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20 DE MARÇO DE 1953 951

O Orador: - Mas poderá uma moradia ser tudo isto para o corpo e para a alma se for um pobre tugúrio sem ar e sem luz, sem alegria e sem encanto?
Sr. Presidente: verifica-se actualmente um facto que, pelas circunstâncias que o envolvem e pelas consequências que dele advém, não pode deixar de nos surpreender e preocupar sobremaneira.
É a fuga constante e volumosa da boa gente provinciana para os grandes meios, mormente para Lisboa. E tamanha gravidade está assumindo este facto que todos sentem a urgência de seriamente e enfrentar e dar-lhe segura e eficaz solução.
Como?
Sr. Presidente: o trabalhador dos nossos Campos não é, felizmente, muito exigente. O aconchego de uma casinha, acolhedora e cheia de sol, e uma leira de terra para a horta dos seus suores constituirão laço forte a prendê-lo ali e remédio eficaz para a tentação de fuga para os grandes e movimentados centros.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Suponho que a prova está tirada com algumas colónias agrícolas já existentes pelo País fora.
Levar até aos meios rurais a construção de casas para trabalhadores será, pois, ajudar eficazmente a resolver um problema que, pela sua acuidade, reclama atento cuidado.
Ocorre, porém, perguntar: e é só ao Estado que pertence resolver este o outros problemas que na vida surgem?
Pretender-se que seja o Estado a fazer tudo seria, parece-me, caminhar-se para um regime de perigoso socialismo que viria estancar as fontes da melhor iniciativa particular.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Decerto que o Estado tem graves e imperiosos deveres a cumprir.
Administrar os interesses tão variadamente complexos da Nação, promover por todas as formas o bem da colectividade, assistir dedicada e prontamente a quantos careçam de amparo e defesa nas suas vidas o nos seus bens, aproveitar solicitamente e fazer render ao máximo todos os valores de inteligência e de trabalho que largamente abundam nesta terra querida de Santa Maria, formar a consciência nacional na fidelidade aos princípios da caridade e da justiça, assegurar ajusta liberdade dos cidadãos dentro das normas austeras da moral, velar constantemente pela paz e segurança da vida nacional e com enérgica decisão defendê-la contra todos os inimigos de fora e de dentro, fazer enfim tudo pelo maior e melhor bem comum, tal é o laborioso e grave encargo que sobre os homens de Governo indeclinàvelmente impende.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas ao Estado não cabem só deveres. Ele tem também direitos incontestáveis e inalienáveis; e entre estos avulta o de esperar e exigir que todos os cidadãos favoravelmente instalados na vida com ele colaborem na defesa do bem colectivo e no justo esforço de socorrer e ajudar aqueles a quem as circunstâncias menos favorecem.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Socorramo-nos mais uma vez dos sábios ensinamentos do grande Pontífice que é Pio XII:

A solidariedade dos homens entre si exige, não sòmente em nome do sentimento fraterno, mas também da própria conveniência recíproca, utilizar todas as possibilidades na conservação dos empregos existentes e na criação de outros novos. Por isso, aqueles que são capazes de aplicar capitais considerem, à luz do bem comum, se poderão conciliar com a sua consciência pô-los de lado com vã cautela, deixando de fazer os devidos investimentos dentro dos limites das possibilidades económicas, nas proporções e no momento oportunos.

Sr. Presidente: é doutrina assente que a riqueza tem uma grave função social a exercer. Exerce-a? Inteiramente legítima a sua posso e administração.
Não a exerce? A riqueza deixa de ter razão de ser porque é contrária ao bem colectivo.
Há, portanto, que chamar a riqueza ao exacto cumprimento dos seus deveres. E isto é função que pertence ao Estado e que ninguém pode contestar-lhe.
Há riquezas improdutivas? Há lucros exagerados e estranha e perigosa desorientação no seu uso e aplicação, e, em lamentável consequência, corrupção de costumes, perversão da vida, estulto desvio dos rumos eternos?
Ao Estado pertence, por imperativo indeclinável da sua alta função, atender, vigilante, a este e a outros aspectos da vida social portuguesa para que não venha a acontecer-nos como a tantos outros povos, que, à força de ouro acumulado e mal utilizado, pereceram miseravelmente afogados em ondas de lama.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: o problema da habitação, como tantos outros de natureza social, terá tantas maiores facilidades de solução quanto mais exacta for a compreensão que a riqueza tiver das suas graves obrigações.
Ouçamos ainda uma vez mais a voz autorizada do Sumo Pontífice:

A questão não é nova. Já o nosso predecessor imediato, fazendo-se eco dos ensinamentos de Leão XIII, escrevia em 1931:

É necessário dar a cada um o que lhe pertence e atender às normas do bem comum e da justiça, social quanto à distribuição dos recursos deste Mundo, cujo flagrante contraste entre um punhado de ricos e uma multidão de indigentes põe claramente em nossos dias, aos olhos de qualquer homem de coração, graves desvios.

Com satisfação reconhecemos - continua Sua. Santidade - que, após algumas décadas, graças aos esforços perseverantes e aos progressos da legislação social, a diferença de condições se reduziu geralmente bastante, às vezes em proporções notáveis. Sem embargo, há ainda que deplorar o aumento intolerável dos gastos em luxo, dos gastos supérfluos e desarrazoáveis, que duramente contrastam com a miséria, de um grande número, já entre as classes proletárias das cidades e dos campos, já entre a multidão dos chamados «economicamente débeis»...

Estas graves e severas afirmações do Sumo Pontífice importam, Sr. Presidente, princípios sagrados de justiça, que, aceites e vividos lealmente, nos serão fonte magnífica de paz e de confiança no futuro.

Vozes: - Muito bem!