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10 DE FEVEREIRO DE 1956 483

São meios previstos desta intensificação de relações culturais luso-belgas, entre outros, as visitas de professores, cientistas, estudantes, investigadores e artistas, as conferências, os concertos, as exposições, os livros e periódicos, a rádio, a televisão, o cinema, ou sejam todas as formas de difusão do pensamento e da expansão do espírito.
Sr. Presidente: não podemos deixar de fazer votos para que se efective todo o conjunto de realizações que o Acordo Cultural Luso-Belga prevê e enuncia, porque, se a Bélgica oferece, pela vastidão da sua cultura e pelo seu desenvolvimento cientifico, campo vasto de ensinamentos, não deixa também para nós de ser profundamente útil e desvanecedor que outras nações progressivas tomem interesse e se afeiçoem pelas coisas portuguesas -pelo nosso património espiritual, pêlos trabalhos dos nossos artistas, pelas obras-primas da nossa literatura, pelo labor das nossas Universidades, pela nossa obra colonizadora e missionária- e fiquem, assim, conhecendo melhor o génio imortal de uma raça e o verdadeiro sentido de uma história.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador:-E se os acordos culturais são sempre de vantagem, a sua conclusão é, sobretudo, de louvar quando exprimem de direito uma situação preexistente de facto e quando por detrás das assinaturas das chancelarias existem sentimentos vivos recíprocos de amizade entre os respectivos povos.
É o caso presente, em que o Acordo Cultural exprime uma situação de crescente interesse e simpatia entre as duas nações que o assinam e entre as quais existem também numerosas afinidades, quer no domínio do espirito, quer no campo da acção.
As velhas estradas romanas levaram até ao interior da região das Ardenas a língua latina, a civilização mediterrânea e a religião cristã. E, embora várias vezes invadida e ocupada, a Bélgica antiga, situada num ponto de confluência do espirito latino e do espirito germânico, permaneceu fiel à religião de Roma e manifestou sempre uma profunda e decisiva influência da civilização romana.
Esta afinidade de crenças e costumes desde recuados tempos nos ligou às terras e cidades que constituem a Bélgica dos nossos dias. E através das peregrinações religiosas, das cruzadas, das alianças dinásticas, da colonização, dos mercadores e dos artistas recebemos, como refere o eminente académico Dr. Júlio Dantas no seu erudito parecer, e como também acaba de dizer o nosso ilustre colega Sr. Dr. Galiano Tavares, o influxo da sua civilização e do seu espirito. D. Isabel, filha de D. João I, casa com o duque de Borgonha, no fim do século XIV celebra-se o primeiro tratado de comércio entre Portugal e a Flandres, surge em Bruges a primeira feitoria portuguesa, e este intercâmbio de comércio e de ideias leva depois àquelas terras do Norte alguns dos nomes mais representativos do pensamento português da época, como frei Diogo de Murça, André de Resende e Damião de Gois.
Tantas vezes nos encontrámos juntos, na propagação da fé, na elevação do pensamento, na defesa do direito dos povos, na expansão do comércio, na glorificação da arte, e, se há na Bélgica o culto pela nossa epopeia marítima e pelos serviços reais que prestámos à civilização, não há entre nós quem não admire essa outra nação, cujo espirito de sacrifício integral lhe permitiu escrever algumas das páginas mais belas do heroísmo humano de todos os tempos.
Ficou célebre a frase do rei-soldado: «Pereça antes a Bélgica que a honra».
Nos tempos modernos, e depois da sua constituição definitiva como nação independente, aquele país foi chamado a desempenhar uma importante missão nesse mesmo continente africano que Portugal séculos antes havia revelado ao Mundo e no qual ininterruptamente tem desempenhado uma importante missão civilizadora.
Esse povo tenaz e persistente, firme e voluntarioso, que, respeitando a concepção primitiva, levou três séculos a erguer e construir a catedral de Reims, tem realizado em África, terras fronteiras a uma grande e florescente província portuguesa, uma obra notável de expansão ultramarina, inspirada, como a nossa, por um alto e profundo sentido de missão.
Por isso p belga conde de Lichtervelde pôde escrever que a ideia colonial que se desenvolveu naquele pais sob a influência do idealismo e do apostolado religioso viria a perecer no dia em que adquirisse um carácter puramente materialista.
É de vantagem para os dois países um conhecimento reciproco dos seus métodos e processos de acção ultramarina e uma mais estreita colaboração no estudo dos problemas de interesse comum, como expressamente o reconhece o Acordo Cultural.
A história, a cultura e a acção civilizadora dos dois povos oferecem campo vasto e fértil de estudo e meditação. E ainda no campo social, sendo Portugal um estado de base corporativa e a Bélgica um pais que procura organizar a sua economia numa base profissional, de forma a ser, como escreveu um professor eminente, a expressão harmónica de todas as forças activas da produção, ainda no campo social, dizia eu, é da maior importância o estudo recíproco das instituições dos dois países.
Nos primeiros séculos da nossa idade os condados que formam hoje a nação belga constituíam uma posição avançada da cultura latina no Norte da Europa e as terras onde mais tarde se havia de constituir a monarquia portuguesa a sua última projecção a Ocidente.
Volvidos séculos, e depositárias de uma civilização milenária, cabe às duas nações a gloriosa missão de preservarem e defenderem contra ambições estranhas vastas e ricas regiões do continente africano.
Desapareceram agora as velhas estradas romanas e os povos procuram, inquietos e desorientados, outros rumos e caminhos.
Mas, à medida que o tempo corre e se abrem e fecham novas páginas da história, cada vez mais se reconhece que o património latino-cristão, no conjunto dos seus princípios e das suas realizações, continua a ser no Mundo o mais precioso tesouro de valores espirituais e humanos.
Sr. Presidente: tenho a honra de mandar para a Mesa, em nome da Comissão de Negócios Estrangeiros e por honrosa incumbência do seu ilustre presidente, a seguinte

Proposta de resolução

«A Assembleia Nacional, depois de tomar conhecimento do texto do Acordo Cultural entre Portugal e o Reino da Bélgica, assinado em Lisboa em 30 de Julho de 1955, resolve aprovar, para ratificação, o referido instrumento diplomático.

Sala das Sessões da Assembleia Nacional, 9 de Fevereiro de 1956. - O Deputado, Alberto Henriques de Araújo».

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente:-Não está mais ninguém inscrito para este debate. Considero-o, pois, encerrado.