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550 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 80

Alais disse ainda que o ribatejano «tem vencido com tenacidade e resignação todas as crises e todas as provações ... ».
São rigorosamente exactas as afirmações que nestas palavras se contém.
De facto, quando surge a crise, e surge inoxoravelmente em ciclos de maior ou menor amplitude, há sempre vozes de superfície que imputam as responsabilidades às produções da várzea ribatejana.
E chamo-lhes vozes de superfície porque o são de quem não observa o problema em profundidade e objectivamente.
O que representam as várzeas do Ribatejo na produção?
De um estudo recente do presidente do Grémio da Lavoura do Almeirim, D. Luís Margaride, que sem favor se pode considerar um estudo notável, porque foi feito com toda a objectividade e método centífico, ofereço à consideração da Câmara alguns dados relativos à cultura da vinha no Ribatejo e suas várzeas.
A área de várzea inundarei do Ribatejo é de cerca de 40 000 ha.
A área de vinha em todo o Ribatejo, compreendendo várzea, charneca e encosta, é de 35 000 ha, sendo destes 10 000 ha de vinho de várzea e 25 000 ha de vinho de encosta e charneca.
A área de vinho do Douro é de 27 895 ha.
Segundo o boletim do Office International du Vin, a média de produção por hectare no quinquénio de 1949-1953 no Ribatejo é de 3240 l por hectare e a do Douro de 2830 l.
Estes números referentes a áreas reportam-se a 1952 e constam do boletim de Outubro de 1953.
Como a produção média por hectare no Ribatejo se refere a vinha de encosta, charneca e várzea, admitamos exageradamente que a produção média por milheiro, de vinha de várzea é de três pipas de 442 l; temos uma produção de 1320 l por milheiro, ou sejam 6630 l por hectare, na várzea.
Como a área de várzea é de 10 000 ha, temos que a produção da várzea do Ribatejo é de 66 300 000 l.
Ora a produção de 1954, em todo o País, andou por cerca de l 180 000 000 l.
Assim, a várzea do Ribatejo contribuiria para a produção total do País com cerca de 5,5 por cento!
Por aqui se vê a inconsistência da afirmação de que vi a várzea do Ribatejo que provoca a crise de superprodução e de aviltamento de preço do vinho.

O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Houve um ataque de filoxera, com certeza ...

O Orador: - São os números estatísticos, Sr. Deputado Paulo Cancella de Abreu.
E não é só no Ribatejo que existe vinha em terra de várzea; já atrás referi que em todas as zonas vitícolas do País existem vinhas plantadas nas várzeas, nas terras fundas e até em terras de lima.
Já nesta Câmara o nosso saudoso colega Jorge Viterbo Ferreira, que foi grande produtor e exportador do vinho do Porto, afirmou em 1939:

O desenvolvimento da exportação, os lucros conseguidos, a esperança de que se mantivessem e a mira de os desenvolver levou a grandes plantações no Douro, em regra levadas a efeito nos terrenos de mais fácil cultura, cujas vinhas tinham sido destruídas pela invasão filoxérica e onde tinha sido produzido o vinho do Porto.
Este aspecto era grave, pois como entre o plantio e a plena produção medeariam, pelo menos, cinco a seis anos, acumularam-se causas cuja eclosão só mais tarde se verificaria.
Além desta circunstância, e a agravá-la, foi aumentada em 1921, por motivos de mera política, a região do Douro uns 35 000 há, com uma produção média de 25 000 a 30 000 pipas.
Erro tremendo foi este, porquanto veio contribuir para desorganizar uma política económica que devia ser valorizada pelo produto.

O Sr. José Sarmento: - Na parte a que V. Ex.a se refere-as plantações feitas no Douro depois da filoxera- eu indico a V. Ex.a que, evidentemente, foram escolhidos aqueles terrenos onde em liberdade de plantio tinham maior possibilidade de produção e que esses terrenos hoje não existem.
Sr. Presidente: a vinha em certos pontos da várzea ribatejana é a única cultura economicamente possível, e por isso nela se pratica desde remotos tempos, que se situam nos princípios da Nacionalidade.
O facto tem explicação natural e simples.
É nas margens do Tejo médio, entre Tancos o a foz do canal da Azambuja, que principalmente se cultiva a vinha de várzea.
Toda esta região é inundável. E a cheia que neste momento a avassala é disso testemunho incontestável, a despeito da existência das barragens.

O Sr. Manuel Vaz: - E é a vinha que fixa o terreno?

O Orador: - Evidentemente.

O Sr. Manuel Vaz: - Não acredito que a vinha, que em qualquer parte é facilmente arrancada, seja capaz de suster a erosão.

O Orador: - Sobre o caso escreve o Prof. Amorim Girão, rumo diz Luís de Margaride:

O vale do Tejo, que desde a fronteira até Abrantes é aberto um rochas ..., pré-câmbricas e graníticas, continua ainda acompanhado por alguns retalhos dessas rochas, pelo menos até às proximidades de Tancos ...
Finalmente o rio entra de novo numa larga bacia terciária, onde tem o seu curso sobre materiais que ele em parte depositou ...
É nesta última secção, correspondente às extensas planícies ribatejanas, que os dois quadros contraditórios da prosperidade o miséria se sucedem às vezes em rápida mutação: de prosperidade quando os nateiros fertilizadores tornam os campos marginais num verdadeiro presente do rio; de miséria quando o flagelo das cheias invade tumultuáriamente os mesmos campos, semeando neles a ruína e a desolação. Na verdade, tão grande é o depósito das areias e outros materiais arrancados à bacia do Tejo, despula em grande parte de arborização, que o seu leito vai em certos pontos mais alto que as margens.
O rio abandona este leito quando as águas sobem, por pouco que seja; e estas precipitam-se às vezes com rapidez fulminante, por ocasião das grandes inundações, desmantelando diques e valados, destruindo sementeiras e casas de habitação, pondo vidas em perigo e interrompendo estradas e vias férreas.

É este o quadro que tantos esquecem ou ignoram, descrito por mão de mestre, que só por si explica a existências das vinhas numa parte, a menor parte, da planura ribatejana.
As culturas de Inverno e as da Primavera, por vezes, como trigo, fava, milho, aveia e outras, constituem verdadeiro jogo de azar.