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158 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 107

A Escola de Cerâmica de Viana do Alentejo, que constitui uma secção da Escola Industrial e Comercial de Évora, esteve quase a fechar por falta de alunos, isto numa terra onde a cerâmica é uma das mais antigas indústrias. Aprende-se ali o ofício por arção rotineira das oficinas, mas foge-se da escola, que devia - e é essa a sua finalidade conduzir ao aperfeiçoamento e desenvolvimento da indústria local.
Há, pois, que modificar a mentalidade dos alunos, mas, para isso, as escolas técnicas devem perder a sua feição de liceus de via reduzida e ampliar e melhorar a sua posição verdadeira de preparar técnicos de craveira média para a indústria e para o comércio. Em seguida estes técnicos serão chamados para as fábricas e oficinas, de preferência aos aprendizes semi-analfabetos.
É evidente que tudo isto acarreta maior soma de encargos para o Estado, mas também é evidente que a obra utilíssima que esta em larga projecção não pode estagnar em meias soluções. De resto, estou certo de que o Sr. Ministro da Educação saberá encontrar as soluções graduais e progressivas que se impõem.
Por exemplo, porque não considerar o 1.º ciclo dos liceus preparação oficial para o» cursos especiais das escol a s técnicas; já este princípio está adoptado para entrada nas escolas de regentes agrícolas e escolas do magistério primário.
Valerá a pena a existência nas escolas técnicas de uni curso chamado preparatório, que outra coisa não é senão o 1.º ciclo dos liceus?
Julgo que valeria a pena estudar essa coordenação e evitarem-se duplicações caras para o Estado.
Essa coordenação, além de económica, traria aos espíritos obcecados com o exclusivismo da técnica a noção palpável de que a cultura geral ajuda a formação integral do homem.
Se se pretende aumentar a frequência das escolas industriais e comerciais à custa de uni desvio da população liceu, porque não se barateiam - já não falo na gratuitidade de certos países - as propinas daquelas escolas? Antigamente, antes da actual reforma de 1948, a propina era de 18$ - verdadeiramente simbólica, menor do que a quota anual da Mocidade Portuguesa - e actualmente as propinas por cadeiras estão quase niveladas com as dos liceus.
Será esta carestia de propinas que desvia efectivamente muitos alunos .para os liceus? É possível que em parte isso aconteça, mas eu, com observação do meio em que vivo - e que é semelhante neste ponto a todos os meios dentro do País-, cheguei à conclusão de que a causa é muito outra: é que ficam sem ensino aqueles que não têm condições para pagar propinas elevadas em qualquer das modalidades de ensino, e assim tem-se regressado ao processo primitivo do aprendizado ou do marcenato sem qualquer preparação escolar. A simples isenção de propinas não resolve o problema, porque, quer no liceu, quer nas escolas técnicas, limita-se a 10 e 25 por cento da frequência, respectivamente.
Os liceus, criados em 1836, levaram oitenta anos a atingir a maturidade e a relativa normalização. Não admira, pois, que o ensino técnico, de recente criação, se encontre ainda numa fase indecisa de organização.
Sabe-se que a agricultura é por ora, e oxalá que seja sempre, a mais vasta e poderosa actividade nacional. Olha-se em volta e, afora unia notável e brilhante escola superior de agronomia, divisa-se ao longe apenas a existência de três escolas de regentes agrícolas e outras, muito poucas, de ensino rudimentar, creio que anexas a reformatórios.
Será o exercício da agricultura, dessa agricultura que alimenta a Nação, mister tão simples e rudimentar que desnecessite de uma técnica adequada e se apoie e viva do empirismo e da rotina? Se assim não é, parece empírico que se criem escolas de várias modalidades com vista à cultura cerealífera, à horticultura e à pomicultura, como dizem que se pratica em países mais adiantados.
Já uma vez, a propósito do plano de hidráulica agrícola, lembrei desta tribuna a necessidade de uma escola de regantes, e até citei a vizinha Espanha, onde esse problema não foi esquecido no gigantesco esquema do aproveitamento do Guadiana.
Julgo não ser impertinente insistindo nesse ponto - a criação de uma escola de regantes -, tão útil que seria como complemento da obra renovadora da rega já realizada e dos esquemas em estudo no Alto Alentejo.
Sr. Presidente: afinal já pouco tempo me sobeja para falar do ensino liceal, ia para dizer, esse «desconhecido».
A moda, que em tanta coisa faz a sua intromissão, também obcecada pelo primado da técnica, tem quase considerado o ensino liceal como obsoleto e, portanto, quase indesejável.
É preciso - diz-se em muitas tribunas mais ou menos autorizadas - que a massa escolar liceal, a estoirar de inflação, seja desviada para as escolas técnicas.
Pura ilusão e até perigosa ilusão!
Esquecem os cangalheiros do ensino liceal que as escolas técnicas das cidades principais estão tão ultrapassadas em frequência como os liceus. Esquecem os arautos da técnica 100 por cento que os liceus são a preparação indispensável, não obstante as suas removíveis dificuldades actuais, para a alta técnica, ou seja, a técnica superior: a medicina, a engenharia, etc.
Desconhecem os cegos sequazes da última moda, a moda da técnica exclusiva, que a feição humanista ou clássica dos liceus há muito, e mercê de várias reformas - é verdade que nem todas felizes -, deixou de ser virgiliana ou aristotélica para se remoçar e revigorar com a adição das chamadas humanidades modernas, ou sejam as ciências positivas e as línguas de projecção universal.
Desconhecem que essa preparação liceal, com todas as deficiências a rectificar, faculta aos muitos - e são talvez o maior número - que não sobem às Universidades cultura geral, de ordem intelectual e moral, que os habilita a vencerem na vida em tantos e tão desvairados sectores? É caso para meditar sobre o que se verifica na França, puís fortemente industrializado, que em l de Outubro último tinha no ensino liceal oficial 540 000 estudantes e no ensino técnico oficial 331 000.
Sou o primeiro a desejar que haja em Portugal um ensino técnico médio eficiente e procurado pela grande massa de estudantes, que hão-de rejuvenescer a nossa indústria e comércio em pleno desenvolvimento. Mas também me permito afirmar que mal viria ao nível cultural da Nação se o ensino liceal fosse descurado, ou mesmo colocado era segundo plano.
Ainda não há muitos dias que o ilustre titular da pasta da Educação Nacional denunciou num brilhante discurso os perigos da excessiva técnica ou especialização generalizada, pois que o culto das humanidades ajuda a formação moral do homem.
Disse S. Ex.ª o Ministro, no seu recente discurso, quando da posse da 4.º Secção da Junta Nacional da Educação: «Sem uma cultura geral humanista não há profissional que valha».
Ora, sabe-se que essa cultura geral humanista se adquire especialmente nos liceus.