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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 191 480

O autor da carta, afirmando terem falhado redondamente todas as tentativas do Sr. Nehru quanto à absorção dos territórios portugueses da índia, sugere o seguinte, que muito me agrada dizer textualmente: «Sendo o Dr. Salazar considerado um chefe de governo ideal, porque é um homem franco, honesto, de clara compreensão e grande cultura, temente a Deus e praticando a caridade e a justiça cristãs, porque o não visita o nosso Primeiro-Ministro oficialmente e não tem com ele uma conversa franca, de coração nas mãos, baseado no principio de que dar é receber?» «Estou certo -acrescenta o autor da carta- de que a sua visita a Portugal produzirá resultados de valor».
Como se viu e é salientado no relatório do Sr. Governador-Geral do Estado da índia que precede as bases do orçamento para 1957, com as ameaças semelhantes às referidas e com outros actos de má vizinhança praticados pelo Governo do Sr. Nehru o Estado da índia só lucrou, porque se libertou de uma economia escusa-damente dependente para entrar numa economia acentuadamente autónoma.
Falhadas redondamente, como se viu, as tentativas de absorção de Goa, se o Sr. Nehru quiser evitar ataques de que é vítima no seu Parlamento e acreditar a sua apregoada mensagem da paz, terá de seguir a aludida opinião do seu compatriota.
Pode, assim, dizer-se que o chamado «caso de Goa» passa agora a ser o «caso do Sr. Nehru».
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Vai efectuar-se o aviso prévio do Sr. Deputado Daniel Barbosa sobre o problema económico português.
Tem a palavra o Sr. Deputado Daniel Barbosa.

O Sr. Daniel Barbosa: - Sr. Presidente: não desconheço, nem minimizo sequer, a delicadeza e a importância do assunto que resolvi tratar neste aviso prévio; delicadeza que, aliás, se avulta ao considerá-lo na contingência das interpretações que poderão surgir ou até das intenções que porventura lhe emprestem aqueles para quem o acto mais objectivo no terreno político tem fatalmente de ter atrás de si uma razão escondida, se não mesmo um fim inconfessado ou oculto.
Entendo, porém, que fugir a tratá-lo claramente pelo receio, ou pelo perigo, de tão lamentáveis confusões só pode contribuir para reforçar mais ainda certos hábitos de indiferente comodismo que se vão entre nós enraizando, mas que devemos corajosamente condenar; o reconhecimento aberto e franco das realidades precisa andar sempre à frente da política, buscando, com o à-vontade das claras situações a crítica e o apoio da gente que se governa: pôr problemas com honestidade e franqueza destituída de paixão só pode contribuir para facilitar a função dos governantes, e se há dúvidas que persistem, se há interpretações que injustamente se mantêm, se há críticas que indevidamente se amontoam, só há vantagem para o País e para todos que umas e outras se abordem, no fito de procurar assentar realmente no valor e na extensão dessas realidades, sem as quais se não pode governar.
Como norma imperiosa duma conduta que foi salvadora da Nação, lembrava o Sr. Presidente do Conselho -já lá vão quase trinta anos- que, tal como a vida social, a política e a administração pública se devem apoiar na verdade; e este princípio, que tanto o tem creditado ao respeito nacional, não pode deixar de ser um princípio aliciante para o bom entendimento entre o Governo e a Nação.
A formulação corajosa duma verdade na administração ou na política tem sempre atrás de si juventude e constitui, desde logo, um triunfo de largo alcance no campo das interpretações; nada melhor do que o receio de atestar a verdade para dar azo a que se espalhem mentiras e se criem os ambientes ideais para as críticas destrutivas que nascem das insinuações.
Quando se tem uma obra já realizada e se demonstrou ao País o mérito e o valor da política que a realizou, seria dar posição de domínio aos erros que dentro dela porventura se encontrem tentando esconder a verdade, que, reconhecida e apontada, os pode exactamente eliminar; depois, olhar à verdade para avaliar da situação em que se está, no fito de avaliar também do que ainda falta fazer, constitui ainda a melhor forma de preparar o futuro, não por força de actos do Governo, mas pela cooperação consciente de todos os valores nacionais.
Nós tendemos, porém, e quantas vezes, não digo a esconder a verdade, mas a adoçá-la ou a omitir-lhe, pelo menos, certas durezas mais vivas ou a crueza das cores, em prejuízo do «valor político» que ela às vezes também teria na simplicidade austera da sua real formulação; devemos fugir a isso, repudiando a influência daqueles para quem o cansaço, ou o comodismo das situações mais calmas, não se quadram com o reconhecer das realidades que implica luta, trabalhos e acção.
Não podemos esquecer até que no reconhecimento, na formulação da verdade, está frequentemente a melhor explicação para as grandes dificuldades com que o político depara ao querer estabelecer soluções que aos leigos parecem simples, mas que as circunstâncias do momento, ou as dificuldades do processo, obrigam a ser mais lentas do que à nossa natural ansiedade poderia parecer conveniente.
De resto, nunca há vantagem em querer atenuar certas verdades que, por sentidas e conhecidas por muitos, até convém referir francamente para as limitar ao valor que, na realidade, devem ter; valor que, aliás, nunca negaria o caminho que o País até agora percorreu. Depois, se há verdades que se notam, há verdades que se devem, e já o velho Sá de Miranda aconselhava, na sua experimentada filosofia: «Dizer em tudo as verdades a quem em tudo as deveis».
Pelo que respeita à importância do assunto deste aviso prévio, direi somente que ela se mede, ou, melhor, que ela se sente, dentro de muitos lares da gente de Portugal; para além, portanto, das preocupações dos governantes, dos economistas e dos políticos, para além, portanto, das responsabilidades daqueles a quem cabe a obrigação delicada de analisar e ponderar para resolver, há no País, pelas condições em que se situa a vida de muita gente, o ambiente preciso para manter o assunto em causa num lugar de primazia dentro das preocupações principais.
Tudo isso lhe confere, assim, não só o interesse político, mas foros de indiscutível merecimento para ser analisado e dissecado por nós, como representantes da Nação; e se nesta Câmara o pretexto da minha intervenção servir para que alguns dos seus melhores valores o abordem francamente, também apontando-lhe as soluções convenientes e sugerindo-lhe as medidas que julguem aconselháveis, pude contribuir - e só essa glória quero - para um desinteressado serviço aos superiores interesses nacionais.