12 DE DEZEMBRO DE 1956 127
O Orador: - O grande e sensível aumento de frequência às escolas de todos os graus do ensino é um sintonia feliz dos tempos que correm. A estatística de 1954-1955 revelou a existência surpreendente de 1 203 801 alunos.
Há realmente quem se alarme com a avalancha dos que demandam as escolas, desde a primária às superiores, mas penso de mini para mini que alarme e humilhação era a alta percentagem de analfabetos que nos mantinha num plano vergonhoso perante os países de maior civilização. Era um estigma e um ferrete a ignorância avassaladora da maioria dos portugueses.
E a ignorância é, decerto, o mais perigoso veículo para as ideias subversivas e indiscriminadas.
Através da escola, o Estado, a Igreja e a família podem e devem orientar, esclarecer e iluminar as almas, que de outra forma jaziam na penumbra ou na sombra da perigosa e aviltante ignorância.
É certo também que a instrução é arma de dois gumes, mas cabe à bem orientada educação embotar o gume dos desvarios e aguçar aquele que desbasta e abre o caminho da felicidade e da harmonia social.
E é nesta ordem de ideias que eu exulto ao ver as multidões de jovens encaminhadas para a escola.
É evidente que surgem e se multiplicam os problemas de instalação e do pessoal docente idóneo e de muitos outros factores colados à localização futura na vida dessas multidões juvenis ansiosas de viver e de respirar como gente civilizada. Nos artigos 13.º e 14.º da proposta procura-se resolver o problema das construções e apetrechamento das escolas de todos os tipos.
Mas pergunto eu: que se faria dessas mesmas multidões juvenis, que afluem constantemente ao plano da vida social, se jazessem na ignorância e na incapacidade mental? Tudo trabalhadores rurais, tudo operários indiscriminados? Mas onde os colocar, numa época de progressiva mecanização dos campos e supermecanização industrial, com a sua inevitável redução de braços?
A própria mecanização rural e a supermecanização industrial exigem rurais e operários diferentes do tipo boçal que era da tradição.
Bem haja, pois, o Governo nesta campanha de difusão intensiva da instrução, sob o domínio de uma educação de vasto e alto alcance nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Consinta V. Ex.ª, Sr. Presidente, que adite algumas palavras sobre o candente e debatido problema do ensino liceal e técnico.
Tem tomado vulto o preconceito de que o ensino liceal está ultrapassado pelo ensino técnico, porque vivemos numa era industrial.
Se este princípio fosse verdadeiro, teríamos de nos submeter à vitória do materialismo sobre a vida espiritual. Ora o homem é essencialmente alma e espírito e a matéria um simples complemento de invólucro.
O ensino liceal, com a sua formação humanística, tende a formar o homem na sua essência espiritual, sem descurar a ferramenta material que o habilita a vencer na vida.
O ensino técnico enfrenta principalmente a utilização da matéria ao serviço do homem, função imprescindível nas sociedades modernas.
O próprio ensino liceal é preparatório das altas técnicas, pois que é a via normal para as Universidades, onde a Medicina, a Engenharia e a Agronomia são o máximo expoente da técnica dessas especialidades e onde o Direito e as Letras são o máximo expoente das humanidades clássicas.
O tal preconceito a que me referi tem levado até as estações oficiais ao pretenso desvio da população liceal para o ensino técnico. É possível, e eu mesmo o creio, que muitos estudantes que procuram o ensino liceal teriam mais propensão e vantagem no ensino técnico.
A realidade portuguesa demonstra que, sendo nós um país na fase inicial da sua industrialização, as nossas escolas técnicas, com raras excepções, estão já superlotadas, tanto ou mais que os liceus.
Os números falam eloquentemente.
Aos exames de admissão para este ano concorreram às escolas técnicas nada menos de 30 000 candidatos e aos liceus 20 000. Estes números foram publicados em Julho pelo Ministério da Educação Nacional. Onde a falta de candidatos a esse tipo de escola, se excedeu em 10 000 os que pretenderam demandar os liceus? Haverá na altura da saída do curso indústrias já desenvolvidas para absorver essa volumosa multidão:
Já há um ano referi o que aconteceu em França, que é fortemente industrializada, no último ano escolar: matricularam-se no ensino liceal 550 000 alunos e 340 000 nas escolas industriais.
Onde a decadência do ensino liceal?
O que está sobejamente demonstrado pelos factos é que todas as escolas são necessárias, e felizmente o nosso Governo está atento à solução deste magno problema do ensino em todos os seus graus e facetas.
E a prova da atenção do Governo está no facto de, finalmente, perante a evidência dos factos, ter de reconhecer que se impunha uma revisão no plano de escolas secundárias, em que os liceus de há certo tempo para cá tinham sido relegados para segundo plano.
Tinha-se mesmo suspendido toda a actividade em construções de alguns novos liceus e ampliação de uns tantos outros, pelo que ficara o plano inacabado.
Ora, dentro do lema que aqui tenho defendido em várias oportunidades, não há ensino preferencial, porquanto todas as escolas liceais ou técnicas são igualmente necessárias.
É certo que o ensino técnico esteve numa posição incomportável quanto a instalações. Havia que construir novos e apropriados edifícios.
Isso se tem feito, e em escala avantajada. É mesmo de desejar que seja possível a continuação do plano de construções de escolas comerciais e industriais.
Sei que o plano dos liceus volta aos cuidados da Junta das Construções, por ordem governamental, para ampliação imediata de alguns liceus e creio que construção de novos edifícios.
Queira a Providência que a nossa normalidade financeira não seja perturbada na próxima gerência, para que se torne possível a execução dos planos previstos em todos os sectores da educação nacional.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: em 1954 e 1955 abordei, nesta altura e desta tribuna, o grave problema da formação de professores liceais e pretendi demonstrar que o único liceu normal não bastava para as necessidades dos quadros e para o preenchimento dos lugares além dos quadros.
O abaixamento do nível docente dos liceus é um facto nestes últimos anos, em que os professores eventuais, apenas licenciados ou até simples licenciandos, abundam em todos os liceus.
No Liceu de Évora estão em serviço no presente ano escolar nada menos de dezassete professores eventuais, dos quais doze senhoras e cinco homens.
Dos onze professores efectivos apenas sete estão em serviço no Liceu e das sete professoras da secção feminina apenas cinco lá se encontram; os restantes quatro