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1022 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 224

E não acautela porquê?

1.º Porque não só não absorve os médicos todos, como retira da clientela um volume muito grande de indivíduos;
2.º Porque não remunera condignamente o trabalho do médico, dado que é ilimitado o número de doentes por consulta;
3.º Porque não dá garantias de segurança do exercício da função;
4.º Porque permite a intromissão em assuntos técnicos de indivíduos incompetentes e irresponsáveis perante a lei;
5.º Porque não dá ao módico liberdade terapêutica absoluta.

Tudo isto é verdade. Mas tudo ó susceptível de ser regulado em ordem a corrigir abusos e meter cada qual dentro do seu ambiente funcional próprio. Dispenso-me de pormenorizar, pois nos levaria muito tempo e possivelmente nos arrastaria para longe do carácter geral em que é posto este meu desenvolvimento.
Analisemos porém o n.º 1.º Apenas esse, porque me parece aquele que pode ser aceite por toda a gente como sendo o que necessita de mais cuidado no estudo da possível má projecção do actual esquema de previdência.
O curso de Medicina é inegavelmente um curso longo e exigente na prestação de provas para sua conclusão. Obriga a uma larga preparação para que se possa adquirir o diploma respectivo. A profissão médica impõe também uma preparação constante, que é cara e fatigante de adquirir.
O exercício da profissão obriga a um esforço físico grande, além do risco que resulta dos contactos que a profissão determina.
Não é pouco vulgar o médico ser vítima da sua dedicação profissional. Infelizmente, também aparecem casos, graças a Deus raros, de falta de decoro e do probidade profissional.
Tudo isto posto, e que o grande público nem sempre tem bem presente, torna inegavelmente injusto que o médico seja levado à proletarização. Mas daí até à hipótese de fazer do seguro social um sistema de aproveitamento material para o exercício da profissão vai um abismo, Sr. Presidente.
Eu afirmo categoricamente que a classe médica não deseja tal. Quer ser respeitada nos seus interesses e na sua dignidade profissional, mas deseja ardentemente não menosprezar os interesses materiais e morais da grande multidão dos que sofrem. A classe médica sabe bem que não foram os doentes que se criaram para seu uso. O jus utendi et abutendi repugna à sua sensibilidade e à ética da sua formação profissional.
Como seria então, Sr. Presidente, em meu entender?
Todos os médicos teriam o direito de se inscrever em qualquer caixa de previdência para efeito de prestação de serviço. Esta inscrição seria feita por intermédio da Ordem dos Médicos no Instituto Nacional do Trabalho e Previdência.
As caixas de previdência requisitariam ao referido Instituto o número de médicos de que necessitassem para a prestação dos seus serviços, quer gerais quer de especialidade.
Cada médico prestaria serviço pelo prazo de seis meses. A Ordem dos Médicos indicaria aqueles que iriam prestar serviço em cada caixa, estabelecendo um roulement para tal fim.
A remuneração dos serviços seria regulada por contrato colectivo de trabalho a combinar entre a Ordem e a caixa de previdência, sob a arbitragem do Instituto Nacional do Trabalho. Quando não houvesse médicos voluntariamente inscritos para prestação de serviços nas caixas de previdência, estas poderiam contratar quaisquer outros à sua escolha, que exerceriam a função pelo prazo de um ano, podendo ser reconduzidos por prazos iguais não havendo voluntários inscritos.
Os médicos que prestassem serviço seriam responsáveis tecnicamente perante o médico-chefe da caixa de previdência, que seria nomeado pelo Ministro das Corporações pelo prazo de dois anos, podendo ser reconduzido. A Ordem dos Médicos poderia opor reservas junto do Ministro à nomeação ou recondução do médico-chefe.
Eis um sistema. Está completo? O que daria na prática? Talvez possa ser útil aos interesses dos médicos e útil a boa prestação de serviços para os beneficiários.
Um facto porém tem de ser admitido, e duma forma incontroversa, pela classe médica. A medicina na sua independência antiga morreu. Em seu lugar tem de viver e prosperar a medicina de equipe e a medicina social.
O doente caso clínico não mais poderá ser admitido. A despersonalização do homem, e por conseguinte do doente, não pode ser admitida pelo médico moderno.
Creio que a classe médica atravessa um período de adaptação, que lhe parece mais doloroso e inaceitável do que realmente é. Eu penso que o seguro social tem de trazer benefícios para a sociedade em geral e também os trará para os interesses materiais do exercício da profissão, com a mais intensa e urgente procura dos cuidados do médico por parte duma multidão que até há pouco não sabia o que era ter cuidados com a saúde.
O assunto ó muito vasto e muito difícil - já o disse no começo das minhas considerações.
Outros problemas estão ligados ao seguro social, Sr. Presidente. Eu também teria desejo de os abordar e sobre eles pôr um pensamento, uma directriz. Isso levar-me-ia muito longe.
O volume dos meus apontamentos é muito grande e a explanação das consequências que deles eu poderia tirar arrastar-me-ia certamente para fora dos limites do aviso prévio.
Assim: como se encara o risco do acidente de trabalho e da doença profissional?
Qual o esquema da prestação dos serviços de enfermagem?
Como é encarada a segurança dê emprego dos funcionários administrativos das caixas de previdência?
Quais as atribuições das direcções das caixas de previdência, sua responsabilidade e forma de fiscalização de actividade?
Qual o esquema da prestação de serviços farmacêuticos?
Nada disto tem uma resposta?
Tem, Sr. Presidente. Não é chegado o momento para a dar.
Ela existe no meu pensamento. Se nunca for ocasião azada para a ditar, outros o farão por mim e certamente com mais acerto e conhecimento de causa e efeito.
Finalmente, desejo apresentar os meus cumprimentos de simpatia o cordeal admiração ao Sr. Ministro das Corporações e Previdência Social pelo alto espírito do que tem dado provas ao arcar com as ingratas responsabilidades dum sector do Governo sobre o qual todos dão opiniões, mas onde não é fácil encontrar soluções. É inegavelmente a sua posição um posto de sacrifício, de sacrifício da sua viva inteligência e do seu dinamismo, que muito terão sofrido e hão-de sofrer por não ser possível em tal assunto caminhar depressa, conseguir a perfeição e dar a cada qual mais do que as possibilidades permitem.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.