O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

3 DE DEZEMBRO DE 1954 41

Não me refiro às nossas outras províncias ultramarinas, principalmente Angola e Moçambique, porque de momento a sua segurança não nos dá lugar a preocupações, o que não quer dizer que o seu caso não se possa vir a pôr um dia, pelo que há que tratar de fazer delas o grande depósito de reservas para a sua defesa própria e de todo o mundo português.
Não quero dizer, com quanto fica exposto, que não devemos pôr à disposição daqueles ao lado de quem nos bateremos os nossos recursos em bases, pontos de apoio, material e, inclusivamente, efectivos, mas isso sem sacrifício das nossas condições de segurança própria.
E a experiência mostra-nos que sempre isto foi compreendido e aceite pela nossa velha aliada, a Inglaterra, que ainda agora, e apesar da sua especialíssima posição perante a União Indiana, marcou uma atitude que lhe dá direito ao reconhecimento de todos nós.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - É que para ela os tratados de aliança, e até os simples compromissos, não são farrapos de papel que se rasgam quando convém.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - E se dentro da organização de defesa dos povos livres, a que ela e nós pertencemos, há quem pense diferentemente, se julgue dispensado de se solidarizar connosco, agora que corremos perigo, e se limite a sorrir compadecidamente, como diz o Sr. Presidente do Conselho, do nosso arreganho, esse alguém, digo eu, pode estar certo de que a sua atitude não será esquecida pela Nação Portuguesa.
Como, nos dias de hoje, os interesses de todos os povos estão de tal maneira entrelaçados que os dos maiores muitas vezes são afectados gravemente pelas atitudes dos mais pequenos em casos de conflito, será bom que isso não esqueça aos poderosos. Estou certo de que o nosso Governo está tomando na devida conta tudo quanto se tem passado neste aspecto da solidariedade internacional, para na altura própria proceder em harmonia com o que for imposto também pelas nossas conveniências próprias, e ainda pelo sentimento com que venhamos a sair da crise por que estamos passando.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: muito haveria ainda que dizer sobre outros pontos focados pelo Sr. Presidente do Conselho, e em especial no que se refere ao Acto Colonial e ao Padroado. Mas porque, para mim, o aspecto principal do aviso prévio é o do nosso conflito com a União Indiana, limitar-me-ei a meia dúzia de palavras sobre aqueles dois assuntos.
A mágoa e o mal-estar que certas disposições do Acto Colonial provocaram na Índia, como referiu o Chefe do Governo, foram-se porém atenuando gradualmente, mercê da actuação dos órgãos da Administração e à medida que se modificava a situação, que provocara, lá como cá, a adopção de determinadas providências, umas de certo modo duras, e outras relativas à diminuição do predomínio de certos órgãos como os Conselhos de Governo, representativos mais da opinião pública do que de serviços puramente administrativos.
Tal mágoa, porém, não fez abrir brecha no patriotismo dos Goeses, como se tem verificado nesta crise, e estou certo de que se amanhã fosse plesbicitado o estatuto que está em elaboração em lugar de o ser a nossa soberania, fórmula esta que o Governo e nenhum de nós admite, estou certo, digo, de que toda a índia o votaria, mostrando assim ao inimigo e a alguns amigos que ela está connosco.
Oxalá, porém, que em caso tão delicado como o do dito estatuto não se vá cair numa situação extrema, de carácter oposto aquela de que se pretende sair.
Quanto à extinção do Padroado, julgo que não virá longe o dia em que os órgãos da Igreja que mais a reclamaram, em parte para serem agradáveis à União, mas esquecendo os nossos serviços, se arrependerão de tal. Parece-me ilusório o seu conceito de que tal atitude poderá modificar a directriz geral do movimento político da Nação Indiana na parte que lhes respeita, movimento este que tem como lema o fortalecimento da homogeneidade da dita nação e, consequentemente, o desaparecimento ou, pelo menos, o enfraquecimento da influência europeia, nas suas diversas modalidades: política, económica, cultural e religiosa. Ora a massa geral da população indiana é hindu, e não católica, do que resulta, a meu ver, que serão falazes as esperanças da Propaganda Fide!

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Portugal, com a extinção do Padroado, deixa de ter a regalia de indicar à Santa Sé os nomes de prelados para certas dioceses da União e de ter lá uns centos de padres goeses a paroquiar? A mim, independentemente do aspecto sentimental, derivado duma tradição secular, não me impressionou isso grandemente, á parte a fórmula adoptada, e o mesmo se deu com um ou outro prelado dos interessados.
Acho até preferível que, em lugar de continuarmos a despender somas avultadas com a preparação de sacerdotes destinados a países alheios, e alguns deles até nossos inimigos, o façamos com a daqueles que encaminhemos para as nossas províncias ultramarinas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estas sofrem de tantas necessidades neste aspecto e vêem-se de tal maneira obrigadas a recorrer a elementos estrangeiros que me parece que só teremos a ganhar com a modificação duma situação paradoxal, resultando muito embora de seculares compromissos, e que se traduz no seguinte: Portugal mandar parte dos seus filhos a evangelizar países estranhos e recorrer aos estrangeiros para evangelizar os seus.
A eficiência do movimento missionário e o prestígio do Ocidente vão sofrer com a nossa falta de colaboração, para já, na Índia e amanhã possivelmente na China, em Malaca, etc.? Isso é com a Propaganda Fide. Nós tentaremos resolver o nosso problema próprio; do resto não curamos, visto que assim o quiseram.
E agora vou terminar, sintetizando quanto expus: estamos em presença duma ameaça muito séria à nossa soberania. Mesmo na pior das hipóteses, isto é, na de nos vir a faltar o apoio externo que nos é devido, entendo que deveremos responder a força com a força, sem curarmos de seguir exemplos alheios, nem de nos desmoralizarmos com a inferioridade dos recursos. A nossa história mostra-nos que nem sempre este último factor é motivo de derrota.
Devemos, entretanto, facultar à guarnição da Índia os meios de ela poder fazer, pelo menos, uma defesa honrosa.
Não quero, porém, deixar esta tribuna sem agradecer ao Governo as explicações que trouxe à Assembleia e que já chegaram a todos os confins da Nação e do Mundo. Elas serviram para fortificar o moral de todos os bons portugueses, que sentiram que têm chufes à altura da sua história e das suas responsabilidades