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15 DE MARÇO DE 1956 541

glória - pode realmente efectivar-se sob a cobertura de um tecto e num ambiente doméstico que em vez de ser um santuário onde a lar cristão se entronizou é antes como já vi amargamente sublinhado, um túmulo em que a vida agoniza e a dignidade se perde.
Toda esta tragédia toma aspectos de amarfanhar as almas mais insensíveis e duras citando casos, que pessoalmente conheço, de chocante promiscuidade que por completo faz postergar a observância dos bons costumes e totalmente rasoira o primado dos princípios éticos - vida aberrante, vida sombria, vida de calvário esta, Sr. Presidente e Srs. Deputados.
Referindo o brilhante fundo do jornal O Século de 5 de Dezembro último, recordo que nele avisadamente se escrevia que o homem que vive numa barraca de pau e lata com a mulher e os seus filhos, sujeitos, a todos os caprichos e a todas as ameaças do tempo e do clima, sem puder agasalhá-los nem manter o recato exigido pela moral e pelo pudor, não pode ser um conformista; tem de ser fatalmente, se não tem revoltado contra as desigualdades sociais, pelo menos um vencido, no espírito do qual será impossível fazer nascer aduelas reacções salutares, próprias para reanimar os mais fracos e incutir esperança nos mais desalentados.
Aqui se contêm grandes verdades, gritantes verdades. Pois, Sr. Presidente, na invocação da boa doutrina daquele diário eu sinto mais um apoio para a afirmação de que resolver, tão depressa quanto as circunstâncias o permitam e o melhor que seja possível, o grave problema da habitação c sensatamente não desprezar, é estar atento, como se impõe e urge, às fortes e sérias razões de ordem cristã, moral, social e política que estão na sua base.
É redundante dizer que quem estiver de boa fé não pode, de modo nenhum, ignorar que a carência de habitações, em quantidade e qualidade, não é apenas um caso nacional, nem apenas peninsular, nem somente europeu, mas, sem dúvida, universal.
É do nosso comum conhecimento o panorama geral a tal respeito, e quem não ande arredio da leitura dos jornais terá visto a notícia, vinda a lume há pouco mais de um mês, de que o Ministro do Trabalho do Governo da vizinha Espanha anunciou que a importância global de CO milhões de pesetas ia ser atribuída com vista à execução de um plano quinquenal de construção de moradias populares; também os homens públicos e associações privadas do Portugal da América, impelidos por um premente estado de necessidade, se votam, com ardor, à obra magnífica, que tem foros de cruzada, da urbanização das «favelas» do Rio de Janeiro.
Embora se não tenham diluído na nossa memória as fortes ressonâncias dos repetidos e angustiosos apelos do padre Pierre, acentuando que o principal problema com o que o Mundo, se debate actualmente é constituído pelo facto de existirem 1500 milhões de pessoas, não só sem alimentação suficiente, mas também sem abrigo e sem cama; não ignorando, pois, a crise aguda em que tantos e tantos países se vêem envolvidos, citámos apenas, a título exemplificativo, aquelas duas grandes nações porque vivem mais perto da nossa afectividade e com elas temos maiores afinidades espirituais.
E ponho agora a pergunta: acaso entre nós, no enquadramento admirável do prodigioso ressurgimento nacional, inspiração, trabalho, fruto e estímulo da obra imensa do Estado Novo, tem sido descurado o problema? Afirmá-lo seria cometer uma imperdoável afronta contra os sagrados direitos da verdade.
Vejamos: não nos falta legislação apropriada; não minguam a actividade e a devoção do Governo, através dos Ministérios das Obras Públicas e das Corporações e Previdência Social, em dar-lhe expressão prática; é de registar o afã meritório de algumas câmaras municipais, Misericórdias e de certos organismos corporativos; agrada e consola ver como a iniciativa particular se polariza em tal sentido e, por vezes, de uma forma verdadeiramente comovedora, e a Assembleia Nacional e a Câmara Corporativa não têm cessado de dar o contributo sério da sua recta intenção na serenidade de estudos feitos com o maior equilíbrio.
Vou comprovar sumàriamente o que acabo de apontar, remetendo-me não só para os princípios gerais contidos no título III, artigo 14.°, n.º 1.°, da Constituição Política e artigo 20.º do Estatuto do Trabalho Nacional, mas citando o Decreto-Lei n.° 23 052, de 23 de Setembro de 1933, a Lei n.° 2007, de 7 de Abril de 1945, os Decretos-Leis n.ºs 34 486 e 35 578, ambos de Abril, o primeiro de 1945 e o segundo de 1946, e o Decreto-Lei n.º 36 212, do mesmo mós, mas do ano de 1947, e legislação complementar, com referência aos seguintes tipos de habitação, respectivamente: casas económicas, casas de renda económica, casas para alojamento de famílias pobres e casas de renda limitada.
Com base nos Decretos-Leis n.ºs 28 192, de 8 de Agosto de 1938, 33 728, de 24 de Novembro de 1943, 34 139, de 24 de Fevereiro de 1944, e 36 797, de 17 de Março de 1948. foram consideradas e já construídas as chamadas casas desmontáveis, quer no regime de subsídio, quer em regime de subsídio e comparticipação, cumulativamente, por parte do Ministério das Obras Públicas.
Embora me vá deter um pouco mais na parto do problema habitacional relativo a rasas para famílias pobres, dado que a matéria em debate é vastíssima e o Regimento da Câmara nos impõe compreensivas limitações, somente aditarei, em breve apontamento, que os números de que disponho, no tocante ao ano de 1953 - e mais e muito se tem andado de então para cá -, esclarecem-me de que só pelo Fundo de Desemprego foi consignada a verba de 57:583.214$71 à construção de casas de habitação, assim distribuída: casas económicas, 44:533.506$60; casas para famílias pobres (e retomarei este capítulo mais adiante), 10:822.C47$71, e casas para pescadores, 2:277.060$40.
Refiro agora a regulamentação da Lei n.° 2030, de 22 de Junho de 1948, atinente ao instituto da propriedade horizontal, de tão manifestos fins sociais e económicos, fomentando o aumento da propriedade urbana, dando possibilidades para a sua aquisição e facilitando ainda o seu comércio. Menciono a seguir, por força da legislação já referida, a notória expansão dos bairros. País em fora, com a agradável expectativa e, mais do que expectativa, firme certeza de que o seu número largamente se multiplicará, segundo o pensamento expresso pelo muito ilustre titular da pasta das Obras Públicas, Sr. Eng. Arantes e Oliveira, afirmando por forma peremptória, relativamente à política de fomento da habitação, que o Governo não só a tem definido com clareza desde há muito, mas que continuará a dispensar-lhe o mais dedicado interesse.
Em simples parêntesis, e porque aludi à obra de construção de moradias, em sistema de bairros, cor parte do Estado Novo, ocorre-me a lembrança, triste lembrança, do que fora mais uma página sombria da história da política dos partidos, também neste capítulo. E ela é provocada pelo facto de, no Verão do passado ano, haverem sido adjudicadas, por forma definitiva, a trabalhadores da capital, casas que ocupavam desde há uma vintena de anos, com base no decreto-lei, já por mim citado, de 23 de Novembro de 1933.
Porque se trata precisamente de moradias cuja distribuição se fizera em 1935, integradas também no tão falado Bairro do Arco do Cego, cuja origem e vicissitudes de vida bem se conhecem, que mundo de recor-