acrescentar-se que nem o ilustre autor do relatório citado generalizava, nem em consciência tal generalização seria possível, sob pena de se atingir injustificadamente a quase totalidade dos conservadores e notários de então.
E só por consideração pelas excepções, que estavam mais nos defeitos da orgânica, se caiu em regime extremo.
Hoje tudo se passa por maneira diferente.
O Ministro da Justiça, por intermédio de uma direcção-geral cujo prestígio é indiscutível, orienta superiormente todos os serviços do registo o notariais e resolve, por meio de despachos, que obrigam os conservadores e notários, as reclamações que se suscitem na execução da lei e regulamentos que respeitam aos serviços.
Por outro lado, a Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, criada em 1945, exerce sobre os funcionários seus subordinados uma acção orientadora e disciplinar que exclui a possibilidade de se repetirem os factos que em 1939 serviram para justificar uma verdadeira sanção imposta a todos os conservadoras e notários, competentes ou incompetentes, honestos ou desonestos, e que foi a da sua condenação em custas em qualquer caso de recusa não confirmada pelos tribunais.
Perante a orgânica actual dos serviços, desacautelado seria o conservador ou o notário que em caso duvidoso não solicitasse a interpretação hierárquica, tantas vezes feita por despacho do próprio Ministro da Justiça.
Mas nem assim ficaria fora da alçada da sanção.
Ponhamos dois casos práticos para ilustrar o que acabo de dizer.
É requerido numa conservatória do registo predial determinado acto de registo, que o conservador tem dúvidas em efectuar. Consulta a Direcção-Geral, que emite o seu parecer, e o Ministro da Justiça decido por despacho no sentido de dever ser recusado o acto requerido. O conservador, aliás dentro da sua própria orientação, cumpre o despacho do Ministro e recusa o acto. A parte interessada interpõe recurso e o tribunal julga a recusa improcedente, mandando proceder ao acto.
Segundo caso: o conservador, entendendo embora que certo acto que lhe foi requerido é de efectuar, por mera cautela consulta a Direcção-Geral. O Ministro da Justiça, a cujo despacho foi submetida a consulta, determina que o acto seja recusado. A parte leva recurso da recusa e o tribunal dá-lhe razão, aliás dentro do pensamento do próprio conservador.
Em qualquer destes casos quem julgam VV. Ex.ªs que foi condenado nas custas do processo: o conservador, que recusou o acto, é certo, ou o Ministro, que determinou essa recusa?
Segundo a lei actual, o conservador!
Mas porque não manda a lei condenar também, por exemplo, o juiz que confirma a recusa de um funcionário mas que, por sua vez, viu a sua decisão revogada pelo tribunal superior?
Porque os juizes só podem ser condenados em custas quando houver dolo no seu procedimento ou quando tenham decidido contra leis expressas.

O Sr. Mário de Figueiredo:- Eu não sei se V. Ex.ª vai ou não tratar mais adiante da hipótese de o conservador não consultar, mas recusar, ou, melhor, recusar sem consultar previamente.

O Orador: - Acontece isso algumas vezes.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Para mim não se levanta a mais ligeira dúvida quando o conservador procede de harmonia com um despacho que sobre a questão foi proferido.
Mas não tenho a mesma segurança quando o conservador, espontaneamente e sem estar coberto por qualquer despacho, procede desta ou daquela maneira.

O Orador: - Neste segundo caso é lícito o conservador ou o notário fazê-lo quando entender que não necessita do parecer do Ministro para alicerçar a sua opinião. Mas desacautelado será, como disse, embora o despacho do Ministro não o liberte das custas.
Mas parece-me que nesse caso apontado por V. Ex.ª, por cuja opinião tenho a maior consideração, também o funcionário não devia ser condenado em custas, salvo nos casos de reconhecido dolo ou erro de ofício.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Por erro do ofício. Não há dúvida de que, desde que o tribunal define que a solução da lei não é aquela que deu o conservador, mas outra, ele cometeu um erro de oficio.

O Orador: - Pode não haver erro de oficio, mas apenas divergência de opinião, confirmada até por decisão de tribunal que outra instância revogue.
É este também o regime tradicional da nossa legislação, como afirmado foi. quanto aos recursos dos conservadores e notários, e a ele se deverá regressar sem demora, pois a experiência colhida durante a vigência da lei aprovada por esta Assembleia mostra-se, e julgo tê-lo demonstrado, absolutamente contrária à boa eficiência dos serviços e aos interesses dos que a elos recorrem.
A manutenção do regime actual sujeita os funcionários a um risco que os inibo de bem apreciarem os casos que são propostos à sua resolução, levando-os a "praticar actos que não deveriam praticar ou a deixar de praticar outros que deveriam praticar, ou a aceitar a posição passiva de nunca, recusar ou duvidar, como bem definiu o problema o nosso ilustre colega e antigo e distinto conservador Sr. Dr. Lima Faleiro.
São estas, Sr. Presidente, as considerações que entendi dever fazer sobre problema que se me afigura de grande importância para a boa execução do serviços de interesse público indiscutível como são os dos registos e do notariado.
Julgo que as razões da necessidade do actual regime de custas são evidentes e quaisquer outras que quisesse produzir só serviriam para tirar à Assembleia o tempo de que necessita, neste final de sessão legislativa, para a discussão de outros assuntos importantes.
Se não estivéssemos no final desta sessão permitir-me-ia enviar para a Mesa um projecto de lei visando a alteração do artigo 166.º da Lei n.º 2049, de 6 de Agosto de 1951, no sentido da alteração da última alínea, que ficaria redigida por forma a admitir-se a condenação em custas dos conservadores e notários apenas nos casos de dolo ou de erro de ofício.
Assim fica o meu voto, que estou certo será também o da Assembleia.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Está na Mesa a reposta dada pelo Governo ao aviso prévio do Sr. Deputado Elísio Pimento, que vai ser lida à Assembleia.