162 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 174
o enfermeiro deveres e obrigações prementes e insubstituíveis. Ora, o número de enfermeiros de que dispomos é ligeiramente superior ao dos médicos existentes no País. O número destes é de 6271, enquanto o dos enfermeiros, de ambos os sexos, diplomados e não diplomados, é de 7006. O das enfermeiras propriamente ditas é de 3495. Temos, segundo nos informa o Sr. Subsecretário, um profissional diplomado, geral e auxiliar, para 1787 habitantes e uma enfermeira ou enfermeiro geral diplomado para 3275 habitantes.
Se há países em piores condições do que o nosso, o certo é que o mal dos outros não nos consola. Parece certo, porém, que uma eficaz assistência exige um número de enfermeiros, termo médio, na proporção de l para cada fracção de 500 habitantes. Nos Estados Unidos a proporção é de 1 para 300, mas este caís é excepcional a este como a outros respeitos. Ora, diz-nos ainda o Sr. Subsecretário que, se entre nós a situação escolar se não alterar sensivelmente até 1960, o ensino da enfermagem terá de quadruplicar o actual volume de frequência de 1960 a 1967. Por aqui se vê a vastidão do esforço que importa realizar.
Nos serviços hospitalares a relação do número de enfermeiros para o de internados é variável, como é óbvio, com a natureza das doenças. Assim, essa proporção não é a mesma para um serviço de medicina ou cirurgia, de pediatria, de clínica psiquiátrica, etc. Todavia, como cifra média para um hospital geral propõem: M. Bihet, directora do Instituto Edith Cavell, 3,5 horas diárias para tratamento de cada doente, o que equivale a uma unidade para 2,4 doentes; Jean Barrett, da Universidade de Siracusa (E. U. A.), 2,6 horas diárias para tratamento de cada doente, o que corresponde a uma unidade por 3,08 doentes; Garcia Diaz e Vicente Vallina Garcia, uma unidade por cada 2,5 doentes.
Deve, em conclusão, aceitar-se a média de uma unidade de enfermagem por cada grupo de 3 doentes.
Quais as causas da nossa exiguidade?
Já no primeiro ano da presente legislatura abordei o assunto nesta Assembleia. A causa fundamental é a pluralização da medicina, a sua expansão tentacular, particularmente depois da primeira grande guerra.
E não se diga que o Governo tenha descurado o assunto, pois, por soluções estabelecidas através de medidas legislativas, quanto à reorganização do ensino e organização da enfermagem nos estabelecimentos hospitalares (Decreto-Lei n.º 36 219, de 10 de Abril de 1947, Decreto-Lei n.º 37 418, de 18 de Maio de 1949, e Decreto-Lei n.º 38 884, de 28 de Agosto de 1952) tem-se conseguido já razoável avanço.
Basta dizer-se que desde 1925 até 1947 - data da promulgação das primeiras medidas de reorganização do ensino -, portanto no decurso de vinte e dois anos, o movimento das escolas de enfermagem oficiais e particulares foi de 2313, enquanto nos seis anos seguintes o número obtido foi de 3429.
Quer dizer: em seis anos obteve-se mais elevado número de diplomados de enfermagem do que no decurso dos vinte e dois anos anteriores. Há ainda escassez, é manifesto; mas Roma e Pavia não se fizeram num dia. Acresce, por outro lado, que o ritmo quanto ao número de indivíduos que anualmente e nas várias escolas obtêm o diploma não acompanha o das exigências ou necessidades, sempre crescentes.
Cresce o número de hospitais sub-regionais, de centros e casas de saúde, de postos e delegações dos Serviços Médico-Sociais-Federação de Caixas de Previdência e de outros serviços médicos das caixas de Previdência; aumentam de ano para ano os acidentes e viação, de trânsito e devidos a outros factores que o industrialismo trouxe consigo; cresce a frequência de internamentos e de consultas externas nos hospitais centrais, as especializações mais variadas e exigindo técnicas médico-cirúrgicas de aplicação delicada, etc. Para tudo se exigem enfermeiros em número cada vez mais elevado.
Mas a expansão tentacular da medicina e aplicação de suas técnicas, cada vez mais complicadas, e a necessidade de conferir ao doente todo o conforto que ele exige, por sua qualidade de ser humano, unidade substancial de corpo e alma, obriga, por sua vez, o enfermeiro ou enfermeira a adquirir ou possuir, para sua preparação profissional, qualidades pessoais e elementos de ilustração e de cultura, muitos dos quais, em rigor, o médico não tem precisão absoluta de possuir.
Com efeito, o enfermeiro precisa de possuir conhecimentos de anatomia, de fisiologia, de farmacologia, de patologia, de higiene, etc., e tais disciplinas constam dos seus programas de ensino e servem-lhe para bem compreender o alcance da prescrição médica.
Isso, porém, não obriga a dizer que médico e enfermeiro, por mais especializado que este seja, possuam conhecimentos paralelos, ainda que salvaguardada, paru disciplinas de índole comum, a diferença de grau-mais elevado, é manifesto, para o médico. Mas do programa de enfermagem constam disciplinas que até hoje não têm figurado no programa de ensino das Faculdades de Medicina, como, por exemplo, Pedagogia e Didáctica, Sociologia, Adaptação Profissional, Organização da Assistência, Saúde Pública, Administração Hospitalar, Organização e Administração de Escolas, Puericultura, Técnica de Enfermagem, Higiene Mental, etc., fazendo, contudo, parte dos programas das escolas oficiais de enfermagem dependentes do Ministério do Interior.
Isto significa dizer que, se à enfermeira fica vedado intrometer-se no diagnóstico e terapêutica de índole estritamente médica, já o mesmo não acontece quanto à assistência social, domínio onde a enfermeira adquire maiores vantagens e encontra meio mais adequado u sua situação e ao seu sexo.
Aí é-lhes já permitido, e até de desejar, procurar fazer o diagnóstico social e instituir uma terapêutica social, pois quanto mais eficientemente o fizer mais pro-fiquamente se evitará, de futuro, uma terapêutica de cunho vincadamente médico. É então deveremos dizer que os conhecimentos do médico e da enfermeira não são paralelos, mas sim complementares.
Os conhecimentos do médico não absorvem por completo os da enfermeira, antes os desta completam os o médico na realização de uma obra de objectivos comuns: o tratamento médico-social do homem integral.
Na verdade, assim é: os cuidados necessários no domicílio para evitar as moléstias infecciosas; o ensino da mãe, para alimentar convenientemente o seu filho; a maneira de o lavar, de lhe dar o banho e de o vestir; os conselhos sobre as medidas higiénicas a estabelecer em casa; a pesquisa de pessoas de famílias que justifiquem consulta no dispensário; o estudo das condições de trabalho do seu chefe; a sua dedicação e solicitude em face dos doentes; o esforço junto dos chefes das fábricas, das minas, das empresas industriais, para que aos operários sejam oferecidas condições mais sãs, mais seguras e mais confortáveis, etc., são funções que, embora não sejam de todo vedadas ao médico, todavia ninguém negará serem elas especificamente femininas e próprias da enfermeira ou da assistente social.
Os serviços de sanidade pública, as obras privadas, as obras da criança, tuberculose, cancro, etc., recorrem à enfermeira de higiene. Ela presta assistência aos doentes quando o médico a não pode assegurar e é ela ainda, e tantas vezes, a melhor chave para abrir a porta de entrada nos lares familiares.