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11 DE DEZEMBRO DE 1954 187

O Orador: - No programa aprovado pelo Conselho Económico para 1954 foi prevista a adjudicação de fornecimentos e o início de trabalhos para a anunciada electrificação em certa linhas, do* nosso caminho de ferro.
Parece que, antes de tudo,.se deve pôr toda a rede nacional em condições de permitir a segurança dos bens e das vidas que diariamente transitam por ela.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Estas considerações que tenho estado a fazer vêm-me, à mente em razoo do desequilibrado emprego dos recursos e dos cuidados que se têm dispensado às ligações da capital com o Norte " às ligações da capital com o Sul, mesmo guardadas as devidas distancias entre as importâncias dos núcleos populacionais que as. respectivas linhas servem e do estado de conservação da linha do Sul.
Quanto ao emprego de meios, o Sul não pede ires rápidos diários, mas, para já, ficaria satisfeito com uma ligação diária rápida, pelas linhas do Sul ou do Sado, com automotoras das do tipo utilizado na linha do Oeste, enquanto a via não permitisse e as circunstâncias não aconselhassem outra composição de maior categoria.
Oferecem particular reparo as condições precárias e até perigosas em que se efectua o transporte de passageiros entre as estações do Terreiro do Paço e do Barreiro, pois, a maior parte das vezes vão nos velhos barcos como sardinha em lata, o que pode ter sérias consequências -no caso de pânico provocado por qualquer acidente.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E necessário ter em conta que as linhas do Sal c do Sado, que servem o Sul, além de atravessarem uma importante região do País, têm um papel a desempenhar no desenvolvimento que se prepara da indústria turística.
Não fugiu certamente à observação dos dirigentes do turismo nacional a possibilidade e na conveniência de fazer vir até nós a valiosa corrente turística que circula ma vizinha região espanhola da Andaluzia e no Norte de África, por meio duma bem orientada propaganda, tendo como elemento valioso de atracção as belezas naturais do Algarve e o seu clima excepcional e, dentro em pouco, o monumento .ao Infante D. Henrique, em Sagres, que deve englobar o Museu das Descobertas.
Este monumento passará a ser o mais famoso padrão da nossa glória universal, que o mundo culto desejará visitar em rendida homenagem a um país que foi seu guia e mestre na arte de navegar e a um heróico povo que bem serviu a civilização ocidental e a humanidade. E os turistas curiosos, levados até ele por uma conveniente propaganda e facilidade de meios, ficarão a conhecer-nos melhor e a admirar-nos mais.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O Orador: - Para dar maior movimento ao turismo é indispensável conjugar o desenvolvimento da indústria hoteleira com a melhoria dos meios de transporte. O caminho de ferro e o seu principal agente. Interessa, portanto, pôr a linha do Sul em condições de cumprir a sua missão. Para o fazer carece de comboios diários rápidos e confortáveis entre Lisboa e Vila Real de Santo António e de facilidades -na passagem do Guadiana por meio de uma ponte ou de um ferry-boat adequado ao transporte de todos os tipos de viaturas automóveis.
E, como acção complementar, estabelecer uma política de entendimento com a Renfe, de modo a conseguir que está melhore as suas ligações ferroviárias de Sevilha com Avamonte e as combine com as nossas. Deste modo se possibilitará mais uma ligação fácil com a Espanha, que muito virá beneficiar os dois países ibéricos.
Como se o estado de insuficiência de ligações rápidas não bastasse para contrariar os que viajam nas linhas do Sul, criou-se ultimamente mais uma dificuldade, fazendo terminar em Faro o trajecto do chamado rápido do Algarve, o que obriga a mais um aborrecido transbordo para os que se dirigem para o seu Sotavento, Andaluzia e Marrocos.
Até agora não têm sido satisfeitos os justos desejos e interesses do Algarve e do Sul do Alentejo de que sejam -melhoradas as ligações ferroviários com Lisboa e, consequentemente, com o Norte do País, não se sabe se por falta de meios, se por não terem sido bem compreendidas as solicitações feitas.
Isto que tenho estado a dizer quanto à circulação, toma aspectos mau graves quanto à segurança da via.
Neste caso a incompreensão atinge a imprevidência, e esta já contribuiu, de certa maneira, para trágicos acontecimentos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quero referir-me ao brutal descarrilamento do rápido do Algarve, que, em 13 de Setembro último, pôs termo a cerca de quarenta vidas de com provincianos meus, cujos corpos esmagados e esfacelados lá estão a dormir o sono eterno em terra alentejana.
Dificuldades dê várias origens não permitiram que voltassem à terra natal, onde as suas campas seriam mais cuidadas e visitadas por parentes e amigos, sempre que o coração os mandasse ir junto delas rezar piedosamente uma oração e desfolhar comovidamente uma saudade.
Este doloroso acontecimento, que foi sentido no País, teve profundas e dolorosas repercussões em toda a província.
Estávamos nos fins das férias de Verão. O rápido, que circulava apenas em três dias da semana, estava a revelar-se insuficiente e incómodo para o movimento de passageiros.
Contudo, não foi reconhecida a necessidade de o tornar diário, como era de uso em períodos de férias. As carruagens de 3.a classe que descarrilaram iam superlotadas. Se isto não contribuiu para o desastre, agravou as consequências deste.
Eu estava no Algarve quando do descarrilamento, e também fui tocado pela onda de desorientação e de pavor que num instante varreu toda a terra algarvia, provocada pelas notícias incertas da primeira hora, pois quase todos sé lembraram de momento que no comboio sinistrado tinha seguido um conhecido, um amigo, um parente, onda que se foi pouco a pouco detendo e quebrando nos escolhos das notícias certas, levantando então gritos de dor e espalhando sinais de luto.
Serenados um pouco os ânimos e feito o balanço ao acontecido, nasceu .nos corações, descontroladamente, um sentimento geral de incompreensão para com os desígnios implacáveis do destino, com certos laivos de ressentimento por suspeitosa insuficiência dos homens para os contrariar.
Tal sentimento, que encontrava, ao voltar-se para Deus, motivos de resignação para com o poder incontrolável do destino, mão se conformava, porém, com a insuficiência dos homens porque o alimentava o pensamento que se tem de que ao homem cabe contrariar, até onde a sua inteligência e engenho chegam, as causas que as forças do destino podem aproveitar para se desencadearem com maior violência e cegueira.

Vozes: - Muito bem!