124 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 172
tório, «a saúde pública é um dos espelhos em que mais fielmente a Nação se revê».
A prosperidade económica, a melhoria do nível geral de vida da população, a boa alimentação, a habitação decente e higiénica, a electricidade barata, a água boa, as comunicações fáceis e cómodas, a garantia dos meios de existência pela segurança social, tudo legítimas aspirações dos povos civilizados, pouco serão sem o progresso real da saúde pública.
Se houve sector da vida colectiva em que nos tivéssemos deixado atrasar, esse foi um deles. E atrasar demasiado, para que a recuperação não seja demorada e dispendiosa de capitais humanos e financeiros.
Na tuberculose, por exemplo, que continua a ter prioridade sobre os outros problemas da saúde, os números revelam-nos o nada de que se partiu e o caminho até agora percorrido.
Dispúnhamos em 1926 na alvorada da Revolução Nacional, de 6 dispensários e 3 sanatórios, com menos de 1000 leitos, e o Estado gastava por ano com o terrível flagelo, mesmo levando em conta a desvalorização da moeda, a modesta soma de 800 contos!
O índice da mortalidade andava por 200 em 100 000 habitantes.
Pois bem, em 1954, antes do início da campanha, não havia 6, mas 104 dispensários ou consultas-dispensários; não 1000 camas, mas 6827 nos sanatórios, e o Estado gastava com a tuberculose, não os 800 contos de 1926, mas 50 000 contos.
Em 23 de Maio de 1955, na Santa Casa da Misericórdia de Draga, ao encerrar a 25.ª Semana da Tuberculose, com um memorável discurso, de larga repercussão no País, o ilustre Subsecretário de Estado da Assistência Social lançava a campanha antituberculosa, a que o Ministério das Finanças correspondia imediatamente, aumentando substancialmente os recursos financeiros destinados a combater o mal.
Já nesse ano de 1955 se gastaram mais 35 000 coutos do que 110 anterior, correspondentes a um aumento de 65 por cento, e nu ano corrente, de 1950, a dotação subiu em mais 13 073 contos, com o total de 89 332 contos, representando noventa vezes os quase simbólicos 800 contos de trinta anos antes.
Da consideração, por parte do Ministério das Finanças, da necessidade de se apagar decididamente uma doença de carácter social, cuja mortalidade havia baixado, é certo, para 61,5 por 100 000 habitantes, mas cuja morbilidade não mostrava tendência para diminuir, resultou a entrada em funcionamento, até Outubro findo, de mais 31 consultas-dispensários em colaboração com as Misericórdias, o que eleva os dispensários e n s consultas a 135 e mais 991 leitos, passando a ser no todo de 7818, e o incremento da profilaxia da doença pelo rastreio microrradiográfico e a vacinação pelo B. C. G.
E não passará muito tempo sem que à disposição da campanha possam estar mais 4575 camas, já em preparação, nos sanatórios do Estado e dos particulares e nas enfermarias-abrigo das Misericórdias.
Esforço grande, na verdade, na construção de um sólido edifício, do qual apenas se começam a ver os alicerces.
É que o aumento da morbilidade é verdadeiramente impressionante. Em 1954 o número de casos novos registados nos dispensários foi de 11 104, mas em 1955 esse número subiu para 14 394!
Nas 430 000 microrradiografias feitas em 1955 encontraram-se 8801 casos de tuberculose evidente ou provável!
Se nos lembrarmos de que o número total de tuberculosos no País se estima em mais de 100 000 e os considerados créditos andam por metade desse número, muitos
deles nitidamente bacilíferos, e que há poucas semanas mais de 3000 doentes aguardavam vez de internamento nos sanatórios, estando a média da espera em onze meses para os homens e dez meses para as mulheres, poderemos ver quão pouco representam as actuais 8000 camas ou as 4500 em preparação, tanto mais que, ainda hoje, a cura da tuberculose reside essencialmente no repouso e na conveniente alimentação.
Como se vê, estamos apenas nos alicerces.
No Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos, dirigido com tão grande competência e dedicação pelo Sr. Dr. Carlos Carvalho Dias, faz-se um extraordinário esforço para estabilizar a doença, sem o que se continuará a trabalhar quase em pura perda.
A profilaxia da doença pelo rastreio tuberculínico e microrradiográfico e pela vacinação B. C. G. vai-se estendendo a todo o País, com as novas brigadas dotadas de meios especializados.
Os números dizem que se fizeram 11 967 exames microrradiográficos em 1950 e 336 432 no 1.º semestre de 1956.
A campanha precisa, por isso mesmo, da compreensão de todos.
O Ministério das Finanças não lhe regateou meios; as Misericórdias deram-lhe toda a cooperação possível, com as entermarias-abrigos e as consultas-dispensários; acorreram, justificadamente esperançados, os doentes.
E mais: ouvimos há meses o ilustre Ministro das Corporações, Sr. Dr. Henrique Veiga de Macedo, no seu notável discurso na Caparica, falar da viabilidade de ser considerado no próximo ano o seguro social obrigatório da tuberculose, pelo menos no respeitante à cobertura do risco pela perda de salário.
O seguro da tuberculose tem dois aspectos, que me parecem inseparáveis: o do tratamento, precoce ou tardio, da doença e a da cobertura do risco pela perda de salário.
Nenhum deles existe no nosso país.
O actual esquema do seguro da doença, menos amplo do que os da generalidade dos países da Europa Ocidental, prevê, no que possa aproveitar aos beneficiários tuberculosos, o tratamento ambulatório por consulta externa ou a visita domiciliária e o fornecimento de radiografias e de estreptomicina, isoniazida e P. A. S., este em regime de participação do segurado.
O único tratamento específico da tuberculose é, portanto, o medicamentoso por alguns antibióticos, e mesmo assim em regime de participação do segurado no seu custo.
Tudo o resto, aquilo que hoje se considera essencial ao tratamento do flagelo, desde a profilaxia pelo radior-rastreio e pela vacinação ao tratamento ambulatório em dispensários e aos internamentos sanatoriais, pertence ao organismo especializado da saúde pública do Subsecretariado de Estado da Assistência Social, isto é, ao Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos; mas para a prevenção no tratamento não contribuem os organismos da previdência.
Será de desejar, na verdade, o estabelecimento da colaboração desses organismos na campanha antituberculosa, em benefício da massa dos seus segurados, representando 15 por cento da população do País.
Por outro lado, será também de desejar a inclusão no esquema do seguro social do seguro de doença prolongada, a que pertence, sem dúvida, a tuberculose.
O tratamento da tuberculose exige uma terapêutica de cuidados especiais - boas condições sanitárias do meio, conveniente alimentação, repouso sistemático e garantia do salário suficiente a economia do agregado familiar, que não se harmoniza com o panorama actual do nosso seguro social.