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95 7 DE DEZEMBRO DE 7.95-5

Tem a minha inteira concordância o Prof. Palanca, director-geral de Saúde de Espanha e catedrático de Higiene de Madrid, ao escrever: «é um erro que em qualquer reforma se trate de conceder vantagens pessoais; um interesse, uma protecção excessiva para uma classe, mais a prejudica que a favorece».
Não venho, portanto, pedir que sejam concedidas vantagens especiais para os médicos rurais, mas sim que se chegue a um plano de equilibrada justiça, dentro do condicionalismo imposto pelas realidades e pelas possibilidades.
Assentar primeiro em princípios bem definidos, que sejam o ponto de partida de uma acção que permita a completa regulamentação da medicina rural. A ordem de preferência do capitulo VII toma, assim, um aspecto diferente do simples dado estatístico dos pedidos feitos para os diferentes sectores da política rural; por outras palavras: a preferência torna-se planeada, doutrinária, imposta pela necessidade de melhorar as condições sanitárias do nosso meio rural, exactamente como se fez para o saneamento financeiro, imposto com severidade e justiça, de cima para baixo.
Examinemos as condições económicas da classe médica e expliquemos o que formos encontrando no nosso caminho, porque isso tem importância na conduta a seguir.
Num inquérito, recentemente levado a efeito, pelo Jornal do Médico, sobre o que pensam os grandes nomes da medicina portuguesa, foram ouvidos os Profs. Eduardo Coelho, Vítor Fontes, Maximino Correia, Costa Sacadura, Francisco Gentil, Almeida Garrett, Diogo Furtado, Bocha Brito, Lopes de Andrade, Egas Moniz, Henrique de Vilhena, António Flores, Salazar de Sousa, Freitas Simões, Aires de Sousa, Carlos Lar-roudé, Carneiro de Moura, Asdrúbal de Aguiar, Cid dos Santos, Vaz Serra e Cerqueira Gomes. Outros distintos médicos foram ouvidos, cujos nomes não cito para não alongar a lista.
Todos foram unânimes em concluir que a classe médica, no geral, vive com grandes dificuldades económicas.
Parece-me que a resposta, do Prof. Flores, quando fala do «desequilíbrio entre os proventos e as necessidades inerentes à própria situação social», é a que mais de perto se ajusta à realidade.
Muitos, muitíssimos, vivem apertadíssimos economicamente.
Não admira que alguns, desesperados, aceitem cargos com a remuneração de moço de fretes e que outros percam a vergonha e enveredem por uma desesperada dicotomia. A imensa maioria sofre e cala.
Para uma população de 8 441 000 habitantes há 6554 médicos inscritos na respectiva Ordem.
Destes 6554, há nada menos de 2511 especialistas: 346 estomatologistas, 326 cirurgiões, 229 ginecologistas, 210 pediatras, 202 tisiólogos, 138 parteiros, 123 radiologistas, 120 oftalmologistas, 111 urologistas, 111 otorrinolaringologistas, etc.
Na Inglaterra, se a distribuição dos médicos fosse homogénea, a cada médico caberiam 2200 pessoas, mas nalgumas cidades industriais, áreas mineiras e concelhos pobres há apenas um médico para 4000 pessoas. Considerando a totalidade, há em Portugal um médico para 1287 pessoas, portanto uma percentagem bastante superior à inglesa.
Mesmo descontando os especialistas, ainda ficaria um médico para 2000 habitantes, se a distribuição fosse homogénea.
Dentro de alguns anos corremos o risco de ter médicos numa superabundância indesejável. Por isso julgo podermos ser muito pessimistas quanto às perspectivas económicas futuras da classe médica portuguesa. A desigualdade da distribuição pode exemplificar-se com o distrito de Coimbra.
O distrito de Coimbra tem 224 262 habitantes e as cidades de Coimbra e da Figueira da Foz contam, respectivamente, 53 023 e 17 208 (censo de 1950).
O número total de médicos do distrito é de 418, dos quais 209 na cidade de Coimbra (112 são especialistas e 157 clínicos gerais) e 28 na Figueira da Foz.
Daqui resulta que em Coimbra - grande centro hospitalar - há um médico para 107 habitantes; na Figueira há l médico para 617 habitantes.
No distrito, excluindo Coimbra e Figueira, há 121 médicos, ou seja l médico para 1272 habitantes.
Mas se escolhermos dois concelhos rurais pobres encontramos a diferença seguinte:
No concelho de Pampilhosa da Serra há 14 375 habitantes e 3 médicos (um quarto médico, que está inscrito na Ordem, não exerce hoje praticamente clínica), ou seja l médico para 4791 habitantes; no concelho de Gois, com 11 023 habitantes, há apenas 2 médicos, ou seja l médico para 5511 habitantes.
Os doentes não têm recursos; são regiões ásperas e acidentadas, muito pobres, com vias de comunicação muito precárias.
Há certos factos que provam ser necessário olhar pelas populações rurais, no capítulo- da assistência médica, e os números que citei dão já uma indicação preciosa.
Os habitantes das nossas aldeias representam 58,8 por cento da população do País e os habitantes das vilas e aldeias representam 75,7 por cento.
No ponto de vista de assistência médica, há zonas que estão muito bem e há zonas que estão muito mal. Eu falo pelas que estão muito mal.
Pelo Anuário Demográfico de 1953 verifica-se que nos distritos de Guarda e Bragança faleceram sem atestado médico cerca de 50 por cento das pessoas, ou seja um número dez vezes maior que no distrito de Lisboa (respectivamente 50,48, 50,39 e 5,01 por cento).
No ano passado, o colega Dr. Rebolo de Sousa, que actualmente ocupa, com muito brilho, o cargo de Subsecretário de Estado da Educação Nacional, fez referência a esta angustiosa situação, mas convém descer a mais pormenores, porque daí se podem tirar conclusões de interesse prático.
Há concelhos, como os de Montalegre, Macedo de Cavaleiros, Vila Pouca de Aguiar e Vila Nova de Paiva, em que vamos encontrar uma percentagem arripiante de falecidos sem atestado médico (respectivamente 96,5, 96,45, 97,34 e 83,16).
Os distritos do nosso continente não mostram regularidade na falta de assistência médica; há distritos que estão muito melhor que outros, e convém saber os que estão pior servidos, ou seja os pessimamente servidos - aquilo que constitui a chaga que nos envergonha perante nós próprios.
Dos dezanove concelhos do distrito de Aveiro, só num (Arouca) o número de óbitos sem assistência médica foi superior aos do que tiveram assistência.
Nos catorze concelhos do distrito de Beja houve três (Almodôvar, Mértola e Odemira) em que o número de não assistidos foi superior ao dos assistidos.
Nos treze concelhos do distrito de Braga houve cinco (Amares. Cabeceiras de Basto, Celorico de Basto, Fafe e Póvoa de Lanhoso) em que o número de não assistidos foi superior ao dos assistidos.
Nos doze concelhos do distrito de Bragança houve seis (Alfândega da Fé, Macedo de Cavaleiros, Miranda do Douro. Torre de Moncorvo e Vimioso) em que o número de não assistidos foi superior ao dos assistidos.