5 DE ABRIL DE 1957 569
no que respeita à reforma aos 65 anos com pensão actualizada, como às pensões de sobrevivência.
Estou convencido de que S. Exa. o Ministro das Corporações, que aos problemas de assistência está a dedicar o seu melhor esforço, não deixará de acolher com especial carinho as aspirações desta obscura classe de trabalhadores, que tão importantes serviços tem prestado à Nação.
Se o Governo der satisfação a tais aspirações sem agravamento de encargos, como julgo possível, merecerá a gratidão de toda esta gente e os efeitos políticos que daí podem advir são de considerar.
A marinha mercante é, como atrás disse, uma das grandes actividades industriais do País, que, além de empregar cerca de 6000 homens na vida activa do mar, sustenta mais de 30 000 famílias que vivem de outras actividades ligadas à indústria dos transportes marítimos, tais como as do pessoal dos escritórios e cais, agências, tráfego e estiva, docas, estaleiros de construção, oficinas de reparações, etc.
Só no que respeita a estaleiros de construção, é do conhecimento geral, pela frequência dos lançamentos, que a expansão das frotas do comércio e da pesca lhes deu tal impulso que os obrigou a desenvolver extraordinariamente a produção, com o correspondente emprego de mão-de-obra.
E como esta absorve cerca de 25 por cento do custo da construção, o benefício que daqui resulta para as classes trabalhadoras é manifesto.
Mas há mais: alguns estaleiros estão já a construir para o estrangeiro, e isso significa também divisas entradas.
A garantia de emprego a tantos milhares de pessoas, contribuindo para o desafogo económico das classes trabalhadoras, justificaria, só por si, a existência daquela indústria.
Mas o aspecto social assume ainda maiores proporções se considerarmos que só as principais empresas de navegação contribuem anualmente com coreu de 37 000 tontos, para a previdência social dos seus empregados.
Por outro lado, a contribuição anual das mesmas empresas para o Estado e autarquias locais, sob a fornia de contribuições e impostos, passa dos 38 000 coutos.
Infelizmente, estas vantagens oferecidas pela marinha mercante não têm sido devidamente apreciadas. Não está ainda entre nós preparada a mentalidade a favor da navegação comercial, o espírito mercante, com» lhe chamou S. Ex.ª o Ministro da Marinha.
Perderam-se as velhas tradições que herdámos dos nossos gloriosos avós.
Através de um esforço prodigioso, regressámos ao mar quando lhe estávamos quase voltando as costas, mas o merecimento dos serviços prestados pela navegação nacional continua a ser pouco compreendido em determinados sectores, que nos navios só vêem o instrumento de lucro dos armadores.
A administração interna, com o seu oportuno programa de política financeira, a protecção concedida à lavoura, o reequipamento de algumas indústrias e a criação de outras, a renovação e desenvolvimento das frotas do comércio e da pesca, tem sem dúvida criado condições propícias si expansão económica e merece, por isso, os nossos maiores aplausos.
O programa é vasto e vai certamente prosseguir, mas precisa de ambiente favorável.
Uma apreciação menos oportuna à obra do Governo pode embaraçar os seus projectos.
Fez-se há dias referência nesta Câmara às tarifas elevadas da navegação nacional para as ilhas adjacentes, possível que a economia pobre das ilhas não
comporte o actual custo das passagens, que. aliás, não é fixado pela empresa que tem a seu cargo a exploração da carreira, mas entoo o problema assume um aspecto política que só o Governo pode resolver.
A navegação nacional está sujeita a um regime de coordenação que não lhe permite agir apenas segundo os seus interesses: taxas de frete e passagens são propostas pela Junta Nacional da Marinha Mercante, aprovadas pelo Ministro da Marinha e constituem um compromisso entre as receitas e as despesas de exploração.
Evidentemente, para qualquer empresa marítima ter condições de vida é preciso que os encargos relativos à exploração da carreira que u empresa serve, e em que se incluem o custo dos navios, as amortizações, as beneficiações periódicas, as reclassificações normais, os impostos, as taxas portuárias, os seguros, os encargos sociais, os vencimentos da tripulação, o custo dos combustíveis, o aprovisionamento e o justo rendimento do capital (visto tratar-se de empresas privadas), sejam cobertos pelas receitas brutas dos fretes e passagens.
Se este facto não se verificar, o saldo das contas será negativo, a empresa não constituirá reservas, não dará remuneração ao capital accionista, baixará o nível dos seus serviços, entrará no campo dos empréstimos e a sua situação económica e financeira agravar-se-á de hora a hora.
Se as circunstâncias exigem que nina carreira nestas condições se mantenha e se há conveniência política em não agravar fretes e passagens, o problema, como disse, só em nível ministerial poderá ter solução.
O público que tem de utilizar os navios, não vendo naturalmente os serviços acompanharem a evolução e até as exigências da vida moderna, quer em rapidez, quer em comodidade, queixa-se do exagerado custo das passagens, sem se aperceber da complexidade do problema.
E no entanto, posso afirmar que o nível do custo das passagens praticado nas linhas nacionais é geralmente dos mais baixos, quando comparado com o de outras linhas.
Na carreira das ilhas, por exemplo, e tomando como base a 3.º classe, cuja tarifa é de 390$ para o Funchal, o custo por quilómetro é de $40; para Ponta Delgada pagam-se 510$, ou seja §26 por quilómetro, tarifas estas inferiores às dos carros eléctricos, e, por pouca, comodidade que ofereçam, sempre incluem cama, mesa e um lugar para se sentar, o que raras vezes acontece nos referidos carros.
Se formos à carreira de Angola, verificaremos que o custo de unia 3.ª classe, camarote, de Lisboa para Luanda, é de 3000 o que corresponde também a $40 por quilómetro, de acordo com as tarifas aprovadas pelo Governo.
Mas no trajecto Lisboa Rio de Janeiro, cujas tarifas são estabelecidas pela Conferência da América do Sul, já o custo de um bilhete de 3.ª classe é de 5.600$, o que corresponde a $71 por quilómetro.
Nas carreiras estrangeiras Autuérpia- Lobito o lugar mais barato num navio de classe única e em camarote de quatro pessoas custa 18 500 francos belgas, o que, ao câmbio actual, corresponde a 10.600$, preço este superior ao de uma passagem em l. ª classe especial de Lisboa para o Lobito nas linhas nacionais, que é de 9.200$.
Comparando ainda as tarifas marítimas com as dos caminhos de ferro, verifica-se que, por exemplo, no trajecto Lisboa - Viana do Castelo o custo por quilómetro, em 3.ª classe, anda por $30.
Mas basta que lhe adicionemos o preço de uma refeição ou a sobretaxa de velocidade para que aquele custo se torne superior ao da navegação.